DEDICATÓRIA
Quero dedicar este meu trabalho, à memória do meu saudoso amigo, João Bernardo Sárrea de Barros, mais conhecido por Sr. Barros dentista. Pelos muitos e memoráveis momentos de convívio, vividos em conjunto, juntamente com o meu querido e saudoso Tio Mário, junto à sua reconfortante lareira, em noites de longa invernia transmontana, em tardes de douta conversação, no seu consultório, quer ainda, em noites encantadas de luar, (como só em Mogadouro existem) perfumadas pelo aroma do meu cachimbo e pela sua agradável presença, sentados no pátio da sua casa, em amena e harmoniosa cavaqueira.
Com este pequeno opúsculo, quero iniciar a publicação de uma série de pequenos trabalhos, sobre algumas figuras de Mogadourenses ilustres, que eu conheci e a quem não foi, ainda, prestada a devida homenagem[1]. Essas pessoas, foram ilustres, cada um à sua maneira, uns a trabalhar, outros a escrever, eu sei lá, tanta coisa bonita e digna de memória que fizeram. Todas elas são pessoas, que tiveram a sua importância, no seu tempo, e a quem a sua terra natal, ou a que escolheram como sua, ainda não soube prestar a homenagem, que muito justamente merecem. Vou começar essa série de opúsculos, com o meu saudoso amigo João Bernardo Sárrea de Barros, mais conhecido como Sr. Barros dentista. Creio, que é justo este meu preito de homenagem ao homem que tratou dos dentes, a várias gerações de transmontanos, sobretudo Mogadourenses, e não só…. Não seria um primor de suavidade, na maneira como lidava com os seus pacientes, as suas mãos não seriam, possivelmente as mais delicadas, para o seu delicado ofício de dentista, mas todos lhe devemos reverência, não só por ser praticamente o único dentista que existia em Mogadouro e arredores mas, sobretudo pelas quantias irrisórias que levava aos seus pacientes, sendo muitas vezes paga a consulta, com ovos, lenha, galinhas ou qualquer outro género agrícola, porque o dinheiro naquele tempo não abundava. Por falta de dinheiro, nunca ninguém saiu do seu consultório sem ser atendido e vi eu muitas vezes, aos mais pobres, nem sequer dinheiro lhes levava. Foi uma figura, que marcou Mogadouro, penso que ninguém contesta esta minha afirmação, e isto basta para lhe prestar a minha sincera homenagem.
Lembro-me, como se fosse hoje, da primeira vez que vim a Mogadouro. Foi no, já longínquo ano de 1980. Estava eu, no último ano do curso de História, da Faculdade de Letras da Universidade do Porto e vim conhecer a terra que viu nascer a minha futura mulher. Fui recebido principescamente pela sua família, que me mostrou todos os monumentos e lugares dignos de uma visita, em Mogadouro e outras terras vizinhas e, obviamente, apresentado às pessoas conhecidas e amigas. Foi assim que conheci o Sr. Barros, como era tratado por toda a gente da terra. (Curiosamente, o meu Tio Mário, a quem o ligava longos anos de uma amizade sincera e profunda, tratava-o, carinhosamente, por Barros Terra, creio que por causa de uma personagem de livro ou telenovela brasileira, chamado, precisamente, Barros Terra). Ainda me lembro como foi esse primeiro encontro. O meu Tio Mário depois de me ter apresentado a várias pessoas conhecidas, metendo o seu braço no meu, disse-me: agora vou apresentá-lo a outro minhoto que vive em Mogadouro, é o meu amigo Barros, que é dentista e um homem muito culto. Entramos pelas traseiras da sua casa, que era um palacete de traça brasileira, na rua da República[2], ironia do destino, uma vez que ele era profundamente monárquico e, logo no átrio de entrada, reparei num letreiro que me despertou grande admiração. O referido letreiro, consistia numa placa azul, com letras em branco, que dizia assim: João Bernardo Sárrea de Barros, dentista e por baixo, com letras muito maiores e sublinhado, NÃO É DOUTOR. Seria, mais ou menos assim:
João Bernardo Sárrea de Barros – Dentista
(NÃO É DOUTOR)
|
António Pimenta de Castro
Ainda
hoje, quase toda a gente pensa que o Sr. Barros era transmontano, na medida em
que aqui viveu muitos anos e ainda pelo amor que tinha a esta terra e às suas
gentes. Na realidade, o Sr. Barros era minhoto de nascimento, embora
transmontano de coração e de adopção.
