Criou a sua própria marca com selo de qualidade que se lhe reconhece pelas premiações que vão chegando. A Bio-Freixo significa antes de tudo, que é possível contrariar as escassas possibilidades que as terras do interior de Portugal parecem ter para oferecer. Aos 51 anos Gilberto Pintado mostra que as boas terras naturalmente têm que dar bons frutos. Investiu em Freixo de Espada à Cinta já lá vão mais de quinze anos num projeto ambicioso que tem como base a produção biológica. O negócio está a cada ano a crescer e o segredo diz que está em distinguir-se pela qualidade dos produtos, pois só um bom vinho poderá fazer um bom vinagre.
Como e quando surge o interesse para se lançar no projeto Bio-Freixo?
O interesse surgiu em 2006 quando
começamos a fazer o primeiro vinho 100% biológico, ou seja, sem aditivo
sulfuroso, que é o sistema tradicional e 100% natural. Aderimos à exploração
biológica em 2000, a exploração vitivinícola, e o vinho foi o primeiro produto
que desenvolvemos e pusemos no mercado. Fazíamos vinho tinto, vinho rosé e
vinho branco. Manteve-se estes anos mas atualmente estamos a produzir o vinho
tinto em grande escala, o rosé em pequena e o branco deixamos de fazer, só
fazemos lotes para o vinagre. Dentro dos produtos da parte do vinho surgiu
depois a variante do vinagre, porque só um bom vinho é que faz um bom vinagre.
Temos a madre desde o ano 2008 e portanto é dessa madre de cerca de 1000 litros
que temos, que fazemos o vinagre, vamos retirando e mandamos fazer as análises
laboratoriais e quando atinge aquela acidez que nós vemos que está adequado é
que engarrafamos. Entretanto vamos adicionando todos os vinhos que têm uma
determinada acidez volátil e elevada a essa madre. O vinho e o vinagre foram os
primeiros produtos a desenvolver, entretanto avançamos para outro projeto.
Houve uma evolução e depois como desde miúdo tinha curiosidade em fazer cerveja
artesanal do lúpulo que era ali da zona de Quintanilha, que era o HN3 e começamos a fazer experiências de plantação
aqui em Freixo, onde conseguimos duas produções por ano, ao passo que em
Bragança e Quintanilha só se consegue uma produção.
Quantas variedades de lúpulo
têm?
Três variedades, o HN3, o nugget e o golden e é com estas variedades que fazemos atualmente a cerveja.
Temos dois tipos de cerveja, a branca que é a ale e a preta que é a stout,
que recentemente foram medalhadas. Esse know how que foi adquirido desde 2011 e
o facto de termos todos os produtos e ingredientes produzidos por nós é mais
fácil controlar os parâmetros e conseguir fazer esta cerveja tão equilibrada,
100% natural e artesanal.
O nome Bio Freixo surge então naturalmente.
No Bio Freixo todos os produtos
que temos identificam o local e a região onde são feitos, no caso do vinho
biológico é “Dom Freixo”, o vinagre “Bio Freixo” e a cerveja “Freixo Beer” que
também identifica a região.
E o azeite?
Dentro denta gama temos também o
azeite, fazemos extração a frio, abrimos o lagar o ano passado, também com
certificação e modo biológico porque a ideia é fazer produtos naturais e de
qualidade certificados para que o consumidor tenha garantias da qualidade do
produto. Temos também a azeitona de mesa, embalada e de cura natural, também
certificada em modo biológico e um azeite picante ligado ao azeite verde que
fazemos agora no início da maturação entre setembro e outubro em que a azeitona
ainda está verde e depois adicionamos a guinda tradicional para fazer este
azeite também denominado “Bio Freixo”.
Todos os ingredientes que estão envolvidos na confeção dos produtos são
produzidos aqui em Freixo?
São. Este é o objetivo e a tal
garantia de qualidade. Temos todos os fatores de produção e controlamos esses
fatos, não utilizamos outro tipo de produtos que não sejam da região.
Todo este processo exige um trabalho agrícola aprofundado e depois todo
um estudo documentado e quase científico para se chegar ao produto final.
Inspirou-se em alguma receita ou criou as suas próprias receitas?
Tenho sobretudo muita curiosidade
e faço depois alguma investigação. São produtos que levamos anos a preparar e a
desenvolver, e só quando atingimos aquele ponto é que colocamos o produto à
venda no mercado.
