CHEGOU O OUTONO
Chegou o Outono...caíram já as primeiras bátegas de
água...”Os Deuses” não se esqueceram dos homens e enviaram a chuva que vai
fecundar a Terra-Mãe. A Natureza, depois da canícula tórrida do Verão, está
desesperadamente amarela...ávida de chuva, com a “pele” gretada. Aqui e além
vêem-se manchas negras de incêndios...a terra suplica por água que, como
qualquer peregrino após longa caminhada, está cheio de sede...Cai a primeira
chuvada...a água escorre pela face da terra, como lágrimas de gratidão em face
humana...É este o milagre da vida!...
Para trás ficou mais um Verão,
lembranças de um tempo alegre em que descontraidamente se passaram férias junto
ao mar...tempo de passeios com a família, de refeições ao ar livre, debaixo de
sombras, à frescura de um rio...tempo em que recebemos amigos e visitamos
terras lindas...
Chegou o Outono...é tempo de
regressar a casa...Agora ao vermos cair a chuva por detrás de uma vidraça,
invade-nos uma estranha tristeza...como se a vida perdesse sedução, como se de repente se esfumasse a magia...ecoam ainda em
nós as alegres canções ouvidas nas noites quentes de Verão, mas a “música” da
chuva chama-nos à realidade, é tempo de voltar ao aconchego do lar, ao dia a
dia, enfim, à vida...Mas estamos tristes...nem o perfume que exala da terra
quente após uma chuvada, nos contenta...e no entanto, a vida chama-nos, o ciclo
da vida continua, é o eterno retorno...
Como por milagre, as ruas da vila
enchem-se de estudantes, quais andorinhas que regressam todos os Outonos
contagiando tudo e todos com a sua alegria...no campo, ouvem-se “roncos” de
tractores, ao longe, nos montados, recolhendo lenha para a longa invernia que
se aproxima. Nas vinhas ainda se ouvem vozes alegres, são as derradeiras
vindimas...
É sempre com uma certa nostalgia que
encaro a vinda do Outono, não sei explicar bem porquê, no entanto, é uma das
épocas do ano que mais gosto, talvez por ter nascido em Outubro...não sei, o
que sei é que adoro sentir o perfume da terra após uma chuvada, de pasmar
perante a imensidade das cores das folhas das árvores e das vinhas, com as suas
mil tonalidades, antes de caírem (aqui a Natureza usa todas as cores da sua
paleta), de ver os primeiros fumos das chaminés a subirem ao céu, como em
súplicas ao Criador, enfim, de estremecer aos primeiros frios...
Como dou graças ao Criador por viver
aqui, em Trás-os-Montes, no meio desta Natureza linda, a quem o Santo de Assis
chamou nossa irmã...Como tenho pena daqueles que vivem na cidade, rodeados de
betão e que apenas sabem que é Natal porque na televisão aparecem os anúncios
da sociedade de consumo, anunciando que é tempo de fazer compras, ou pelo homem
vestido de vermelho, de longas barbas brancas, que saiu de um anúncio da
Coca-Cola...Aqui na Província, com as raízes bem fundas, os olhos espraiando-se
pelo horizonte, metemos a mão na terra, agarramo-la e sentimos o seu cheiro.
Não, os “da cidade” não vão aos
bosques colher cogumelos, não sentem o cheiro a mosto e a vinho novo nas
adegas, não provam a aguardente quente a sair dos alambiques. Não, não ouvem a
bucólica “música” do chocalhar dos rebanhos, nem estremecem na cama ao “cantar
das almas”. Nem se apercebem da despedida das andorinhas, nem sentem, com vossa
licença, o “reco” a medrar na loja, com a farta vianda, aguardando o ritual da
matança.
Como é verdade a vida aqui! Aqui
ainda se olha o céu a pedir chuva, ainda se cospe nos calos das mãos para as
esfregar uma na outra, antes pegar no cabo de um “sacho”. Ainda se passa pela
horta para se levar para a ceia umas couves. Aqui, ainda se apanha azeitona à
mão, como quem desfia um rosário...
Não, quem nunca soube ouvir a “música”
da lenha a arder numa lareira, nem apreciou o “bailado” do fogo em volta dos
“rachos”, numa noite fria, nem a sinfonia modorrenta dos testos de uma panela a
saltitar em cima de um pote ao lume, não pode saber o verdadeiro sabor da
terra.
Queremos convidar o amigo leitor a
visitar Trás-os-Montes neste Outono. Convidamo-lo a vir connosco, aproveitando
uma réstia de sol, ver os tons vermelhos, esverdeados e amarelos das folhas das
vinhas, dos carvalhos e dos castanheiros. A vir comer uma boa posta, um arroz
de lebre ou uma deliciosa perdiz, acompanhados por um bom vinho tinto.
Convidamo-lo a vir connosco ao monte colher cogumelos, a beber um pouco de
aguardente ou provar o vinho novo, esse “néctar dos Deuses”. Vir comer
castanhas assadas, passear por montes e vales, em que a mãe Natureza, no seu
“instinto” de eterna renovação, todos os anos cumpre o ritual, sempre novo, da
metamorfose das cores e dos sabores. A vir saborear o sabor da terra,
transformada em caça, castanha, pão, vinho...Enfim a vir provar a vida...
Mogadouro, princípios de Outono de 2013.
António Pimenta de Castro
Abilio Da Ressurreicão Aires :Bela descrição do que somos, do que que se faz e do que são as nossas terras! Parabéns!
ResponderEliminarManuel Bento Fernandes :Que maravilha de texto sobre a identidade do estar em Trás-os-montes. Merece ser divulgado e partilhado.
ResponderEliminarMaria Da Conceição Crisóstomo: Que texto perfeito!
ResponderEliminarAntonio Abrunhosa :isso é verdade uns vivem por cá são obrigados ,por causa dos filhos outros esposas trabalham ,mas como é bom viver por esses lados
ResponderEliminarAnto Affonso-Art Poesis :Belo texto de A Pimenta de Castro...
ResponderEliminarLindo texto, parabéns
ResponderEliminarPalavras simples ..que sabem bem..!!
ResponderEliminarPalavras sàbias..e simples..que fazem bem...!! gostei..
ResponderEliminarO outono é lindo.. Este texto é mais uma ilustração desta bela estação.. Parabéns a quem com palavras o sabe pintar..
ResponderEliminarLindo texto que retrata tão bem a nossa querida região.Parabéns!
ResponderEliminarIrene
E com um Outono destes, quem teria medo do inverno?!
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