João Bernardo Sárrea de Barros nasceu
em Vila Praia de Âncora, concelho de Caminha, distrito de Viana do Castelo, no
dia 12 de Agosto de 1902. Era filho de António Joaquim de Barros e de Maria da
Soledade Sárria. Num documento da capitania do porto de Viana do Castelo,
Delegação da Marinha – Âncora, datado de 6 de Abril de 1922, vem descritos
alguns sinais característicos do
jovem João Bernardo Sárrea de Barros, teria então vinte anos de idade que, pelo
seu interesse, transcrevemos na íntegra: “Altura, – 1,72; Boca, regular; Barba, preta; cabelos, castanhos; cor, natural; nariz regular; olhos,
castanhos; sinais particulares, não tem. Documentos apresentados para
a sua inscrição – Certidão de idade e
consentimento materno. Habilitações literárias, 2º ano do curso elementar de pilotagem”. “Documento da Capitania do
porto de Delegação Marítima de Âncora, Distrito marítimo do Norte, Livro n.º 2,
nº 334, Folhas n.º 135, assinado pelo delegado marítimo A. Rodrigues da Silva.”
Como acabamos
de ler, o Sr. Barros frequentou a Escola de Pilotos em Caminha, onde obteve a
carta de piloto em 6 de Abril de 1922. Durante cerca de três anos, exerceu a
profissão de piloto na frota bacalhoeira de Viana do Castelo, que demandava a
Terra Nova. A vida de marinheiro, embarcado num bacalhoeiro, era uma vida
extremamente dura, monótona e perigosa. Eram muitos meses passados no
isolamento no meio da gélida neblina da Terra Nova. Apesar de ter nascido numa
terra á beira-mar, não era vida para ele. Assim, após três anos desta fatigante
e deprimente actividade e de assistir a vários acidentes e, inclusivamente sofrer
um violento naufrágio, decidiu mudar de vida. Segundo fonte familiar, a sua mãe
insistiu com ele para abandonar tão perigosa profissão.
“Acabou por desistir de profissão tão
arriscada e foi então que se virou para a arte dentária, tendo como orientador
o competente Cirurgião Dentista António Ramos (em Vila Praia de Âncora). Por esse tempo e na sequência da
revolução republicana de 1910 estava (ainda) fechada a Escola de Odontologia de Lisboa, então a única escola de
formação de dentistas existente em Portugal.
Enquanto aguardava a
reabertura da Escola, foi aconselhado a vir para Trás-os-Montes, onde não havia
ninguém que tratasse os dentes. Foi assim que se fixou em Moncorvo, em 1928 e
foi o Dr. Ramiro Guerra, então administrador do concelho e médico do partido
que lhe mandou passar alvará para ali exercer a profissão…E foi com brio,
empenho, abnegação e sentido pedagógico que trabalhou durante 65 anos.”[4]
Enquanto
aguardava a reabertura da Escola casou e, obviamente teve necessidade de
começar a trabalhar. Em finais de 1928, radicou-se em Trás-os-Montes, como
dentista e a terra escolhida foi Torre de Moncorvo[5].
Tinha então cerca de 27 anos. Não só foi bem recebido, como profissionalmente,
teve êxito imediato. Como me disse a sua filha Maria Júlia: “Esse êxito deveu-se, em 1º lugar, ao seu
trabalho: nele punha todo o seu saber, arte, empenhamento e perfeição técnica.
Em 2º
lugar destacava-se o seu carácter: era um homem estruturalmente honesto e
procurava fazer sempre o melhor para os seus pacientes. São famosas as
muitíssimas histórias que dele contam as pessoas pobres de Moncorvo e de terras
em redor, às quais não levava dinheiro”
Em 3º lugar era um
homem de cultura vastíssima: no âmbito profissional possuía um sólido
conhecimento científico e técnico, o que granjeou a confiança e a amizade de
grandes médicos como o Dr. Ramiro Guerra, o Dr. Rodrigues, a Dr.ª Lucília e
outros, que nunca hesitaram em recorrer aos seus serviços como dentista. Era um
profundo conhecedor de História, de Geografia, Química, Matemática,
Astronomia…Era um homem que lia muito. Em suma: era o típico autodidacta. E
era, sobretudo, um conversador extraordinário. Só quem teve o prazer de o
escutar, sabe quão interessantes e enriquecedoras eram as suas conversas sobre
temas como: Literatura, Ciência, Política, Religião.