Todo este trabalho de plantação,
cuidado e depois colheita é feito a quantas mãos?
Tenho dois funcionários, não a
tempo inteiro mas sazonais: para enrodilhar o lúpulo aos fios, depois a apanha,
portanto na altura das campanhas tenho dois colaboradores a trabalharem comigo,
tenho também um comercial na parte das vendas e depois tenho a parte da
exploração agrícola, vitivinicultura e contrato as pessoas em função das alturas
sazonais.
Qual é o produto que melhor vende?
Atualmente são quase todos mas
especialmente a cerveja e o vinho biológico. Os mercados para onde estamos a
exportar mais é Espanha e França, temos também para a Suíça uma encomenda para
o Natal, uma loja que nos veio visitar e que agora querem lá os nossos produtos
e outra na Holanda.
Sabemos que hoje o mercado nos dá a possibilidade de adquirir todos os
produtos que o senhor confeciona a preços reduzidos. Em Portugal como é que se
chega a um maior número de pessoas com este tipo de produtos específicos?
Este tipo de produto é de gama
média alta, e é um nicho de mercado que tem que ser alimentado e cada vez
começa crescer mais. Procuraboom de
procura por estes produtos. Por exemplo temos uma cooperativa em Espanha de 600
famílias de consumidores biológicos, semelhante à de cá, a Biocoop, que só
consomem produtos biológicos e onde temos praticamente todos os nossos produtos
e de facto a qualidade é o principal fator do sucesso de venda destes produtos.
mos lojas gourmet, lojas de produtos regionais e cada vez mais começa a haver um
mos lojas gourmet, lojas de produtos regionais e cada vez mais começa a haver um
De que forma é que esse “nicho” é alimentado para se chegar à obtenção
dos prémios que a Bio Freixo tem ganho nos últimos anos?
Em primeiro lugar é a qualidade
dos produtos, repare que não estamos a fazer nada de mais. Na questão do
vinagre, ele é natural, como toda a vida se fez mas o facto de ser um bom vinho
e a maneira como é elaborado, sem químicos nem adulterantes, mesmo aquele
vinagre tradicional, é essa característica que lhe dá valor. No caso da cerveja
não adicionamos açúcar nem gás carbono, fazemos a cerveja segundo a lei da
pureza de 1515, ou seja, água, cevada e lúpulo. E é através das três qualidades
de lúpulo que temos que dá para conjugar o aroma, mais aromáticas ou menos
aromáticas, ou com mais ou menos ácidos alfa. São essas características que nos
fazem chegar a um produto com qualidade e certificação biológica, é a tal
garantia que estes nichos de mercado querem quando consomem estes produtos.
No caso da cerveja quantos litros produz anualmente?
Já andamos à volta dos 5 mil
litros. Somos autónomos desde 2014 em termos de produção de lúpulo e vamos
aumentar essa produção para começar a vender lúpulo com certificado biológico,
porque atualmente há mas tem que ser importado da Bélgica, Áustria, em Portugal
existem apenas dois produtores de lúpulo mas fazem em modo convencional. E esse
é mais um projeto, colocar o lúpulo à venda para quem quiser comprar porque
além das características de dar a acidez com os ácidos alfa e o aroma à
cerveja, é também um antisstressante que dá para fazer chás e vários tipos de
produtos devido às características que ele tem e será também um produto para
ser comercializado futuramente.
Que diferenças é que existem entre a receita da cerveja branca e a
cerveja preta? A cevada é produzida em Freixo?
Sim o problema da cevada é que
nem em qualquer sítio se dá. Por exemplo o trigo e a aveia em qualquer terra,
logo que seja funda, se dá, a cevada é muito melindrosa, ou seja, tem que ser
num terreno fundo mas seco, não pode ter humidade mas tem que ser num terreno
quente. Antigamente e segundo os nossos agricultores aqui da região era nas
encostas de Poiares os melhores terrenos da cevada hoje estão todos plantados
de amendoeiras e vinhas. Nós já experimentamos vários campos, o último campo
que experimentamos foi em Lagoaça, três hectares através da Associativa de
Lagoaça mas também não se desenvolveu muito porque nós usamos a cevada dística.
