quinta-feira, 13 de fevereiro de 2014

TORRE DE MONCORVO - FRANCISCO ANTÓNIO GARCIA

 Esta é a imagem da capa da Caderneta Militar do meu pai e da primeira folha com fotografia. Já era fotógrafo de profissão e mais tarde o seu grande amigo Barros meteu-lhe um volante nas mãos e fez dele motorista/taxista. O meu pai tinha por ele um carinho e admiração como de filho para pai . . . e fazia-o sentir no seio familiar.

A capa é em tecido preto de algodão, e a etiqueta está desgastada mas legível.Foi o 393 da 6ª Companhia do Batalhão de Metralhadoras 3, aquartelado no Porto, no edifício onde funciona agora o ICBAS -Instituto de Ciências Biomédicas Abel Salazar, que foi também o CICA (2 ou 3 ?).
Um ano após a sua morte, relato aqui um episódio da sua vida de taxista, ainda no tempo da PVT – Policia de Viação e Trânsito - com as suas motos BMW, que ilustra algumas das suas facetas: agilidade mental e rapidez na decisão.Nessa época a multa aplicada por conduzir sem o boné regulamentar era pesada; o meu pai sempre gostou de bonés, mas detestava o regulamentar devido à rigidez da pala e o incómodo que provocava na cabeça.
As clientes que transportava, duas idosas conhecidas do meu pai de que não recordo os nomes, nem da aldeia para onde iam, estavam no banco traseiro . . .
Na Vilariça, depois de uma curva, vê a brigada da PVT a uma distância que já não lhe permitia colocar o boné, que repousava no banco dianteiro direito, sem que os agentes não vissem. De imediato e sempre a olhar para a estrada, pediu para se começar a rezar o terço, e que só deixassem de rezar quando o meu pai dissesse. Ele mesmo começou, com um “Pai Nosso, que estais no Céu . . .” no que foi acompanhado pelas duas idosas.
Como era de esperar, a Brigada de Trânsito fez sinal para parar e encostar o carro à berma, e o meu pai insistiu: “Por amor de Deus não parem de rezar!” E as duas velhotas, obedientemente, sem saber o porquê de tanto fervor religioso, continuavam a rezar o terço.
O agente aproxima-se do carro, faz o cumprimento da praxe, e entra logo a matar, quando vê o boné no banco: “Então e o boné, não sabe que tem de trazer o boné na cabeça?” e a preparar-se para a autuação.
O meu pai, matreiro, retorquiu: “Sr. Agente, por respeito às orações que as clientes estão a rezar, tirei o boné quando começaram o terço.”
O polícia, recuou, virou-se para o meu pai e disse: “Vá lá com Deus que você já sabe muito . . .” Pisca da esquerda, e lá foi com Deus.
As orações pouparam-lhe uma multa, mas não o pouparam às pragas e raios das duas clientes quando se aperceberam da artimanha do meu pai.
Era assim o meu pai . . .

F. Garcia
Post pubicado a 22/02/2011

6 comentários:

  1. Fui vizinho durante oito anos do Sr. Garcia e recordo a fotografia que ele me tirou, quando tinha dez anos, para o meu primeiro Bilhete de Identidade. Fotografia "á laminute".

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  2. Matreiro,desenrascado,mas também profissional competente nas suas duas ocupações -a de fotógrafo e a de taxista.E também excelente pessoa.
    Episódio delicioso este,contado pelo filho.Sabe-se que houve muitos mais passados com ele.O dr.Fernando pode continuar a escrever (e fá-lo tão bem!)as estórias do seu Pai?

    Uma moncorvense

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  3. Olá, Fernando:
    Estas memórias deixam-me comovida. A nossa saudosa Mizé era quem sabia montes de estórias dos nossos pais.
    Grandes amigos: o Barros dentista e o Xico Cabeças. Um gostava de ensinar o que sabia e o outro era ávido por aprender.
    "Estava um para o outro: eram ambos inteligentes, honestos e generosos", costumava dizer a Mizé.
    Um dia, de grande calamidade (ciclone ou trovoadas e ventanias) para os lados de Celorico, carregaram os dois o velho Fiat amarelo com cabertores, colchões, tachos, panelas, arroz, farinha, etc. etc. e lá foram ambos distribuir esses artigos aos que mais necessitavam. A carga dentro do carro e no tejadilho era de tal maneira, que as pessas na nossa praça lhes perguntaram se iam montar algum circo ...

    Um grande abraço, Fernando

    Júlia

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  4. Mais informação em:
    http://lelodemoncorvo.blogspot.com/2010/09/torre-de-moncorvo-carros-de-aluguer.html#comments
    e:
    ;http://lelodemoncorvo.blogspot.com/2011/02/torre-de-moncorvo-efemerides-0202.html#comments

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  5. Francisco Garcia (neto)12 de março de 2011 às 23:20

    Entre muitas outras "estórias" admito que esta não era do meu conhecimento. Mas não me surpreende este tipo de "espertice" .. era uma época de desenrasca e cada um por si :) mais valor tenho de dar ao meu avô que criou três filhos lindissimos, um dos quais tem sorte de ser meu pai :)
    Recordar é viver

    beijo saudoso p/ meu avô homónimo e um maior para o senhor meu pai!!!

    beijinho

    amo-te

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  6. Emiliana Silva Guarani-Kaiowá Amei.
    Iniciei a minha carreira profissional em Vila Flor . E todas as semanas ia a Torre de Moncorvo, ao Noitibó. A Vilariça é uma das aldeis de VF?
    Beijo

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