Foi um sucesso no Teatro Baltazar Dias, com duas centenas de pessoas, cobertura televisiva e uma grande participação no debate- um muito obrigada ao amigo realizador Leonel Brito!
Texto da autoria de Ernesto Rodrigues, Presidente do CLEPUL da UNIVERSIDADE DE LISBOA ,lido na apresentação do documentário: Caros espectadores
Leonel Brito está a
convalescer de operação melindrosa no hospital de Badajoz – sendo transmontano,
vive numa quinta em Elvas – e não pode, assim, conviver hoje com gentes que
filmou e admira há 40 anos. Espera regressar aquando da Feira do Livro.
Esse desejo há muito
alimentado pelo realizador encontrou resposta no Centro de Literaturas e
Culturas Lusófonas e Europeias da Faculdade de Letras da Universidade de Lisboa,
através do seu pólo na Universidade da Madeira, dirigido por Luísa Paolinelli.
Temos, Teresa Martins
Marques e eu, inúmeros encontros com Leonel Brito. Aquela redigiu o essencial
da biografia de Amadeu Ferreira – a alma do mirandês e vice-presidente da
Comissão de Mercados e Valores Mobiliários (1950-2015) –, intitulada Um Fio de Lembranças (2015), a partir de
32 horas de entrevistas gravadas por Leonel Brito.
Quando presidi à
Academia de Letras de Trás-os-Montes, este filmou entrevistas de uma hora com
dez autores, além de falar com 13 personalidades para um documentário sobre os
meus 40 anos de vida literária. É, pois, uma relação cúmplice que esperávamos aprofundar
na nossa deslocação à Madeira.
Na linha de
experiências de Manoel de Oliveira ou João César Monteiro, o pós-25 de Abril
trouxe um interesse crescente pelas manifestações populares maioritariamente
centradas no Alentejo e em Trás-os-Montes, bem como por casos de cooperativas,
empresas ou fábricas, em que pulsava o voto de uma democracia alargada.
No exemplo
transmontano, tínhamos Manoel de Oliveira em O Acto da Primavera (1962), Alfredo Tropa, com Pedro Só (1971), Festa,
Trabalho e Pão em Grijó de Parada (1973), de Manuel Costa e Silva, e Falamos de Rio de Onor (1974), de
António Campos. Sucederam Trás-os-Montes
(1976), de António Reis e Margarida Cordeiro, Máscaras (1976), de Noémia Delgado, e Argozelo ‒ À Procura dos Restos das Comunidades Judaicas (1977), de
Fernando Matos Silva.
Neste ano de 1977,
uma nova cinematografia emerge com Leonel Brito: não é só o trabalho de campo
que vultos eminentes da filologia e das ciências sociais já tinham operado na
região, acrescidos de musicólogos ‒ que o mesmo realizador segue em Encomendação das Almas (1979), onde
também não falta o inquérito; nem tão-só um esboço de ficção, a caucionar o
folclore, embora pequenas histórias, geralmente dramáticas, venham encaixadas.
É, a par disso, um envolvimento político e denunciador, lido em Colonia e Vilões; ou um lento olhar
picado do alto da serra, único a abarcar a grandeza de uma paisagem, rude e
tirânica, da qual se desce ao indivíduo comum, para a focalização abrir à
comunidade – e, nessa alternância, contar-se a história económica, social,
religiosa e política da terra natal, Torre de Moncorvo, ‘vila rica’ de minério
e olhar da PIDE à sombra do templo, agora afrontada por anseios legítimos do
retornado, emigrante, camponês, asilado, estudante. Refiro-me
a Gente do Norte ou A História de
Vila Rica (1977), uma docuficção em renovada sintaxe, que faz deste filme
pequena obra-prima em menos de uma hora.
Se o espectador ilhéu
conhecer esta filmografia e outros títulos facilmente encontrados online, perceberá melhor o discurso
fílmico de Colonia e Vilões, título que
causa estranheza aos continentais. Quando os intelectuais se demitem, obras
deste género inclinam a balança para o lado dos oprimidos e humilhados.
Ernesto Rodrigues