Precisamos e é um projeto que também estamos a ampliar, é de novos campos para
ampliar a plantação da cevada. Vamos agora fazer uma plantação em Fornos numa
parte que há lá que não é muito húmida a ver se conseguimos aumentar a produção
de cevada. A cerveja é toda feita da mesma maneira. Nós usamos 50% de cevada natural
e 50% de cevada maltada na branca e maltamo-la até 80 graus, se maltarmos a 160
graus a cevada fica tostada, torrada e com aquele aroma final a café, a única
diferença é tostar mais ou menos a cevada que lhe dá aquele ar tostado e por
isso é que a cerveja preta é mais macia e aquele aroma final a café que é o
aroma a cevada tostada.
Que tipo de apoios ou incentivos é que um produtor artesanal tem?
Atualmente os projetos do PDR
2020 estão parados há dois anos. Mas estão previstas medidas de apoio para quem
se quiser lançar na parte da transformação dos produtos. Nesses apoios estão
previstos 50% a fundo perdido, na parte de plantação dá para plantar a parte do
lúpulo ou áreas semeadas, além de se receber o subsídio das áreas, que são as
MED, que são as áreas favorecidas, recebes depois também o apoio para a
instalação. O que é mais caro é toda a estrutura que o lúpulo exige porque ele
cresce dez metros de altura, tem que ter o sistema de irrigação. Cada 24 horas,
cada planta necessita de 6 litros de água, o que exige obrigatoriamente um
sistema automatizado ou manual de irrigação. Para essa instalação existem esses
apoios dentro do PDR 2020 é pena estarem há dois anos parados mas esperamos que
abram para ampliar o projeto de plantação do lúpulo, além de outro projeto
também para ampliação das cubas isobarométricas para manter a cerveja
refrigerada, para podermos aumentar ainda mais o stock tanto da branca como da
preta.
Sente qua ainda olham pouco para a produção por conta própria nas
terras do interior do país?
Embora estejamos isolados há uma
parte que devemos ainda explorar no interior. Porque estamos dentro de um
Parque Natural, em Trás-os-Montes, no Douro, e todos esses fatores estão ainda
pouco explorados, que sem querer já dá uma certa garantia. Por exemplo um
produto natural produzido no Parque Natural, atualmente para nós ainda não é
uma mais valia mas futuramente poderá ser por estarmos posicionados numa zona
favorecida que tem estes apoios para projetos e candidaturas, têm é que se
saber aproveitar. Estou-me a lembrar por exemplo que existe uma lei ainda do
tempo do Salazar, uma lei protecionista, que só se pode plantar lúpulo em
Bragança e em Braga, e alguém de Lisboa ou Cascais ou do Algarve que queira
plantar lúpulo não pode, aí é um incentivo para eles virem produzir em qualquer
zona de Bragança, e neste tipo de produtos a plantação só é feita em
determinadas zonas do interior. Em Lisboa, os colegas cervejeiros artesanais
que há lá, adquirem a matéria prima toda no exterior, compram o lúpulo na
Bélgica, Holanda, Alemanha. Eles depois desse tipo de lúpulo que compram mais a
cevada maltada ficam condicionados só àquele tipo de cerveja, enquanto nós
conseguimos fazer mais variedades e aromas
de cerveja. Em termos de lotes temos essa diversificação assim como a
cevada, que conseguimos fazer vários tipos de maltagem, enquanto que eles estão
sujeitos só àquele tipo de maltagem específica que têm que adquirir através do
comércio exterior.
Tem em vista o lançamento de algum produto novo?
Estamos a preparar um lote de
cerveja que experimentamos no início e correu mal, que é envelhecida em casco
de carvalho americano, porque antigamente guardavam a cerveja nos barris e nós
fizemos uma parte experimental inicial, e temos que aperfeiçoar esse produto
que futuramente estará no mercado como um lote especial. Temos o um vinagre
balsâmico, que está a envelhecer em carvalho americano, temos à volta de mil
litros a envelhecer, que será um produto a longo prazo, para ser posto no
mercado, ao fim de dez anos e temos também o sabonete artesanal que é feito só com a parte final, aquela borra fina do malte, mais o lúpulo que fica sedimentado no fundo da caldeira onde fazemos a cerveja artesanal cujas propriedades, antibacteriano, antissético, antidestringente, todas essas características vão originar um bom produto. Só que tem um sistema
burocrático que temos tido dificuldades em ultrapassar. A lei obriga que para cada
lote que se faz de sabonete haja uma análise a alergénicos que custa 85 euros, e essa
lei tanto é para quem faz 1 milhão de sabonetes como para quem produz 10 ou 20,
ora nós cada vez que fazemos um lote por exemplo de 200 litros poderemos
conseguir das borras, da parte final, 20 sabonetes, o que torna depois muito
cara a venda desse lote de sabonetes. Agora estamos a ver se conseguimos fazer
uma exposição e como nós fazemos sempre a cerveja igual queremos ver se conseguimos
juntar vários lotes e então só desse lote fazemos a tal análise, que é
obrigatória por lei, e fazer sabonetes só com a identificação desse lote, o que
tornará mais viável a produção de sabonetes muito mais baratos do que conforme
está atualmente a legislação. Logo que seja ultrapassada essa parte burocrática
esse produto começará já a ser lançado para o mercado.
