O NOTÁRIO DE ANSIÃES
Texto
literário sobre a Vila Amuralhada e o Castelo de Ansiães
Fico sempre preocupado perante esta questão do
património. Lembro-me de estar horas e horas, a olhar as pedras do arco de D.
Dínis e do que restava das muralhas, perto da chamada fonte romana, em VilaFlor, a minha bendita terra. Quando me cansava de não haver milagres de antanho
a saírem de entre as pedras, entrava na rua, para lá do arco, e ficava a ouvir
os longos discursos de um sapateiro anarquista. Falo disto para dizer que,
perante a enormidade dos discursos oficiais sobre o património, na nossa
infância e adolescência, acabava sempre a olhar para as pessoas e a tentar
descobrir o que estava para lá da história oficial, dos reis magnânimos e
cruéis, dos condes e dos grandes vencedores das batalhas e das lides mais
internas das cortes. Conheci o castelo de Ansiães pela mão de um notário de
Carrazeda de Ansiães. Torgueiro de raiz e de admiração incondicional por Miguel
Torga, tinha sido delegado do Ministério Público em Vila Flor. Nessa altura, em
1968, saía da Pensão Campos e circulava pela avenida, depois de jantar, mas
cedo se refugiava no quarto, a ler. Um dia, rebentou um escândalo literário em
Lisboa, nas páginas do jornal A Capital, que tinha a ver com um homem daquela
vila, regressado da guerra colonial. Urna estudante do Liceu de Bragança apresentara
um original de contos dele a um concurso literário, ganhara o 1° prémio e o
livro fora publicado com o seu nome...
MODESTO NAVARRO
Fonte: "ONDE NADA SE REPETE" - crónicas à volta do património. (excerto)
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