É, para mim
efectivamente um privilégio, poder apresentar este texto, que tanto gostei de
ler e que vos vai deliciar, quando o lerem. Sobre este texto falarei
detalhadamente mais lá para a frente.
Vou fazer esta
apresentação, falando de dois aspectos distintos: 1º o Homem e o Autor (intrinsecamente
indissociáveis um do outro) e finalmente, sobre a supracitada Obra.
Começando pelo
homem: Antero Augusto Neto Lopes, nasceu em Bruçó, concelho de Mogadouro, duas terras
que lhe estão gravadas profundamente no seu coração, como o tem demonstrado a
sua obra e a sua paixão). Licenciado em Direito pela Faculdade de Direito da
Universidade de Coimbra, cidade que lhe está também no coração, como não podia
deixar de ser, uma vez que, quem foi estudante em Coimbra jamais a esquecerá.
(apesar de ser benfiquista, eu bem vi como vibrou com a vitória da sua
Académica, quando esta conquistou a última Taça de Portugal em futebol...) Como
diz o poema: tem saudades dela quem nunca nela viveu. O Antero não “passou”
apenas por Coimbra, não, lá viveu intensamente a vida de estudante, da velha
boémia estudantil e da vida associativa (a sua Associação Académica de Coimbra).
Pimenta de Castro,Antero Neto e Paulo Carvalho |
Exerce,
actualmente a profissão de advogado em Mogadouro, terra onde vive e a quem
dedica um amor profundo. Por falar em amor, aqui tem os seus amores: a Raquel,
a Ritinha e o Rodrigo.
Para além de
um excelente causídico, o Antero colabora com as revistas “!Bô” e Epicur (onde
tenho o privilégio de ser seu parceiro, numa colaboração regular desta revista
de topo da sua especialidade). Publicou os livros “Serões do Planalto” (contos, Editora Labirinto, 2006), que tive a
honra de apresentar em Bruçó e “Bruçó –
Memórias Paroquiais de 1747 e 1758 – Notas Históricas e Etnográficas” (ensaio
histórico, Editora Cidade Berço, 2010), que tive a honra de apresentar aqui em
Mogadouro.
Sei que tem pronto a publicar em breve, outro livro de contos, que
aguardamos com grande expectativa. Para além desta vertente de escritor, o
Antero criou um blog, intitulado Mogadouro (Ho Mogadoyro), com uma grande
audiência e que tem levado o nome de Mogadouro a todo o país e ao estrangeiro.
Quando fomos recentemente (no Carnaval) a Paris, muitos emigrantes conheciam-no
e visitavam-no frequentemente.
As suas obras,
com uma grande qualidade literária, tornaram-no membro da Academia de Letras de
Trás-os-Montes.
Vamos agora
analisar a obra de hoje aqui se apresenta: “Toleradas em Mogadouro – O Suicídio de Maria Carçôna”.
Antes de passar propriamente à obra, direi que,
como nota prévia, este trabalho, extremamente importante para Mogadouro (em particular
e Trás-os-Montes em geral), para mim se inscreve na linha de pensamento da
escola dos Annales, ou seja, um novo género de história, não da história
factual, dedicada apenas ás grandes personagens, mas á História das
mentalidades e, como diria um meu grande professor a “História dos homens sem
história”. Ou seja, sobretudo ao estudo das mentalidades. Como diz a Wikipédia:
“Fundada por Lucien Fevre e Marc Block, propunha-se a ir além da visão positivista
da história como crónica de
acontecimentos, substituindo o tempo breve da história dos acontecimentos pelos
processos de longa duração, com o objectivo de tornar inteligíveis a
civilização e as "mentalidades (…) Annales visam ser como um retracto do
espectro de '29, uma época de mutações, que iria ser como que a catapulta
essencial para um novo tipo de história, a económica, a social...e empreender
um corte na história política, na história individual, mas, sem a
arredar de cena, como a vertente mais social vinha sendo vitima (era um pouco
ostracizada, colocada num patamar secundário, bem no fundo da história política
ou militar...)” fim de citação.
Escreveu o grande historiador
Georges Duby, no seu livro “Amor e Sexualidade no Ocidente”: “O que fazia vergonha às nossas mães não já
faz vergonha aos nossos filhos. É aqui que se dá a ruptura”. É neste
sentido que hoje, mais do que nunca, se faz a História.
