Não sei se já reparou numa coisa muito simples: um livro é sempre uma caixa de ferramentas. Há livros para tratar das plantas, há livros para ensinar a conduzir um carro, há livros para viajar pelo mundo fora, há livros para mostrar como se vive em sociedade, há livros para conhecermos as naus, os piratas, as aventuras dos mares e as ilhas dos tesouros, há livros para adormecer e histórias para levar as crianças a comerem a sopa. Mas sejam livros práticos, ou livros de ensino, ou aquilo a que se chama literatura, isto é, romances, poesia, ensaio, teatro, pensamento, história, todos os livros foram feitos, escritos e impressos, distribuídos, dados e vendidos, para ajudar cada um de nós a viver. E é por isso que há livros onde os filhos aprendem a gostar dos pais, os pais descobrem que os filhos não são exactamente como eles eram quando foram os filhos que ainda são, e há livros onde se ensina a ver paisagens, e outros que nos trazem os cheiros e os sabores de outros lugares, e há livros para aprender a namorar, a dizer a ternura, o amor, a dificuldade de dizer, o medo de envelhecer, a tristeza, o deslumbramento de o mundo existir à nossa volta. E nada, absolutamente nada, substitui essa enorme alegria de abrirmos um livro, de lermos meia dúzia de palavras, e vermos um outro mundo possível a nascer dentro dos nossos olhos e das nossas próprias palavras. Hoje em dia, é tudo muito rápido, e a gente perde-se no meio das informações, dos noticiários, dos jornais, das televisões, das internets, dos telemóveis de todas as gerações, e por vezes precisamos de fazer uma pausa, parar para arrumar as coisas à nossa volta e começarmos a pensar com a nossa própria cabeça. Pode ficar certo de que para nos ajudar a pensar, a trabalhar naquilo de que se gosta, a ser mais produtivo e criativo, ainda não se inventou nada de mais eficaz do que um livro. Um livro anda mais devagar, mas dá tempo ao tempo. Ao tempo para viver melhor. Vá com o seu filho a uma livraria, compre-lhe um livro de que ele goste, inscreva-o numa biblioteca, descubra o seu filho nos livros que ele lê e fique mais próximo dele ao falar-lhe dos livros que leu. Lentamente, mas definitivamente, cada livro novo vai fazer parte da família.
Maria Teresa Martins Marques Faria e Silva é investigadora integrada no Centro de Literaturas e Culturas Lusófonas e Europeias da Faculdade de Letras da Universidade de Lisboa, faculdade na qual se licenciou em Filologia Românica (1975) e obteve o mestrado em Literatura Portuguesa Moderna e Contemporânea (1992). Dirigiu a organização do espólio literário de David Mourão-Ferreira (Ministério da Educação/Fundação Calouste Gulbenkian), autor/tema da sua tese de doutoramento. Dirigiu e prefaciou a Edição das Obras Completas de José Rodrigues Miguéis no Círculo de Leitores (13 volumes, entre 1994 e 1996) e dirigiu uma nova edição da Obras Completas deste escritor, na Editora Assírio & Alvim. Colaboradora da Colóquio-Letras, Jornal de Letras, Mealibra, Escritor, Atântida. Para além de diversos ensaios incluídos em volumes coletivos, cita-se a seguinte produção literária publicada em livro: O Imaginário de Lisboa na Ficção Narrativa de José Rodrigues Miguéis, Lisboa, 1994; Leituras Poliédricas, Estudos de Literatura Portuguesa, Lisboa, 2002. Os seus principais estudos incidem sobre Cesário Verde, Gomes Leal, Raul Brandão, Vitorino Nemésio, José Régio, José Rodrigues Miguéis, Eugénio Lisboa, João de Melo.
Carta aos pais
ResponderEliminarNão sei se já reparou numa coisa muito simples: um livro é sempre uma caixa de ferramentas. Há livros para tratar das plantas, há livros para ensinar a conduzir um carro, há livros para viajar pelo mundo fora, há livros para mostrar como se vive em sociedade, há livros para conhecermos as naus, os piratas, as aventuras dos mares e as ilhas dos tesouros, há livros para adormecer e histórias para levar as crianças a comerem a sopa. Mas sejam livros práticos, ou livros de ensino, ou aquilo a que se chama literatura, isto é, romances, poesia, ensaio, teatro, pensamento, história, todos os livros foram feitos, escritos e impressos, distribuídos, dados e vendidos, para ajudar cada um de nós a viver. E é por isso que há livros onde os filhos aprendem a gostar dos pais, os pais descobrem que os filhos não são exactamente como eles eram quando foram os filhos que ainda são, e há livros onde se ensina a ver paisagens, e outros que nos trazem os cheiros e os sabores de outros lugares, e há livros para aprender a namorar, a dizer a ternura, o amor, a dificuldade de dizer, o medo de envelhecer, a tristeza, o deslumbramento de o mundo existir à nossa volta. E nada, absolutamente nada, substitui essa enorme alegria de abrirmos um livro, de lermos meia dúzia de palavras, e vermos um outro mundo possível a nascer dentro dos nossos olhos e das nossas próprias palavras. Hoje em dia, é tudo muito rápido, e a gente perde-se no meio das informações, dos noticiários, dos jornais, das televisões, das internets, dos telemóveis de todas as gerações, e por vezes precisamos de fazer uma pausa, parar para arrumar as coisas à nossa volta e começarmos a pensar com a nossa própria cabeça. Pode ficar certo de que para nos ajudar a pensar, a trabalhar naquilo de que se gosta, a ser mais produtivo e criativo, ainda não se inventou nada de mais eficaz do que um livro. Um livro anda mais devagar, mas dá tempo ao tempo. Ao tempo para viver melhor. Vá com o seu filho a uma livraria, compre-lhe um livro de que ele goste, inscreva-o numa biblioteca, descubra o seu filho nos livros que ele lê e fique mais próximo dele ao falar-lhe dos livros que leu. Lentamente, mas definitivamente, cada livro novo vai fazer parte da família.
Ção (com c de cão)
Maria Teresa Martins Marques Faria e Silva é investigadora integrada no Centro de Literaturas e Culturas Lusófonas e Europeias da Faculdade de Letras da Universidade de Lisboa, faculdade na qual se licenciou em Filologia Românica (1975) e obteve o mestrado em Literatura Portuguesa Moderna e Contemporânea (1992). Dirigiu a organização do espólio literário de David Mourão-Ferreira (Ministério da Educação/Fundação Calouste Gulbenkian), autor/tema da sua tese de doutoramento. Dirigiu e prefaciou a Edição das Obras Completas de José Rodrigues Miguéis no Círculo de Leitores (13 volumes, entre 1994 e 1996) e dirigiu uma nova edição da Obras Completas deste escritor, na Editora Assírio & Alvim. Colaboradora da Colóquio-Letras, Jornal de Letras, Mealibra, Escritor, Atântida. Para além de diversos ensaios incluídos em volumes coletivos, cita-se a seguinte produção literária publicada em livro: O Imaginário de Lisboa na Ficção Narrativa de José Rodrigues Miguéis, Lisboa, 1994; Leituras Poliédricas, Estudos de Literatura Portuguesa, Lisboa, 2002. Os seus principais estudos incidem sobre Cesário Verde, Gomes Leal, Raul Brandão, Vitorino Nemésio, José Régio, José Rodrigues Miguéis, Eugénio Lisboa, João de Melo.
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