Lembro-me de, ainda miúdo, comer pela primeira vez este pastel. E era estranha a sensação da massa folhada se espartiçar
toda, e pequenas particulas se desperdiçarem…! E assim comecei a ser
exigente com massa folhada, em qualquer receita. Daí ter horror por
massas folhadas que, depois de frias, ficam moles. As boas mantêm-se
estaladiças por várias horas.
O
Pastel de Chaves é um pastel salgado pois é recheado com carne. Olhar
para ele é, só por si, um prazer. Ver as folhas finas que em grupo
representam a excelência da massa folhada é o primeiro encanto. Esta
massa parece ter entrado em Portugal no século XVII.
Há
autores que referem a massa folhada como oriunda do Oriente e
particularmente do antigo Egipto. Segundo Antonio Pignatelli já em 1525
se encontram referências em Veneza da pasta sfoglia que corresponde à massa folhada. Outros
defendem, como Jean-Marie Cuny no livro “La cuisine lorraine”, 1998,
que a massa folhada se difundiu na Europa a partir de Roma e do ensino
de Claude Lorrain durante a primeira metade do século XVII. Mikel
Corcuera, a propósito de croissants com massa folhada, atribui a sua
existência já em 1638 em França. Francisco Martinez Montiño, no seu
livro “Arte de Cocina, Pastelelería, Vizcochería y Conserveria”, 1611,
Madrid, no tempo em que Portugal e Espanha tinham o mesmo rei, apresenta
os pastéis folhados com um texto curioso que transparece a necessidade
de se ser sabedor para fazer estes pastéis. Domingos Rodrigues, no seu
livro “Arte de Cozinha…”, 1680, também já faz referência a vários
pastéis com massa folhada e inclusive na receita de “Torta de ginjas”
manda fazer folhado francês. Será, possivelmente, de França que se terá recebido a fórmula da massa folhada.
Mas
voltemos aos nossos pastéis de Chaves. De acordo com o Guia dos Bons
Produtos Tradicionais 2014, da Qualifica, e que transcrevo, assim se
define o Pastel de Chaves: “Pastel em forma de meia-lua, constituído por
massa finamente folhada, recheada com um preparado específico à base de
carne de vitela picada.” Não está estudada a data exata do seu
aparecimento. No entanto há relatos de 1862 que sinalizam uma senhora
que os vendia, em Chaves, em cesto de verga, e que rapidamente se
esgotavam. Curioso é pensar que por estas altura apareceram os famosos
Pasteis de S. Martinho ou de Penafiel que têm um formato semelhante e
também confecionados com massa folhada. O recheio é também de carne mas
ligeiramente diferente, e no final são polvilhados com açúcar e canela,
detalhe que não acontece em Chaves. Consta que “a fundadora da Casa do
Antigo Pasteleiro decidiu, então, oferecer uma libra pela receita da
iguaria que acabou por conquistar um lugar de destaque na gastronomia
flaviense”, conforme publicou o Jornal de Notícias de 01 de dezembro de
2012.
Acredito
que o sucesso desde o século XIX destes pastéis terá a ver com a
novidade, e qualidade, da massa folhada e depois o recheio de carne que
seria macio e que muitos gostam com sabor a cebola. No século XXI parece
dever-se exigir que seja Carne Barrosã DOP. A exigência natural por
produtos de qualidade, e com origem conhecida. O sucesso, ou procura nos
diferentes estabelecimentos, deve-se às variações da massa folhada e
temperos diferentes do recheio de carne picada. Supõe-se que a sua
produção diária ultrapasse 25.000 unidades e com cerca de trinta
produtores. Atualmente o nome "Pastel de Chaves" está reconhecido como
IGP, com área de produção restrita ao concelho de Chaves.
Nos
tempos correntes é possível prepará-los e depois submete-los a
congelação e seguidos de conservação a -18º C. Depois podem ser
recuperados em forno quente, a 200º C, durante cerca de 20 minutos.
Sabem bem em qualquer refeição e poderão ser um prato principal
acompanhados de um arroz malandrinho, ou com salada. Procurem o melhor
pastel, ou aquele que lhes saiba melhor. E não se esqueçam que
acompanhados com um bom vinho transmontano saberão melhor!
© Virgílio Nogueiro Gomes
Fonte: http://www.virgiliogomes.com/index.php/cronicas/725-pastel-de-chaves
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