quinta-feira, 30 de outubro de 2014

TORREDE MONCORVO - SANTA CRUZ DA VILARIÇA- A VILA VELHA


Continuando as nossas viagens através do património histórico-arqueológico do Concelho de Torre de Moncorvo, mais uma vez encontramos no baú do Dr. Joaquim Santos Júnior mais uma foto que nos conta uma história. Esta imagem pertence a Santa Cruz da Vilariça, mais conhecida como “Vila Velha”,ou “Derruída”
 Com localização privilegiada sobre o vale da Vilariça (lado Oeste), Penedo da Cardanha (lado Norte), vista para a vila de Torre de Moncorvo (lado este) a Vila Velha situa-se estrategicamente numa elevação que termina em esporão, a norte, da margem direita do Rio Sabor.
A vila de Santa Cruz da Vilariça recebeu carta de foral a 8 de Junho de 1225, concedida pelo rei D. Sancho II, concedendo-lhe importantes regalias fiscais e penais. Cito algumas a título de exemplo: a isenção das obrigações de fossado, a atribuição da liberdade aos mouros e servos, a autonomia de jurisdição do concelho, a igualdade entre o cavaleiro-vilão de Santa Cruz ao infanção de outros lugares e do peão a cavaleiro-vilão.
               O abandono desta vila fez com que surgissem algumas lendas visando explicar o acontecido:


               (…) foi esta villa de Torre de Moncorvo, antigamente situada entre o rio Sabor e a ribeira da Villariça em hum outeiro, que dista do lugar, em que agora tem o seu assento, huma legoa; ainda hoje naquele sitio se vem os muros, parte de uma torre e outras mais relíquias da sua antiguidade; e ali se chamou a villa de Santa Cruz.
Hé tradição que se mudara daquele sitio pela muitidão de formigas, que não só fazião damno considerável em todos os viveres, mas aos mesmos viventes lhe cauzarão notável oppressão; e resolvendo-se a evitar estes incommodos forão para o pé do monte Reboredo a onde havia huns cazaes de que era senhor hum chamado Mendo, o qual dizem que a sua caza tinha huma torre e domesticava nela hum corvo, lhe ficaram chamando por alcunho, Mendo do Corvo.
Crescendo depois a povoação e tendo o foral de villa lhe chamarão a villa de Mendo do Corvo; que com fácil corrupção se continuou a chamar a villa de Mencorvo. Outros dizem que a sua ethimologia se dirivou do mesmo monte, que a domina, a quem chamavão Monte Curvo e os que seguem esta derivação, escrevem, e lhe chamam villa de Moncorvo.” (Manoel António Vasconcelos) in Memórias Paroquiais de 1758 (Torre de Moncorvo).
               É com a possível praga de formigas que é justificada a decisão de os habitantes de Sta. Cruz  mudarem a vila:
                 “(…) forão para o pé do monte do Reboredo, a onde havia huns cazaes de que era senhor hum homem chamado Mendo, o qual dizendo que a sua caza tinha huma torre: e domesticava nela hum corvo, lhe ficaram chamando por alcunho, Mendo do corvo”. In Memórias Paroquiais de 1758 (Torre de Moncorvo).
 Convém acrescentar que este não é o único local em Trás-os-Montes onde se atribui uma mudança de local a pragas de formigas.
                 Quer tenha sido por falta de água ou por razões de insalubridade, a única certeza que temos é que a mudança ocorreu para um local onde já existiam “huns cazaes”, como referem as memórias paroquiais, e que, devido ao aumento da população, D.Dinis, concede foral, em 12 de Maio de 1285, seguindo os mesmos moldes do de Sta. Cruz à vila de “Turre Menendi Corvi” .
                A partir da mudança, não é muito difícil imaginar o que aconteceu a todo aquele espaço. O local perdeu importância, as muralhas e os torreões degradaram-se. O mesmo aconteceu à igreja. Simultaneamente, a partir do séc. XIV, Torre de Moncorvo começa a sofrer um grande desenvolvimento económico.
       Actualmente, a forte e imponente muralha ainda nos observa, meio camuflada, qual camaleão, por entre vegetação de vários tons, conforme as estações do ano. Mas é só isso. Pois, apesar de ter sido classificada como Monumento Nacional (por Dec.nº26-A/92, DR 126 de 1 de Junho de 1992), a Vila Velha está condenada ao esquecimento.

2 comentários:

  1. PARA SABER MAIS SOBRE O ASSUNTO:

    ABREU, Carlos (1998), Torre de Moncorvo – Percursos e materialidades Medievais e Modernos, (Dissertação de Mestrado em Arqueologia, (policopiado), F.L.U.P., Porto;
    ALVES, Manuel (1934), Memórias Arqueológico-Históricas do Distrito de Bragança, tomo IX, Bragança, pp.479-483;
    CARQUEJA, Mª da Assunção (2007), Documentos Medievais de Torre de Moncorvo, C.M.T.M., s/l,;
    GOMES, Paulo Dordio (1993), O povoamento medieval em Trás-os-Montes e no Ato Douro.
    Primeiras impressões e hipóteses de trabalho, (Dissertação de Mestrado), FLUP, Porto,
    (policopiado).
    GOITIA, Fernando, Chueca,(1996), Breve História do urbanismo, Col. Textos de Apoio, Ed.
    Presença, Lisboa;
    LEMOS, Francisco Sande (1993), Povoamento romano de Trás-os-Montes Oriental (Tese de
    doutoramento), Universidade de Braga, (policopiado).
    MAGALHÃES, Francisco António Carneiro de (1845), Acerca de uma antigualha curiosa em
    Trás-os-Montes, in Revista Universal Lisbonense, IV, Lisboa. (29 de Maio), pp. 545-546.
    MARQUES, A.H. Oliveira, (1987), A sociedade Medieval portuguesa, Ed. Sá da Costa, 5ª ed., Lisboa;
    MARQUES, José (1995), Aspectos do povoamento do norte de Portugal nos séculos XIII-XIV,
    s/e, Guimarães, 1995;
    MARQUES, José (1998), Os municípios transmontanos nos séculos XII-XIV. Alguns aspectos,
    in Revista O município no mundo Português - seminário internacional, nº1, edição C.E.H.A.-
    S.R.T.C., Coimbra, 1998, pp.7-36;
    RODRIGUES, Adriano Vasco (1957), A vila morta de Santa Cruz da Vilariça, Horizonte, vol. IV,
    nº45,Guarda, pp.73-76.
    RODRIGUES, Adriano Vasco; PINHO BRANDÃO, Domingos de, (1962), Missão de estudo
    arqueológico da região da Vilariça - Moncorvo, in Studium Generale, vol.9, nº1, Porto, 1962,
    pp.336-351.
    RODRIGUES, Miguel, (1994), Cerâmicas Medievais da Região de Moncorvo (Séc.XII-XIII) Tese de Mestrado em Arqueologia, Porto, (policopiado);

    SANTOS JÚNIOR, J. (1983), A derruída ou Vila Velha de Sta. Cruz da Vilariça, in Trabalhos de
    Antropologia e Etnografia, volume XXIV, fascículo III, Porto, pp.538-547.
    TAVARES, José Augusto (1922), Colecção arqueológica, in O Arqueólogo Português, vol. XXV, Lisboa, 1921-22, pp.128-133.

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  2. Ao aceitar textos de outros colaboradores o blog fica mais enrequecido e nós agradecidos.Bom trabalho de Susana Bailarim.Que não fique por aqui.Seguir as pisadas de Santos Júnior é um bom começo .Aguardamos pelo próximo texto com fotografias a cores.Da autora.
    M.C.

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