Houve por dias embargo de obras, foram descobertos alguns objectos de cerâmica e indícios de que ali funcionou um forno.
Mas as obras recomeçaram. O presidente da Câmara concedera que elas parassem, para ser recolhido tudo o que fosse possível. E difícil será dizer hoje da importância ou não importância, do que se especula ter sido uma povoação romana com peso na zona, no principio da era cristã.
Hospital e construção do Centro de Saúde |
Em termos de cultura, o concelho vive no ano zero, no abandono mais gelado, sem subsídios, sem incentivos, sem esperança.
A equipa de futebol, sobrevive em muito das receitas do loto; a banda filarmónica com 100 anos completados no passado Agosto ressurgiu das cinzas e do toque desafinado de há 10 anos, mercê de um grupo de jovens que ensaiam às noites no edifício que antes fora da Mocidade Portuguesa.
Na saúde há sete médicos residentes (seis dos quais de clínica geral) e sete enfermeiras. O concelho é farto em hipertensões arteriais. Mas os cuidados médicos, morto o serviço Médico à Periferia, regrediram muito no concelho nos últimos três anos. Melhor sem dúvida que há 10, sobretudo na abertura de postos clínicos nas aldeias, de cuidados preventivos. Mas a paisagem é cinzenta: médicos que faltam muito, segundo queixa generalizada das populações, ausência de especialistas e um hospital concelhio em parte transformado num lar da terceira idade, onde os velhos vão ocupar camas e esperar pela morte, em maior conforto e companhia do que em suas casas.
Uma década depois, o nível de vida das pessoas é diferente, há uma regressão na qualidade de vida nos últimos quatro anos, há um desencanto perante a incapacidade de as grandes questões do concelho serem resolvidas e, no correr da amargura, fica a palavra do velho à modorra do sol, como gato cansado, numa aldeia que em 10 anos quase ou nada mudou: Estevais, conquistada às fragas, isolada do vale da Vilariça por uma paisagem agreste e sem tempo, do velho, dos poucos habitantes no meio de uma manhã em Fevereiro, incapaz já de ir até à vinha próxima podar, enquanto as poucas mulheres lavavam no ribeiro, como há 10 anos, ficam as palavras do velho como sinais de que a sabedoria nem sempre é optimista e o passado reconhece que o futuro custa a sê-lo: A nossa terra é como a burra do João Vaz – não anda para a frente nem para trás.
Rogério Rodrigues
Texto retirado de uma reportagem publicada em 1984 no semanário "O Jornal":Terras de Moncorvo - O futuro não tem pressa.
Nota: a fotografia não fez parte da reportagem; pertence ao acervo do blogue.
A reportagem de onde foi retirado este texto também se encontra
ResponderEliminarIn TORRE DE MONCORVO Março de 1974 a 2009
De Fernando Assis Pacheco ,Leonel Brito, Rogério Rodrigues
Edição da Câmara Municipal de Torre de Moncorvo
A reportagem “Moncorvo : O futuro não tem pressa” ganhou o primeiro prémio da Associação 25 de Abril em 1984,10 anos depois do 25 de Abril.Saíu no Semanário “O Jornal” em 24/02/84.
ResponderEliminarA Associação 25 de Abril foi e é constituída pelos militares que fizeram o 25 de Abril.O seu presidente é o coronel Vasco Lourenço.
A saúde está doente. Pois está! Mas ao lermos este texto sentimos que muita coisa mudou. Como era Moncorvo ainda em 1984! Feiras/talho no Largo Claudino com se fosse um país subdesenvolvido de África ou Ásia. Falta de água etc...
ResponderEliminarÉ bom aparecerem estes textos no blog ,obriga-nos a meditar e a questionar as coisas de outra forma. Escrito com o rigor jornalístico que o autor nos habituou.
L.A.G.
O texto é uma fotografia a preto e branco de Moncorvo.
ResponderEliminar"A saúde está doente" por esse país fora...
ResponderEliminarUm grande abraço
Júlia
"por esse país fora..." e cá dentro.
ResponderEliminarA nossa terra é como a burra do João Vaz – não anda para a frente nem para trás.
ResponderEliminarARRE BURRA!