quinta-feira, 22 de março de 2012

A paz da minha Páscoa! ,por Tininha de Urros

Tocam os sinos na luz quente e doirada da minha aldeia, a demorar-se nas paredes velhinhas da minha rua , de pedras sobrepostas, de sonhos perdidos !
Um carro de bois, ali parado, à beira de um caminho, evoca o entusiasmo das sementeiras e a esperança de colheitas abundantes.
Tocam os sinos na luz doirada e suave da minha aldeia; homens e mulheres, silenciosamente, dirigem-se para a igreja, vestidos a preceito, e de acordo com os tempos, ainda que o preto seja a cor dominante, sinal de respeito, ou de obediência a velhas tradições.
Tocam os sinos na minha aldeia; pequenos magotes de gente, vão-se dispersando, devagarinho, enquanto o tempo lhes traz outras lembranças,
Antigamente…! era uma alegria! Sempre dois ou três pregadores! andavam assim vestidos, com aquelas batinas pretas, a arrastar pela igreja acima; havia confissões de manhã até à noite! era muito bonito! E os sermões…? Aquilo é que eram sermões, de fazer chorar a gente! até o coração se comovia! e os cânticos?.... Aqueles cânticos em latim! Era tão bonito! E havia cá uma mulher, oh! que voz ela tinha! Aquilo era o paraíso a juntar-se à terra! e aquelas procissões das velas, à noite!! Havia muita gente!
Tocam os sinos, na tarde calma! É a hora do enterro do Senhor!
Ai que dor, meu Deus, quanta emoção! ali mesmo à casa da tia Carolina, Nossa Senhora, recebe o seu amado Filho, e, em pano alvo de linho, ai Jesus, que dor! limpa as chagas de tanta dor,e com tanto Amor!
E lenços brancos da mais fina e pura cambraia, bordada em ponto matiz, de amor e ternura, pálida doçura, pétalas de flor, simples e singela, se espalham pelos montes, de verdes mantos vestidos em vermelho escuro, ensanguentado, na flor da esteva está gravado o sofrimento de Jesus!
Em redor, pelos campos vizinhos, a beleza da natureza, partilha este silêncio litúrgico; a alfazema, em amargas lágrimas vai derramando a sua dor e o roxo, pesado e triste , cobriu-as de grande luto e pesar!
Nos balcões das casas, e nos telhados vizinhos, a luz quente e suave vai-se derramando em ténues fios, cintilantes , insinuando-se nos vidros das janelas, para resgatar memórias de tempos distantes!
Tocam os sinos, na tarde calma!

TININHA, DE URROS.
Texto publicado em Abril de 2011

10 comentários:

  1. Abiliojosepereira Pereira :Era essa a paz das aldeias transmontanas. Que esta nova civilização conrompeu

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  2. Olá, Tininha:

    Mais um texto cheio de sensibilidade e ternura. Também na sua aldeia se contava o conto da flor da esteva? Contado pela minha avó, era uma pequena maravilha: o porquê de umas flores terem 5 pintas da cor do sangue pisado e outras flores continuarem branquinhas, sem pinta nenhuma.
    As nossas avós eram fantásticas !
    Eu, agora avó, conto o mesmo conto aos meus netos e, às vezes, a outras crianças.

    Um beijinho
    Júlia

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  3. E sabe tão bem, contar os contos que nos fizeram tão felizes!
    Para a Júlia, um grande beijinho
    Tininha

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  4. A ternura ,o amor pela sua aldeia espelhados em mais um texto da nossa Tininha.

    Uma moncorvense

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  5. Vim reler e deixar um bj. à Tininha.

    Júlia

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  6. Olá meus amigos!
    Obrigada pela vossa atenção, pelos vossos comentários, pelos quais eu sinto tanto apreço; pela oportunidade de postar, de novo, o meu texto.
    Igualmente, para vós, o meu carinho e a minha amizade.
    Um beijinho,
    Tininha

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  7. Olá Tininha!

    Já tinha lido e comentado este teu lindo texto.Recordo bem esses tempos da Páscoa na nossa aldeia.Eu pequenita a ouvir e a derramar lágrimas que caíam no lençinho de bonecos de mão dada com a minha falecida mãe.
    Tempos que passaram ,tempos que não voltam e marcaram para sempre a minha infância feliz.
    Com um beijo de amizade da tua amiga:
    Ireninha

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  8. Olá Tininha.
    Mais uma oferta literária doce dirigida aos leitores do blogue, nesta quadra de Páscoa para recordar as doçarias tradicionais do nosso concelho, respeitando a tradição.
    O teu texto direcionado noutro sentido dá atenção a uma quadra que se repete ano após ano, como um marco histórico triste.
    A tua sensibilidade e ternura permite que a tua escrita, nos leve a uma leitura cheia de humanismo que transmite Paz ao espirito e liberta o pensamento.
    A esta quadra triste de dor e de lágrimas, a tua inteligência e imaginação permitiu aos teus sentidos realçar a beleza que a natureza nos oferece nesta época, as suas tradições e vivencias sociais.
    Uma boa páscoa para ti e todos os blogueiros dos Farrapos.
    Manuel Sengo

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  9. Olá meus amigos!
    Obrigada pela vossa simpatia e pela vossa amizade.
    É verdade, a Páscoa é esse momento muito especial que a nenhum de nós deixava indiferente.A Ireninha deteve-se na emoção que ela passava para o lencinho, ao lado da mãe.E logo aqui nós lembramos também outros quadros semelhantes. Mas a Páscoa é um tempo muito especial que se sente na natureza, sobretudo.Sabes, Manuel, é uma mudança que se sente; e na nossa aldeia a festa da Páscoa era muito marcante.Eu tenho recordações muito gratificantes desse tempo, de PÁSCOA!
    Boa Páscoa para todos.
    Com muita amizade,
    Tininha

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  10. Olá Ireninha!
    Lembras-te, com certeza, da Páscoa na nossa aldeia: das ruas enfeitadas, da festa, das cerimónias religiosas. Que tal um texto sobre isso?
    Beijinhos, boa Páscoa para todos.
    Tininha

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