Temos a chave da porta da frente, tomamos o pequeno-almoço na cozinha e temos uma governanta para nos ajudar. A Casa Dona Maria Luiza, em Torre do Moncorvo, no Douro Superior, é a homenagem de dois netos a uma avó de 91 anos.
O edifício é mais moderno do que a maioria que ocupa o centro de Torre do Moncorvo, vila transmontana cuja origem remonta ao século XIII, e por isso não é difícil perceber onde fica a Casa Dona Maria Luiza. Quase se confunde com um prédio de habitação mas é, na verdade, uma unidade hoteleira moderna e sossegada, gerida pelos irmãos André e João Meneses. A partir das duas casas de família, contíguas, os dois jovens decidiram fazer uma homenagem à avó, Maria Luiza, hoje com 91 anos. Muitas paredes foram deitadas abaixo, desníveis minimizados, traços rústicos eliminados. “Quisemos apostar nas linhas mais contemporâneas, sem pretensiosismos, tudo muito clean, branco e minimalista”, explica o primeiro irmão, enquanto nos dá a provar um Porto tónico e amêndoas cobertas, gesto de boas-vindas que, diz, é repetido com todos os hóspedes que escolhem passar a noite na casa com o nome da sua avó.
São dez os quartos, divididos por dois pisos: duas suítes e oito duplos, todos com um tema. Os produtos da região dão nome a alguns dos quartos, cuja decoração e aroma giram à volta do mel, do vinho, da amêndoa, da azeitona, do azeite e da amendoeira em flor. Nos restantes, mantém-se o conceito, mudam os elementos: terra, ferro, água e barro, que marcam a paisagem de Torre de Moncorvo. Todos têm um provérbio e um desenho nas paredes, brancas e luminosas, bem como os equipamentos normais e uma óptima ligação de Internet sem fios, gratuita. “Meia vida é a candeia e o vinho a outra meia” é o provérbio que se pode ler na porta da casa-de-banho da suíte do vinho, a única com uma generosa banheira de hidromassagem no centro do quarto.
Quase nada resta dos dois imóveis antigos de família, mas André conta-nos que viveu numa das casas até aos 18 anos, quando saiu da vila para estudar fora — como muitos o fizeram e ainda fazem. Depois de alguns anos em Lisboa, fixou-se no Porto, a partir de onde gere esta casa feita hotel. André e o irmão João foram surpreendidos pelas taxas de ocupação “acima da média da região” e já pensam em aumentar a família da Dona Maria Luiza com um projecto de agro-turismo, com adega e produção própria, “numa lógica complementar”. “Esta casa é no centro da vila e, por isso, não temos uma piscina, por exemplo, que é algo que falta. No Verão, não temos esse espaço de lazer e, na tal quinta, vamos poder ter isso tudo”, justifica o consultor.
É uma casa de família
O pequeno-almoço é servido na moderna cozinha, numa mesa grande e comunitária. D. Teresa, a governanta da casa, põe a mesa de avental para quem vai descendo dos quartos, sem pressas, tal e qual como se estivéssemos em casa da avó. Não temos que nos levantar para escolher fruta ou doces, está tudo ao nosso alcance. Às variedades de pão, branco ou de cereais, há para juntar os habituais queijos, fiambre e compotas caseiras. É a D. Teresa quem faz as três que provámos — de figos, pêra e geleia — e, também por isso, sabe sugerir as melhores conjugações. O queijo de ovelha de meia cura, da vizinha freguesia da Cardanha, é imperdível. O que apetece é ficar pela cozinha familiar até que a manhã acabe, a provar a fruta da época e a dar conta do queijo, bem devagarinho.
Como a todos os hóspedes são dadas duas chaves — da porta principal e do respectivo quarto —, não há o constrangimento de uma recepção mais tradicional, daquelas em que é necessário entregar chaves ou cartões. A ideia é, realmente, fazer de conta que se está em casa de alguém de família.
André, de 33 anos, não quis concentrar todos os serviços no hotel. Prefere, diz, que as pessoas “vivam a vila e o concelho”, onde não faltam restaurantes e casas de petiscos (com os quais o hotel pode, a pedido, fazer marcações), a curtas caminhadas ou viagens de carro de distância. Mercearias antigas e outras lojas de produtos regionais não são difíceis de encontrar nas imediações da Casa Dona Maria Luiza: os queijos de ovelha abundam, tal como os enchidos, os azeites e as amêndoas cobertas.