A obra “Toleradas
em Mogadouro – O Suicídio de Maria Carçôna”, assim chamada por ser natural
de Carção (concelho de Vimioso), de seu nome Maria do Nascimento Lopes, foi
dividida pelo autor em três grandes capítulos: 1º A prostituição ao longo da
História; 2º A prostituição em Mogadouro – o caso de Maria Carçôna e finalmente
o 3º e último capítulo Regulamento policial das toleradas no distrito de
Bragança. Desde já uma pergunta se põe, porquê Toleradas? O Antero
esclarece-nos dizendo o seguinte: Prostituta: substantivo feminino (o
latim prostituta); mulher pública,
rameira, meretriz. Tolerada: substantivo feminino; prostituta que tem o nome
inscrito nos registos administrativos e está sujeita à inspecção e
regulamentação policial; mulher pública. (in”Grande Dicionário da língua Portuguesa”, 25ª Edição, Bertrand Editora).
Na 1ª parte do texto o Antero Neto dá-nos uma
perspectiva deste tema na Antiguidade Clássica (Greco-Latina), apesar de ser
considerada a profissão mais velha do
mundo, poderia ter recuado bem mais longe…Mas adiante…Também nos fala em
Portugal na Idade Média, como veremos.
Na
Grécia Antiga, as prostitutas eram designas por “porné” e aos prostíbulos de
“porneion”. Além das “porné” também existiam as “bacantes”, que ao contrário
das “porné”, eram mulheres livres. Ainda havia as “hetairas”, que eram
acompanhantes de luxo (aonde eu já vi isto?...). não nos podemos esquecer que Afrodite era a deusa grega do
Amor…e Vénus era a sua semelhante em Roma. Para não me alongar mais, passemos a
Roma, das bacanais, do luxo e do deboche. Como escreveu o Antero:”A própria lenda da criação de Roma assenta
numa prostituta. Efectivamente, e a crer em vários estudiosos que tentam
racionalizar o mito da fundação, a “loba” que amamentou os gémeos Rómulo e Remo
não terá sido um exemplar feminino do género “Lúpus canis”, mas antes uma prostituta, que exercia a sua profissão
junto dos pastores da região, e que se chamava “Lupa”. Daí terá nascido a designação dos “lupanária”, que eram os prostíbulos romanos”. Tal como hoje,
também os tempos oscilavam entre os “moralistas” e os mais liberais. Não
resisto a citar o livro do Antero em duas passagens (ambas na página 7, do seu
livro. Assim o Antero Neto escreveu: O moralmente rígido Catão, o Velho, ao
encarar com um nobre da nobreza romana a abandonar as instalações de um
lupanar, disse-lhe: Bravo! É aqui que os
jovens devem satisfazer os seus ardores, em vez de se atirarem às mulheres
casadas!” E mais á frente o Antero cita uma inscrição encontrada numa
estalagem, que é deliciosa, senão reparem: “Estajadeira, vamos a contas!
-Bebeste
um sexteiro de vinho: um ás.
- Comeste
guisado: dois ases.
-Está
certo.
-Pela
rapariga: oito ases.
-Está
correcto.
-Feno para
o macho: dois ases.
-Este
macho vai ser a minha ruína!”
Depois
descreve o que se passou em Portugal que, não vou descrever, senão não
compravam o livro…A não ser dois “aperitivos”. Em 1170 Afonso Henriques faz
publicar a primeira norma a reprimir o
exercício da prostituição, mandando prender as “barregãs dos clérigos”…E o que
sucedeu a D. Nuno Álvares Pereira quando tentou expulsar do seu exército as “mancebas mundaneiras? Foi o diabo, pior
que os Castelhanos… “O próprio condestável
declarou depois que nenhum perigo ou batalha receara tanto, nem tivera inimigos
que mais lhe custassem a vencer; mas, com a sua astúcia e prestígio, sempre
conseguiu sair-se bem da arriscada empresa, logrando a expulsão desejada”. Mas
isso devem ler neste livro, que cita Fernão Lopes e o Abade de Baçal.
No
cerne da questão, deste livro, está o suicídio da Maria Carçôna.
Em
Mogadouro não havia qualquer casa de tolerância. “isso não impediu, contudo, a presença de toleradas e o exercício da prostituição
na vila. Tal facto é contactável a partir de uma leitura atenta e crítica do
processo judicial de Maria Carçôna”, aqui a prostituição seria mais “sazonal”.