Era católico e monárquico convicto.
Porém, homem algum é
composto apenas de qualidades. E ele, sendo um homem de convicções muito
firmes, era, por vezes, inflexível e até pouco tolerante para os que dele
discordavam. Teve uma filha fora do casamento. Mas amou as duas filhas[6] de igual modo, porque
soube ser um Pai excelente.[7]
Em Moncorvo, o Sr.
Barros, deu-se sempre com a melhor sociedade da terra. Entre outras, era um habitual frequentador das deambulações, quase
rituais, que as principais personalidades de Moncorvo faziam na placa central
da velha Praça Francisco Meireles, sobretudo depois do almoço. Era já uma
tradição, bem enraizada em Torre de Moncorvo, os maiores comerciantes e as
individualidades mais em destaque na terra, depois de almoço, “fazerem tempo” até abrirem as
repartições e o comércio, passearem, com regras bem definidas, na referida
praça, cavaqueando, ou como se costuma dizer “dando dois dedos de conversa”. Do tempo que o Sr. Barros passou em
Torre de Moncorvo, como personalidade carismática que era, contam-se inúmeras histórias,
umas verdadeiras, outras um pouco romanceadas.
O Dr. Armando Sanches de Morais Pimentel, dos Estevais de Mogadouro, grande
amigo do Sr. Barros, que com ele conviveu longos anos, contou-me há bem pouco
tempo um caso, que ele presenciou. O Sr. Barros comprava a fazenda para os seus
fatos (no tempo em que ainda havia alfaiates…), no comércio do Sr. Mateus.
Quando o Sr. Mateus começava a colocar as peças de fazenda em cima do balcão, o
Sr. Barros dizia-lhe: «Ó Mateus, não me compliques a vida! Põe-me só duas
peças, para eu escolher!». Depois do fato feito, o Sr. Barros dizia que gostava
sempre de espojar-se em cima da cama, pois, como ele costumava dizer: «não
gostava de vestir um fato novo muito direitinho, ou seja, não gostava de vestir
um fato, sem este antes ser amarrotado, ou seja, com vincos». Isto diz bem do sentido
de humor, da naturalidade e da personalidade do Sr. Barros…
Depois,
em 1971, mudou-se para Mogadouro[8], onde
trabalhou durante largos anos e onde viria a falecer e a ser sepultado no
cemitério da vila. Como escreveu a sua filha Maria Júlia: “Não terá sido, talvez, a sua decisão mais acertada, pois ficou longe
do círculo de amigos de mais de quarenta anos que tinha em (Torre de) Moncorvo. Os mais chegados continuaram a
visitá-lo, mas o tempo não perdoa e essas visitas foram rareando: uns porque
deixaram este mundo, como o seu mais íntimo amigo, o Dr. Ramiro Salgado;
outros, como o Dr. Leite, o Dr. Amável, a D. Cármen, porque a idade e a doença
os foram incapacitando.
Viúvo desde 1992, contraiu matrimónio, pela
segunda vez em 1993 em Mogadouro[9]. (com o D.
Ernestina Augusta Pereira, que viria a falecer em 06/04/2005). No entanto, em
Mogadouro, logo fez muitos amigos e sobretudo à noite, a sua casa enchia-se de
visitas, que o iam ajudar a passar o serão. O Sr. Barros faleceu, em Mogadouro[10] a 18
de Março de 1994. Está sepultado no cemitério desta vila transmontana. Não
obstante o que escreveu a sua filha, como já referi, em Mogadouro, o Sr. Barros
tinha muitos e dedicados amigos, das mais variadas classes sociais, sou
testemunha pessoal disso. O Sr. Barros era muito considerado na terra de Trindade
Coelho e nela tinha muitos e dedicados amigos, que ainda hoje o recordam com
grande saudade.