Estas últimas fazem parte da identidade de Torre de Moncorvo (o concelho português que mais produz o fruto) e já em 1886 fizeram sucesso na Exposição Universal de Paris. São fabricadas, artesanalmente, de três maneiras diferentes: as simples e cobertas com açúcar; as morenas, com canela ou chocolate; e as peladinhas, cobertas apenas com uma fina camada de açúcar.
O centro desta vila transmontana percorre-se a pé com facilidade, em passeios livres ou visitas guiadas pelos principais monumentos, agendadas no posto de turismo. A história está em todas as esquinas do casco medieval: desde a Porta da Vila ao que resta do castelo, mandado construir pelo rei D. Dinis, no século XIII. A praça principal, de Francisco António Meireles, tem ainda um chafariz filipino mandado erguer em 1636. Dá para perceber que estamos numa terra com centenas de anos de vida, marcas antigas e bem preservadas em ruas onde carros não entram. Brasões familiares ornamentam as casas apalaçadas e a Igreja Matriz, que levou perto de cem anos a ser concluída, é a maior de Trás-os-Montes.
E porque todos temos direito a abraçar um lugar-comum de vez em quando, porque não terminar a tarde nos bancos em frente aos sossegados Paços do Concelho, a apreciar o verde da serra do Reboredo e a história da “Sintra de Trás-os-Montes”?
A Fugas esteve alojada a convite da Casa Dona Maria Luiza
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Como ir
Saindo do Porto pela A4, o ideal pode ser percorrer esta auto-estrada até Alijó, onde se sai para o IC5, em direcção a Miranda do Douro. Daí, o IP2 com destino à Guarda passa por Torre de Moncorvo, a cujo centro histórico se chega em poucos minutos pela variante.
De Lisboa, seguir pela A1 até Torres Novas, trocando aí para a A23, em direcção a Castelo Branco, a percorrer até à Guarda. Continuar pela A25 até esta se cruzar com o IP2 para Trancoso/Bragança. Na saída para Torre de Moncorvo, tomar a variante até ao centro da vila.
O que fazer
Passear a pé pelo centro histórico de Torre de Moncorvo e visitar os museus da vila (do Ferro, de Arte Sacra e a Oficina Vinária) são boas escolhas. Para quem prefere caminhadas mais longas — ou passeios de bicicleta — no meio da natureza, a Ecopista do Sabor tem percursos de vários quilómetros, ao longo de parte da antiga plataforma da linha do Sabor. Bem perto fica Foz do Sabor, a única aldeia de pescadores da região de Trás-os-Montes. Aqui, o peixe do rio frito é o petisco favorito.
Ao Museu Arqueológico do Côa chega-se, de carro, em 30 minutos. Só o edifício do museu, inaugurado em 2010, faz por merecer a viagem, tão bonita. As visitas ao Parque Arqueológico do Côa também partem daqui, mas carecem de marcação prévia.
A cerca de 60 quilómetros de Torre de Moncorvo fica a medieval Castelo Rodrigo, uma das doze Aldeias Históricas de Portugal.
Onde comer
Uma vez que o ponto forte da Casa Dona Maria Luiza são os pequenos-almoços (ainda que seja possível pedir alguns petiscos até ao final da tarde), o centro de Torre do Moncorvo é a melhor opção para almoçar ou jantar. A pé, pelas ruas de comércio tradicional e varandas de madeira, facilmente se chega ao restaurante Lagar e à Taberna do Carró, que distam poucos metros entre si e têm vista para a imponente Igreja Matriz. No primeiro, a cozinha regional é protagonista: as favas da época com entrecosto e pudim de castanha são imperdíveis. Na Taberna do Carró, a sugestão vai para a posta de carne na brasa, apenas temperada com umas pedras de sal e azeite da região, e para a omelete de espargos selvagens.
Fonte: http://fugas.publico.pt/hoteis/348605_casa-dona-maria-luiza?pagina=-1
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