A solidariedade é um das qualidades humanas. É seguramente uma das melhores características da gente de Trás-os-Montes. Faz parte do nosso DNA, desde tempos imemoriais. Todos e cada um de nós tem, seguramente, lembranças, recordações, testemunhos de gestos, atos e situações de solidariedade entre nós que, sendo prova do superior fundamento do carácter nordestino, foi e será igualmente um dos pilares de sobrevivência coletiva. Ser solidário está-nos no sangue.
Quem não se sente não é filho de boa gente. Quando o poder central diminui ou priva, Moncorvo ou os moncorvense de algo a que temos direito, desperta, naturalmente em nós a revolta coletiva e solidária. Mas não somos insensíveis nem nos é completamente alheio se essa diminuição ou privação forem exercidas num vizinho nosso, num qualquer concelho do nosso distrito. São muitos e variados os exemplos de justo apoio a reivindicações e protestos nordestinos coletivos. Porque tudo quanto for retirado aos nordestinos, estejam eles onde estiverem, é-nos em maior ou menor parte retirado a cada um de nós.
E se o prejuízo que nos causam for feito de forma gratuita, sem o aproveitamente de ninguém, então a nossa revolta e protesto será, justamente, maior e mais justo se tal for possível.
O nordeste não é uma arquipélago. Moncorvo não é uma ilha. O que acontece no nosso concelho diz-no respeito, mas o que se passa ao nosso redor não nos é, nem pode ser, indiferente. Sempre que uma população ou território nordestino é privado do que quer que seja, é também a nós que privam, na devida proporção.
Não sou natural de Miranda nem falo mirandês, tal como os membros desta Assembleia e a maioria dos nossos conterrâneos nordestinos. Mas nem Miranda nem o mirandês nos são alheios ou indiferentes. Somos, justamente por isso, o único distrito, a única região portuguesa, com duas línguas oficiais.
A língua é o maior, melhor e mais precioso ativo que temos. É a língua que nos permite expressar todos os nossos sentimentos. É através da língua que manifestamos o amor, a raiva, o ódio, a compaixão, a dor, a alegria e todas as outras manifestações boas ou más. As nossas línguas são o português e o mirandês. Fazem parte do nosso património. Não falo, tal como disse o mirandês. Mas entendo-o. Entendo-o, curiosamente quando o leio em voz alta. Porque, pouco me dizendo a grafia escrita, os sons são-me todos muito próximo e familiares. Porque o mirandês, embora confinado na sua essência às terras de Miranda não tem uma fronteira rígida e inviolável. Contaminou e foi contaminado por toda a região envolvente!
Amadeu Ferreira, falecido recentemente, teve várias homenagens em Lisboa e no nordeste. Teve muito menos que as que merecia e mais que as que desejava. A que mais ainsiava não he foi feita. A ele e a nós que somos nodestinos, que somos transmontanos, que somos da Terra de Duas Línguas: a assinatura por Portugal da Carta Europeia das Línguas Regionais ou Minoritárias.
Tal ato não acarreta nenhum custo para o Estado Português. Nem monetário, nem, que se saiba, político. Somos um dos poucos estados que ainda não aderiu a essa carta. Enquanto nordestinos estamos a ser espoliados de um ativo demasiado importante para que fiquemos calados assistindo sem nada dizermos, sem nada fazermos.
A recusa negligente do estado português em assinar a Carta Europeia das Línguas Regionais ou Minoritárias é uma ofensa aos mirandeses, é uma ofensa aos nordestinos, é uma ofensa aos transmontanos, é também uma ofensa aos moncorvenses.
O 25 de Abril que recentemente celebrámos trouxe-nos de volta a demoracia e a liberdade sequestradas durantes décadas. Sendo certo que uma das principais regras da democracia é o governo das maiorias, uma das princiais conquistas da liberdade é o direito das minorias.
Por isso proponho a esta nobre Assembleia que analise, discuta melhore e altere, se assim o entender, mas que aprove a seguinte moção:
Moção
O mirandês é a segunda língua oficial portugesa desde Janeiro de 1999 consagrada na lei 7/99 de 29 de Janeiro da Assembleia da República onde o Estado Português reconhece o direito de cultivar e promover a língua mirandesa enquanto património cultural (Artigo 2.º) bem como o direito a apoio científico e educativo (Artigo 5.º).
Miranda do Douro e o mirandês são, respetivamente, território de Trás-os-Montes e e património cultural de todos os transmontanos.
Ao não assinar a Carta Europeia das Línguas Regionais ou Minoritárias o Estado Português está a contrariar uma determinação da Assembleia da República, sem qualquer benefício conhecido, prejudica gratuitamente a região mirandesa e transmontana e as suas gentes.
A Assembleia Municipal de Torre de Moncorvo, reunida em sessão Ordinária a 27 de Abril de 2015 delibera no âmbito das competências conferidas pela alínea o) do n.º 1 do Artigo 53.º da Lei 5-A/2002 de 11 de Janeiro:
Manifestar o seu firme e enérgico protesto pelo desinteresse governativo nesta matéria ;
Exigir do Governo da República a assinatura urgente da Carta Europeia das Línguas Regionais ou Minoritárias;
Instar todas as entidades públicas em geral e as transmontanas, em particular, a associarem-se a esta atitude de protesto e exigência;
Dar conhecimento desta moção a todas as Câmaras e Assembleias Transmontanas e publicitá-la nos principais órgãos de comunicação;
Assembleia Municipal de Torre de Moncorvo, 27 de Abril de 2015
Nota: título da responsabilidade do editor.
Nota: título da responsabilidade do editor.
Antonio Cangueiro :obrigado ao Lelo Demoncorvo pela divulgação e a José Mário Leite pela iniciativa e o excelente texto de introdução para a moção. Estão de parabéns também os deputados municipais da Câmara Municipal de Moncorvo pela aprovação e seus munícipes.
ResponderEliminarCarlos Ferreira Muito obrigado Lelo e José Mário Leite: grandes vultos, grandes e verdadeiros amigos. Obrigado a todos os deputados moncorvenses. Ontem propus, e foi aprovada por unanimidade e aclamação, moção que agradece o gesto amigo e subscreve na íntegra o texto da vossa: tardia, mas bom, os santos da terra, é complicado. Abraço
ResponderEliminarJosé Mário Leite :Carlos e Antonio, o importante é que se crie um largo movimento unitário de pressão sobre os responsáveis, para que a Carta seja rapidamente assinada. Mais importante que a partida, é o ponto de chegada. E esse só pode ser um: a defesa intransigente do interesse nordestino. Abraço bem arrochado
ResponderEliminarMário Correia :Muitos parabéns pela iniciativa!
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