Tenta ir ou chegar a um maior número de eventos e feiras relacionadas
com a venda destes produtos. Isso é um risco calculado na medida em que nunca
sabe se vai vender significativamente os seus produtos ou o segredo pode mesmo
estar em divulgar o máximo possível para atrair um mercado mais vasto?
Como há pouco referi nós
realmente estamos cá no interior e com estas feiras e eventos a ideia é dar a
conhecer, promover, e dar a provar os nossos produtos. Em todos os eventos em
que temos participado temos tido boa aceitação. Estou-me a lembrar do encontro
de cervejeiros que tivemos em Belmonte, de 21 cervejeiros, o nosso era o mais concorrido,
e os outros colegas toda a gente nos gabava a cerveja. O mesmo acontece com o
azeite e o vinho, os nossos produtos diferenciados de outros, conseguimos dar a
conhecer e criar novos mercados. Estou-me a lembrar que no evento que foi feito
em Évora da cerveja, depois conseguimos duas lojas que nos ficassem lá com os
produtos. Em geral quando vamos a estes eventos conseguimos lá sempre mercado
para ficarem com os nossos produtos, depois vão-nos encomendando através de um
despacho das transportadoras. Tem sido de salutar pelo menos nesta primeira
fase dar a conhecer e promover os nossos produtos através desses eventos.
Entre 2009 e 2011 houve como sabe um período crítico de crise económica
em Portugal. Notou alguma adversidade em termos de vendas nessa fase?
O vinho começamos em 2006 ,
embora em 2000 começássemos com a certificação em modo biológico, só começamos
a por o vinho no mercado a partir de 2006. Nessa fase o facto de ser um vinho
biológico ainda era desconhecido, ouvia-se falar pouco de vinho biológico, e as
pessoas nessa altura tinham curiosidade em provar o nosso vinho, estou-me a
lembrar que nessa fase nós vendíamos cada garrafa a 25 euros, e foi um período
excelente, de 2007 até 2011, para a venda do vinho. Além da curiosidade havia o
nicho de mercado que depois começou a aumentar também para outros produtos
biológicos, e para esse mercado faltava o vinho biológico.
Acha que está nas mãos de cada um contrariar estas adversidades que por
vezes ocorrem nas economias de todo mundo mas em particular em Portugal?
Nós falamos sempre de um produto
destinado a um consumidor de uma gama média alta o que, quando se refletem
estas crises e inconstante instabilidade, embora se sinta alguma variação, como
é destinto de todos os outros faz a diferença, e secalhar aí estará cada vez
mais a saída, apostar na diferenciação e qualidade do produto. Nós em
quantidade não conseguimos competir com outros países mas em termos de qualidade
nós temos condições climáticas excelentes na nossa região em Trás-os-Montes e
no Douro Superior para fazer todo o tipo de produto de qualidade. O caso da
vinha, noutras zonas do país por exemplo na Régua e ou Pinhão eles têm que
fazer em média e por ano, entre 15 a 20 tratamentos fitofármacos, aqui no Douro
Superior há anos que não precisamos de fazer nenhum tratamento, fazemos
prevenção apenas uma ou duas vezes contra o míldio. Este ano foi atípico mas
isto acontece de 8 em 8 anos ou de 6 em 6. Mas são estas características que os
outros produtores deverão aproveitar para fazer produtos de qualidade e
certificados que noutras zonas do país não se conseguem fazer e aí estará
secalhar a aposta.
Joana Vargas
Joana Vargas
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