Durante
toda a vida de dentista, mais de sessenta e cinco anos, tratou os dentes a
várias gerações de transmontanos, de Moncorvo, Alfândega da Fé, Vila Nova de
Foz Côa, Freixo de Espada à Cinta, Mogadouro, Vimioso, Sendim, Duas Igrejas,
Miranda do Douro e de muitas outras povoações recônditas, deste Nordeste
Transmontano, muitas vezes sem levar um tostão sequer aos seus pacientes. Era
assim o Sr. Barros…: “O seu
profissionalismo e ética eram sobejamente conhecidos. Os doentes estavam sempre
em primeiro lugar, mesmo que isso implicasse sacrifícios de ordem pessoal ou
familiar. Trabalhou sem horário e sem férias, aos sábados e domingos. Aliás,
nessa altura todos podiam ir ao dentista, porque a falta de dinheiro não
impedia o tratamento adequado. (…) mesmo as crianças iam tratar os dentes, sem
acompanhante e sem choradeiras. O Sr. Barros tinha sempre uma história para
lhes contar.”[11]
Dele
contavam-se, e ainda se contam, inúmeras histórias, umas verdadeiras, outras
inventadas, como sempre acontece com personalidades fortes e carismáticas. A
sua filha Maria Júlia escreveu uma delas, que eu ouvi, senão esta, outra
semelhante, a propósito do Sr. Barros: “Um
dia vinha a tia Ingelca mais contente e ligeira que uma cotovia, quando uma vizinha
lhe perguntou a razão de tal alegria: “se te parece!” – respondeu a tia Ingelca
– “Venho agora mesmo de arrancar um dente”. “E estás tão contente por
arrancares um dente?” “Ai não, que não estou! O Sr. Barros não aceitou os 100
mil réis e disse-me que fosse comprar pão para os meus filhos!”[12] Esta história
define bem o carácter deste Homem, com um H grande. De facto, apesar de ter
trabalhado bastante, o Sr. Barros não enriqueceu…Eram outros os tempos e outros
os homens…Nunca lhe conheci, e penso que nunca teve em toda a sua vida, um
automóvel em 1ª mão. Ainda me estou a lembrar do seu “velho” Peugeot, se não me
engano, do modelo 404, em que andei muitas vezes, com o Sr. Barros ao volante, em
viagens, que eram verdadeiramente uma aventura…., soube através de amigos meus,
que em Torre de Moncorvo tinha um Citroën “arrastadeira”.
Teve defeitos?
Claro que os teve, quem os não tem? Como se costuma dizer: “errar é próprio do homem”. Mas as suas
qualidades superavam, em muito, os seus defeitos…
O Sr. Barros
era um homem muito culto, sendo, no entanto um autodidacta. Interessava-se
pelas coisas mais variadas e inesperadas, desde a fotografia, à encadernação de
livros, dos finos trabalhos de ouro à estatuária em gesso, da mecânica à arte
de navegar, do jogo das damas ao xadrez, a fazer Cristos, que depois metia em
garrafas brancas, até na vulgar “sueca” era imbatível. Era exímio, na arte de
encadernar livros, quer encadernando os seus livros novos, quer recuperando
velhos alfarrábios, que lhe iam parar à mão. Era bom intelectualmente e nas
artes manuais.
Outra
qualidade do Sr. Barros, era a sua invulgar memória, tinha, como se costuma
dizer, “uma memória de elefante”. Lembrava-se de tudo, com pormenores
incríveis. E ele viveu até muito tarde…imagine-se o que ele sabia…
Mas
o seu passatempo preferido era, sem dúvida, a leitura. Lia muito, como disse a
sua filha Maria Júlia: “Ele era um
leitor ávido, atento e absorvente. Grande conversador (e eu que o diga….), a literatura, a ciência, a filosofia, a
arte de marear – eram temas em que valia a pena escutá-lo. Quem o ouvisse
ficava sempre um pouco mais rico. A sua agudeza de espírito levava-o a observar
e tomar notas. Buscava a explicação para todos os factos e fenómenos. O seu
pensamento era lúcido, racional e científico.”[13]
Escreveu inúmeros
artigos, em revistas e jornais, alguns sobre Odontologia, a maior parte sobre
política ou outros assuntos do seu interesse. Gostava muito de escrever e, nesse
sentido, publicou um pequeno opúsculo intitulado “Porquê?” e um livro de maior fôlego, intitulada “Domínio da Cárie e da Piorreia”, que eu
li e reli, tantas vezes, quando o Sr. Barros o andava a escrever. Facto
curioso, eu, já farto de ler e reler os vários capítulos que ele me ia dando
para ler, ia, por vezes, “fazendo vista grossa” e apenas fingia que os estava a
ler. O Sr. Barros, apercebendo-se disso, fazia como se faz aos miúdos, dava-me
certo tempo para ler e, depois, fazia-me perguntas sobre o que eu tinha lido….