Esta tolerada suicidou-se por enforcamento, cita o Antero “O cadáver pendurado da torsa da porta da cozinha, no dia 16 de Outubro
de 1916” (nos Gorazes), por causa de um amor mal resolvido. Depois
provou-se que foi mesmo suicídio. Diga-se que era nesta Feira anual que,
segundo me contaram naturais de Mogadouro, uns já falecidos, outros, felizmente
ainda vivos, que se dava a “iniciação sexual” da maioria dos jovens, sobretudo
do sexo masculino, na terra de Trindade Coelho (no local dos castanheiros e nas
Sortes). Mas quem eram estas prostitutas? Diz-nos o Antero” as prostitutas eram mulheres novas,
abandonadas pela família ou a ela fugidas numa tentativa de escapar ao espectro
da miséria. Depois diz: “Em jeito de
conclusão, pode dizer-se que a prostituição no concelho de Mogadouro era,
sobretudo, um fenómeno sazonal, não assumindo particular relevância, ao ponto
de aqui se instalar uma casa de tolerância, permanente e organizada, existindo
uma ou outra meretriz que por cá achava acolhimento, como o caso de Maria
Carçôna, ao contrário do que sucede nos tempos que correm quando se constata a
existência regular e habitual de casas de alterne, na vila e no concelho.”
Este é um caso interessante que não vou
desenvolver mais pois senão, não compram o livro.
Finalmente
na 3ª parte está o Regulamento Policial das Toleradas no Distrito de Bragança,
publicado em 18 de Janeiro de 1908. É interessante verificar a preocupação com
a higiene e com a saúde pública. Este regulamento remete-nos para a mentalidade
da época. Hoje, com a hipocrisia da proibição da “profissão mais antiga do
mundo”, leva à sua “clandestinidade” e á propagação de doenças sexualmente
transmissíveis, entre elas a SIDA. Também, hoje as pessoas estão mais
esclarecidas, nomeadamente nas escolas com a obrigatoriedade da educação
sexual, contudo é preciso ter em atenção a este perigo permanente sobre a nossa
sociedade,
Obrigado por me ouvirem, vão ter oportunidade de
ler este livro que nos conta uma “história” diferente de Mogadouro e do nosso
país.
Tenho Dito!
António
Pimenta de Castro,
Mogadouro, 27 de Maio de 2012
Nota: apresentação, feita por António Pimenta de Castro , do livro de Antero Neto "Toleradas Em Mogadouro - O suicídio de Maria Carçôna", na Casa da Cultura de Mogadouro.
Gostei bastante de apresentar este livro. Parabéns Lelo, sempre em cima dos acontecimentos
ResponderEliminarNão é justo colocarem este texto e depois vamos às livrarias,quiosques e super e o livro não esá à venda.Como fazemos para o ler?Organizamos um passeio a Mogadouro,almoçamos na Lareira e fazemos uma ronda pelas cafetarias à procura dos dois autores.De castigo ,um assina e fala do livro ,o outro fala dos dois ;autor e livro. Regresso a casa com paragem no Artur.O professor Pimenta de Castro podia trazer uns livros para vender aos moncorvenses (medida troiquiana).Lá se vai o passeio.
ResponderEliminarLagar ,Carró e na papelaria do senhor Cardanha,dez exemplares em cada.Sugestões.O texto do professor abre o apetite.
Leitor
Arraiais,feiras e putas sempre andaram ligados.Perdi (ou ganhei)os 3 na Senhora do Amparo à luz do luar e dois à espera.Voltei feliz e com uma blenorragia - descobri 15 dias mais tarde.
ResponderEliminarDas minas de ferro às barragens do Sabor dava um bom trabalho de investigação.
Marialva
Ora então, a pedido de várias famílias, lá encarregarei o Pimenta de Castro de colocar o livrinho à disposição dos amigos moncorvenses na Taberna do Carró. Um abraço a todos.
ResponderEliminarAntero
O meus parabéns ao autor Dr. Antero Neto e também ao apresentador Dr. Pimenta de Castro.
ResponderEliminarPara ambos um grande abraço.
Júlia Ribeiro
Parabéns ao Meu querido amigo Dr. Pimenta de Castro
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