02.12.1899 – Nota da Caderneta de Lembranças:
- o administrador Ramiro Guerra mandoume à recebedoria da câmara, ó thizoireiro que me deçe a folha para assinar e o dinheiro dos oito dias que já tinha de serviço.
02.12.1998 – Eis o Editorial do quinzenário Terra Quente reportando-se a esta data:
- O dia 2 de Dezembro de 1998 ficará marcando para todo o sempre a história cultural desta região. Na manhã deste dia, a UNESCO, reunida em Quioto, lá nos antípodas do planeta, declarou solenemente o Vale do Côa como Património da Humanidade, por ser “uma ilustração excepcional do desabrochar súbito do génio criador no dealbar do desenvolvimento cultural do homem” e porque “ a arte rupestre do paleolítico superior do Côa revela, de forma perfeitamente excepcional, a vida social, económica e cultural do primeiro antepassado da humanidade…
Foi o maior de todos os acontecimentos de natureza cultural até hoje registados na região. E isso, naturalmente, deveria merecer apoio inequívoco de toda a gente da cidade e do concelho, a adesão espontânea e festiva de todos os Fozcoenses e Alto-Durienses.
O acontecimento merecia ser celebrado com uma grande festa. Era uma distinção a nível mundial! E uma tal distinção, em princípio, deverá atrair gente de todo o mundo e significar maior desenvolvimento regional.
Interpretando este lógico pensar, o Chefe do governo de Portugal outra coisa não poderia fazer do que vir a Fozcôa celebrar com os Fozcoenses e Alto-Durienses tão importante acontecimento. Para mim, ele sempre se manifestou atento a celebrações de vitória, incluindo no campeonato nacional de futebol.
O que eu, porém, nunca julguei ser possível foi a existência de um tão grande divórcio entre o país político e o país real como em Fozcôa. Com efeito, a grande maioria da população pareceu-me completamente alheada do acontecimento e lamentando que a barragem tivesse ido por água abaixo. E isto para mim é tanto mais significativo quanto o Parque e o Procôa existem há três anos, tempo suficiente para conquistar a simpatia da gente da região.
Como é possível um tal divórcio, um paradoxo desta natureza? Será que os Fozcoenses são tão parvos que não vêm os extraordinários benefícios que lhe oferecem? Ou será que tudo não passa de uma campanha de promoção e aproveitamento político de um valor cultural para “inteligentes verem”, sem respeito pela gente da terra e expectativas criadas?
Acompanhei o processo desde o início e sempre me pareceu que ele se desenvolvia à maneira do PREC, do facto consumado, sem a serenidade necessária para uma avaliação correcta das várias hipóteses.
Agora que o PREC chegou ao fim, importará fazer uma pausa e provocar uma discussão alargada aos vários sectores. Não pode ficar entre os arqueólogos e os bem-pensantes citadinos que, naturalmente, pensarão nos investimentos em termos de preservação, estudo e fruição selectiva dos valores culturais. É que os Fozcoenses querem que os valores culturais sejam utilizados para o desenvolvimento regional. E isto significa que, sendo as gravuras do Côa um monumento científico de interesse mundial, ele só trará desenvolvimento à região na medida em que for utilizado como monumento turístico (e turismo de massas, também), coisa que os Foscoenses ainda não viram, embora o Parque contabilize em 20 000 os turistas que este ano visitaram as gravuras.
António Júlio Andrade
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