No prefácio ao
seu livro “Domínio da Cárie e da
Piorreia”, escreveu o Professor Doutor Oliveira Torres: “O Senhor Sárrea Barros é um homem que leva
quase 60 anos de trabalho dedicados à Odontologia. Viu muito, laborou muito e
meditou. Podia apenas, como tantos, resolver os problemas e deixar para os
outros a tentativa da sua compreensão e explicação. Porém, o seu entusiasmo e o
seu intelecto são superiores ao simplesmente ver passar os dias e buscou então
explicações para o que observava (…) É, sem dúvida, uma personalidade culta,
hábil e inteligente.”[14]
Dentro do âmbito
profissional, o seu mérito foi reconhecido, foi distinguido, entre outros, com
os seguintes prémios: No ano de 1984, foi distinguido, por unanimidade, com o
colar de Santa Apolónia, padroeira dos dentistas, «distinção atribuída ao
melhor dentista do ano em curso». Também o Sindicato Nacional dos
Odontologistas o distinguiu com a Medalha de Mérito no ano de 1986.
Foi
também um grande pedagogo. Como escreveu a sua filha, Maria Júlia: “Era assim o Sr. Barros. Só estava contente
quando ajudava alguém a promover-se. Procurava falar sempre de modo que as
pessoas analfabetas daquelas aldeias lá no ar de Judas o entendessem. Uma das
comparações que mais frequentemente utilizava era a do buraquinho pequenino
numa meia e que, se não fosse cosido a tempo e horas, se transformaria num
buraco enorme até que a meia já não tinha conserto: -“É assim que acontece com
os dentes. Tal e qual”.[15]
É assim que
recordo o meu “velho” amigo, João Bernardo Sárrea de Barros: inteligente, bom
conversador, altruísta, bondoso, culto e Amigo. Não podia deixar de escrever
este pequeno texto sobre ele. O que está escrito fica! O que não está, cai no
esquecimento! E o Sr. Barros não se pode esquecer.
O meu amigo
Sr. Barros faleceu no dia vinte e oito de Março de mil novecentos e noventa e
quatro, com noventa e um anos de idade e está sepultado no cemitério de
Mogadouro, sepultura nº 386. No seu assento de óbito, arquivado no cartório
paroquial de Mogadouro, está registado o seguinte: “João Bernardo Sarria de Barros de 91 anos de idade, no estado de casado
com Ernestina Sarria[16], filho de António
Joaquim de Barros e de Maria da Soledade Sarria, faleceu no dia vinte e oito de
Março de mil novecentos e noventa e quatro, na freguesia de Mogadouro, concelho
de Mogadouro, e foi sepultado catolicamente na paróquia de Mogadouro, não tendo
recebido os sacramentos.
O Pároco Francisco José Silvestre”.[17]
O
Sr. Barros, em 1994, sofreu uma pneumonia e esteve internado na Clínica do
Bonfim, na cidade do Porto. Como tinha muitas saudades de Mogadouro e sobretudo
do seu ambiente doméstico e das suas “coisas”,
logo que lhe foi possível, regressou a esta vila transmontana, onde viria a
falecer em sua casa[18], pelas
12 horas (doze horas e zero minutos)[19], do
dia 28 de Março de 1994, vítima de um acidente vascular cerebral (AVC), tendo
sido sepultado no cemitério[20] do seu
querido Mogadouro.
