QUINTA DA LARANJEIRA |
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Espero que te sintas bem na “Quinta da Laranjeira”, depois começas a
conhecer todo o pessoal, tens muito com quem conversar. O Ti Alberto e a mulher
são os caseiros, são boas pessoas, assim como os pastores e os criados. São
conversadores e, quando os conheceres melhor, verás que me darás razão. O
empregado mais velho, que está na
Quinta, é o “Ti Nunes.” Já vai em dez anos que está cá, podes perguntar-lhe se
está contente connosco. O serviço dele
é só andar a acarretar a água para o gasto de casa. Nós só gastamos água
do Rio Sabor, os nascentes no Verão secam. Não é preciso dizer-lhe o que tem a
fazer, nem ninguém o manda, é muito diligente. Sei, também, que estiveste em
Lisboa a aprender a serralheiro, se tu quiseres, podes ajudar o ferreiro a
reparar as ferramentas e apetrechos da
lavoura. Vou mandar chamar o “Ti Nunes”, para tu o conheceres.
Passado
pouco tempo, um homem dos seus cinquenta e tais anos, que na Quinta era tratado pelo velho Nunes,
apareceu à porta e disse:
IN AS MARCAS DO DESTINO de Júlio Augusto Alves
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O senhor Carvalho mandou-me chamar?
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Entre, Ti Nunes.... é este o
rapaz de que lhe falei há dias!.. agora vai ficar cá, na Quinta, para o ajudar nos
serviços que vocemecê precisar. Quero que lhe vá ensinando como há-de ir à água
ao Rio Sabor. Ensine-lhe onde é a fonte e de futuro é ele que vai buscar o
leite ao bardo, levar a comida aos criados e segadores.
Depois
destas recomendações, foi comigo dar uma volta pela Quinta para a conhecer,
conversando sobre diversos assuntos. Aparecendo a sobrinha do Ti Redondo, senhora Teresa, que
tinha ido dar algumas ordens aos criados, e dando as boas tardes,
acompanhou-nos no passeio pela Quinta. Era uma mulher alta e forte,
aproximadamente dos seus quarenta e dois anos. Verifiquei que todo o pessoal da
Quinta lhe tinha respeito, sendo ela que praticamente dirigia todas as tarefas,
no que dizia respeito ao amanho das terras e do gado da Quinta.
Com o
decorrer do tempo, fui-me familiarizando com todo o pessoal, conhecendo os
criados e criadas assim como todas
as pessoas, das aldeias próximas, que
andavam à jeira na Quinta. Umas vezes ajudava o “Ti Nunes” a acarretar água
para os gastos de casa, outras, ia buscar o leite ao bardo, local onde as
ovelhas dormiam nas terras para estrumar, levando a comida aos criados na
arada, aos segadores e muitas vezes guardava as vacas, quando andavam a pastar,
junto ao rio. Outras vezes ajudava o ferreiro a consertar as ferramentas da
lavoura. Aos domingos acompanhava o senhor Carvalho à vila, permanecendo na
vila, até segunda-feira. Era quando eu ia visitar os meus primos, a família do
“TI Redondo” , e ia ao cinema.
Ia
vivendo no meio de pessoas humildes e rudes, educadas e respeitadoras, mais parecendo uma família
do que pessoas estranhas. O meu melhor amigo era o “velho Nunes”, como era
chamado por todos, estava sempre a dar-me bons ensinamentos e bons conselhos,
para qualquer local que nós íamos estava sempre a recomendar-me:
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Júlio...tu ainda és muito novo, não te prendas nesta vida do campo, não
há dúvida que é uma vida saudável, mas não te dá futuro nenhum. Eu bem tenho
visto que tu não és tolo, tens possibilidades de arranjar outra coisa melhor.
Quando vais com o senhor Carvalho à vila, trazes sempre o jornal para leres,
tenho reparado que vais ler para debaixo dos eucaliptos e isso é um sinal de
quem quer mais alguma coisa. Disseste-me, aqui há dias, que tinhas estado em
Lisboa, com uma tua irmã, e que devido a tu teres errado vieste embora, mas eu
tenho reparado que a tua educação é diferente destas gentes e como tal dava-te
o conselho de lhe escreveres e pedires desculpa por tudo o que fizeste, pode
ser que te perdoem e voltes para lá.
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Eu gosto muito desta vida.... Ti Nunes, embora seja uma vida rude e
cheia de sacrifícios, sou muito novo, gosto da vida do campo e de ser
independente. Tenho irmãos em Lisboa, mas devido aos meus erros e garotices,
como já lhe contei, têm razão em não me aceitarem em casa deles. Eu bem sei,
que quando somos novos não pensamos o mal que fazemos, mas depois, mais tarde, é que vem o arrependimento, torcemos a orelha mas já não deita sangue.
Maria Fernanda Fernandes escreveu:Nesta Quinta faziamos pic-nics de verão com autorização do Sr.Luis de Carvalho,bem comidos e bem regados e no fim uma boa banhoca no rio Sabor...!!!
ResponderEliminarBonita estória. A senhora Teresa (Teresa Catalão) prima de minha mãe, também Catalão, da corredoura, e naturalmente minha prima também. No início dos anos sessenta a quinta da laranjeira ainda era de referência, em queijo e requeijões, azeite e amêndoa e um bom local de pesca. Ali se cultivava um pouco de tudo. Milho, trigo, centeio e cevada, pardas (lentilhas), feijão pequeno, batata, feijão branco e feijão de vaca e todo o tipo de produtos hortícolas daquela época. A vinha era pequena comparada com o que é hoje. Fui até lá a pé algumas vezes entre os 6 e os 10 anos. Agora ficará alagada quando encher a barragem de juzante assim como o fragão e o alcaide e por ali descansarão submersos "farrapos" da minha infância e juventude os da "memória" ficarão comigo. Tempos de mudança.
ResponderEliminarhá alguém da família do sr. Luís Carvalho que possa encontrar?
ResponderEliminarA Quinta das Laranjeiras foi vendida após a morte do sr. Luís Carvalho, certo?
Sou família desse senhor, e gostaria muito de encontrar alguém dessa parte da família, de quem se perdeu todo o contacto.