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Viajemos desta vez até ao Convento de Santa Clara, de
Vinhais, distrito de Bragança. Este convento era feminino e pertenceu à Ordem
dos Frades Menores. A sua fundação, anterior a 1582, foi por vontade de Dr
António Álvares Ferreira, juiz de fora da Guarda, e casado com Dona Helena da
Nóvoa, que era natural de Vinhais. O convento esteve sempre sob jurisdição do
Bispo de Miranda. Em 1648 estava em ruínas e apenas com 2 freiras. Foi
restaurado e ampliado graças à generosidade de 3 vinhaenses, recebendo mais 3 religiosas
do Convento de Santa Clara de Bragança. Parece que o auge deste convento terá
sido entre 1664 e 1667, chegando a ter 112 freiras, e com uma abadessa que veio
do Convento de Amarante. Consta que tiveram um papel importante na defesa da
região em mais uma tentativa de avanço espanhol nas guerras da Restauração. O
convento encerrou em 1879 apenas com 1 freira e que foi expulsa pelo bispo
especialmente por vender o espólio para garantir a sua sobrevivência. Há
estórias ou lendas que se contam a propósito de uma freira que geria muito bem
todos os alimentos e que criou um dito popular à sua volta com uma expressão
que ainda hoje se diz: “… rende como o feijão da Madre Garcia”, conforme
publicou o Padre Firmino A. Martins no livro Folklore do Concelho de Vinhais,
já em 1927. A Madre Garcia deveria ter um sentido muito apurado para a
governação do convento e, por isso, fazer render as mercadorias disponíveis.
Apesar de estarem publicadas as receitas de Barriguinha de
Freira, Namorados, e Doce de Laranja, em livros ou revistas, parece que em
Vinhais pouca gente os conhece. Barriga de Freira é um doce de origem
conventual e que aparece em muitas regiões. Há no entanto doces identificados
com origem naquele convento e várias famílias referem antepassadas que dele
saíram e lhes deram as receitas. Tive informações privilegiadas com Paula
Barriga e Odete Barreiro que ambas continuam a confecionar, e dispõem de um
caderno manuscrito que foi pertença da sua bisavó e avó respetivamente, e que
sempre lhes disseram que algumas receitas teriam origem no Convento de Santa
Clara de Vinhais. Também tive confirmada a existência de doces daquele convento
através de texto de Roberto Afonso que muito me elucidou sobre o assunto.
A receita mais identificada é a de Delícias do Convento de
Santa Clara, também conhecida por Bolinhos de Amor, confecionada com ovos,
amêndoa, açúcar, castanhas e doce de gila. Seguramente parece ser a única
receita que teve origem no convento, de acordo com o caderno de receitas da sua
antepassada atrás referida. Tive a sorte de Paula Barrigas ter confecionado
estes doces que me ofereceu e que aparecem nas fotos.
Próximo de Vinhais também nos aparece o Recolhimento da
Oblatas do Menino Jesus, de Mofreita. Estas informações foram obtidas através
do já referido Roberto Afonso, em ajuda preciosa. Fundado em novembro de 1793
tendo como a “principal missão o abrigo a meninas da classe popular, pobres ou
desamparadas”, não impediu que rapidamente tivesse 70 donzelas. “A rotina das freiras
passava pela instrução religiosa, trabalhos domésticos, trabalhos artesanais e
exercícios de piedade.” É fácil de imaginar que aprenderiam também algumas
artes culinárias que ajudaram a desenvolver na região. Curiosamente este
Recolhimento só foi extinto com a República. Ainda se contam algumas estórias
sobre o bispo da diocese e relacionado com duas madres, cujo processo chegou ao
Santo Ofício…Por vezes há a tentação de tentar criar novas receitas. O
excelente sabor e a consistência invulgar destas Delícias apetece perguntar
porque não se instala a sua produção, e ajudar a estabilizar a identidade
regional gastronómica? Eu sei que o grande emblema local são os enchidos. Mas
“o doce nunca amargou”!
© Virgílio Nogueiro Gomes
O aspecto condiz com o nome ! (Os olhos comem primeiro).
ResponderEliminarO sabor só pode ser uma DELÍCIA.
Parabéns.