Como disse a
sua filha Maria Júlia: “Para terminar,
há que dizer que, após uma vida extraordinariamente cheia, teve a alegria de,
nos últimos anos, ver reunidos à sua volta as filhas e os netos e sentir-se
envolvido pelo amor e carinho de todos”.[21]
Estou em
acreditar que, foi para ele uma enorme alegria, ver toda a sua família reunida,
ele que tanto a prezava. Foi um homem Bom. Quem o conheceu, ficou mais rico.
Para finalizar, como ele gostava de dizer, «Que Deus o tenha na Sua Santa
Guarda».[22]
António
Pimenta de Castro
O AUTOR
*Historiador, docente no Agrupamento de Escolas de Torre de Moncorvo, membro da “Academia de Letras de Trás-os-Montes” e do “Clube dos Poetas Vivos das Terras da Nóbrega e Valdevez” colaborador da revista Epicur.
[1] - Penso, que a Comissão de
toponímia de Mogadouro deveria atribuir o seu nome a uma rua da vila, onde
viveu tantos anos e a quem tanto amou.
[2] - A
fachada principal da sua casa, que era um palacete
com traços de arquitectura de influência brasileira, situava-se na Rua de Santa
Marinha. O acesso directo ao seu consultório fazia-se pela rua que dava para as
traseiras da sua casa, chamada Rua da República.
[3] -
Este jantar, deve ter sido realizado nos primeiros anos dos anos oitenta, como
foi recordado em conversa, entre mim próprio e o Sr. Dr. António Abílio Costa,
então Presidente da Câmara Municipal de Mogadouro e, também participante neste
memorável convívio. Nesse referido jantar no restaurante “A Lareira”, eu e o Sr. Barros, fomos agraciados com uma medalha de
mérito, que ainda conservo, que nos foi atribuída, pela Causa Monárquica. A referida medalha de mérito, que nos foi
colocada pelo Senhor Dom Duarte de Bragança, foi transportada de Lisboa pelo
Sr. Dom Marcus de Noronha. Neste jantar, participaram e ajudaram, também,
muitas senhoras de Mogadouro. Como já referi, foi um grande êxito, que deu
brado em Trás-os-Montes, e não só...
[4] -
Maria Júlia Guarda Ribeiro, no jornal Terra
Quente, página 11, de 01 de Agosto de 2002.
[5] - O
seu consultório e Moncorvo, segundo me informaram vários Moncorvenses, que
foram inclusivamente seus pacientes, situava-se na rua Visconde de Vila Maior,
também conhecida por rua de Santo António, antiga rua do cano.
[6] - O
Sr. Barros tinha duas filhas, uma chamada Maria da Conceição Barros Afonso
(Afonso, por parte de marido e que vive na cidade do Porto) e a outra Maria
Júlia Guerra Ribeiro (que vive em Leiria).
[7] -
Maria Júlia Guerra Ribeiro e Maria da Conceição Barros Afonso, em uma carta que
me escreveram sobre uma breves notas biográficas do seu pai.
[8] - A
sua última morada em Mogadouro, que era sua propriedade, em que viveu largos
anos e que eu visitei inúmeras vezes, situava-se na rua de Santa Marinha.
[9] - Dados que me forneceram
as suas filhas.
[10] - Na sua casa, situada na
rua de Santa Marinha.
[11] - Maria Júlia Guarda
Ribeiro, no jornal Terra Quente,
página 11, de 01 de Agosto de 2002.
[12] - Maria Júlia Guarda
Ribeiro, no jornal Terra Quente,
página 11, de 01 de Agosto de 2002.
[13] - Maria Júlia Guarda
Ribeiro, no jornal Terra Quente,
página 11, de 01 de Agosto de 2002.
[14] -
Prof. Doutor Oliveira Torres, no prefácio do livro “Domínio da Cárie e da Piorreia”.
[15]
-Maria Júlia Guarda Ribeiro, no jornal Terra
Quente, página 11, de 01 de Agosto de 2002.
[16] - O
Sr. Barros, que tinha ficado viúvo desde 1992, nos últimos anos da sua vida,
mais concretamente em 1993, casou com a D. Ernestina Augusta Pereira, que viria
a falecer, no dia 06/04/2005.
[17] -
Assento número 6. Este documento encontra-se arquivado no meu arquivo pessoal.
[18] - A propósito do nome da rua onde morava o
Sr. Barros, chamada Santa Marinha, ela
deveria chamar-se Marina e não Marinha. Senão, vejamos o que nos diz o
grande Abade de Baçal, na sua obra Memórias
Arqueológico-Históricas do Distrito de Bragança, volume VII, Os Notáveis,
página 292, Edição do Museu do Abade de Baçal, Bragança, 1986:” Marina (Santa) – O autor do Anno Histórico dá-lhe o nome de Mariana,
apesar de que o primeiro parece mais usado. A tradição, com todos os visos de
certeza, dá-a como natural do Mogadouro, distrito de Bragança. Gil Gonçalves de
Ávila, na primeira impressão do seu Theatro
de Salamanca, página 261, aponta-a como portuguesa, circunstância que
omitiu na segunda e terceira impressões, não se atrevendo, contudo, a dá-la
como natural de Espanha. Também não consta ao certo o tempo em que viveu,
apesar de que o Mappa de Portugal diz
haver-se ela retirado aos desertos de Salamanca pelos anos de 1450, cuja
asserção julgamos infundada, a não ser as graças e indulgências que o papa
Calixto III concedeu aos devotos que favorecessem as obras da sua primeira
ermida, e como este pontífice governou desde 1453 a 1458, talvez parta
daqui aquela indicação. Se assim é, não merece confiança. O corpo de Santa
Marina guarda-se com grande veneração, em sepulcro de mármore, na igreja do
convento que tem o seu nome, da ordem franciscana, situado meia légua ao
nascente da povoação portuguesa de Lagoaça, distrito de Bragança, mas já em
território espanhol do bispado de Salamanca. Sendo jovem ainda, retirou-se para
este local, onde perseverou até à morte numa gruta em vida solitária e
contemplativa, qual anacoreta.
Após o seu
trânsito, os habitantes daqueles contornos, tanta era a veneração que tinham
pelas suas excelsas virtudes, converteram a desabrida gruta em templo, para
favorecer a fábrica do qual o papa concedeu as graças já apontadas, e tanto foi
o entusiasmo, que em seu louvor se levantou o convento a que foi dado o seu
nome.
A cabeça da Santa,
encastoada em prata, guarda-se com grande veneração na sua igreja e é dada a
beijar ao povo no dia da Ascensão e a sua festa é celebrada, com grande
solenidade, a 4 de Maio.
O epitáfio do seu
sepulcro, escrito numa tábua que pendurada no mesmo, diz:
HIC JACET CORPUS HUMILLIMAE, AT-
QUE DEVOTISSIMAE SERVAE DEI B.
MARINAE. QUE HOC DESERTUM, UT
CHRISTO DOMINO FELICIVS, TOTOQUE
PECTORE VACARET, A SUA JUVENTA
PETIIT, QUAEQUE FELICISSIME, ATQUE
CATHOLICE EXTREMUM IN LOCO CLAU-
SIT DIEM. AT CUJUS TANDEM HO-
NOREM SACRA HAEC AEDEAEDIFICATA
FUIT” (1)
(1) – Agiologio Lusitano, referente ao dia 4 de Maio; João Baptista de
Castro, Mappa de Portugal, tomo II; Santos portuguezes, página 153, e Anno histórico, Vol II, pág. 19.
[19] - É
exactamente esta hora, ou seja, doze horas e zero minutos, que está na sua
certidão de óbito do Registo Civil de Mogadouro.
[20] -
Sepultura nº 386, situada, quem entra pelo portão principal, do lado esquerdo,
ao cimo do referido cemitério, antes de chegar à ampliação, feita recentemente.
[21] -
Maria Júlia Barros Guarda Ribeiro e Maria da Conceição Barros Afonso, em uma
carta que me escreveram, no dia 9 de Janeiro de 2007, com uma breve biografia
de seu pai.
[22] - “Que Deus o tenha Na Sua Santa Guarda”,
era, e ainda é, uma saudação usada pelos monárquicos mais tradicionalistas.
Mais um excelente texto do professor.Gostava de ter conhecido este senhor Barros.
ResponderEliminarFazem bem em publicar textos que andam perdidos nos fundos das gavetas ou das bibliotecas.Este é duas vezes bom,pelo texto e pelo biografado.
ResponderEliminarM.C.