sexta-feira, 13 de março de 2015

TORRE DE MONCORVO - MAÇORES (São Martinho)

Textos das nossas tradições
Para quem não sabe, em Maçores celebra-se o S. Martinho, que é o Orago da freguesia. Esta festa, que se realiza a 11 de Novembro, tem uma das tradições mais simpáticas deste país, pois não conheço lugar algum, onde o convívio seja tão manifestado.
Esta tradição assenta no seguinte:
- O GAITEIRO -
O gaiteiro, é uma pessoa que toca gaita de foles. Então, na manhã do dia 11 de Novembro, está à entrada da aldeia, um grupo de homens que aguarda a sua chegada e a anúncia com fogo de artificio, afim de transmitir à restante população.
Após a recepção e familiarizado o gaiteiro, vão-lhe ser ensinadas as cantigas da aldeia. Caso o gaiteiro já cá estivesse em anos anteriores, pois esta lição nada mais é mais do que uma recapitulação, onde numa simples volta a recordará. Mas o pior, é quando o gaiteiro é novo, que nunca ouviu as musicas da terra. Este mais esforço e empenho requer para aprender. Então os homens presentes, cantam as cantigas do S. Martinho para afinar e levar ao compasso desejado o artista.


Texto e cartaz enviados pelo Filipe Camelo.

(Reedição de posts desde o início do blogue)

20 comentários:

  1. O CORO -
    O coro, assim por mim designado, é um grupo de homens,expontâneo, não constituido anteriormente, normalmente homens de Maçores, que sabem, as musicas da festa e que ao som da gaita de foles, entoam os hinos locais, em vozes graves, em compasso lento, arrastado e em muitas vezes, descoordenado.
    O coro, acompanha quase sempre o gaiteiro, sendo excepção a procissão, e a caldeira pelas ruas da freguesia. Neste coro, não existe um minimo nem máximo de elementos, participando nele, todos quantos queiram acompanhar a caldeira e o gaiteiro.
    -A CALDEIRA-
    A caldeira é um recepiente metálico, de forma cilindrica estanque e construído de material zincado. Tem uma asa ou alça metálica, fixa e arredondada. É usada frequentemente, nos meios rurais com o objectivo de cozer os alimentos (nabiças, nabos, batatas,) para o gado muar e asinino.
    Em Maçores, a caldeira vai ser um objecto fundamental nas festas de S. Martinho, porque nela é que irá ser depositado esse liquido que neste dia se prova, como diz o velho ditado: " No dia de S. Martinho, vai à adega e prova o vinho."
    - O ENCHER E O BEBER DA CALDEIRA-
    Como já se referiu, a caldeira vai ser o contentor do vinho. Então, dois homens, com a ajuda de um pau ou vara, segurando cada um nas estrimidades, vão colocar a vara de madeira, pelo interior da alça e transporta-la pelas artérias da aldeia, enquanto que seguem á sua rectaguarda, o coro de homens e o gaiteiro.
    Pronta então esta formação, dá-se inicio ao enchimento da caldeira. Assim, este grupo, desloca-se pela aldeia fora, com a finalidade de encher a caldeira nas adegas dos produtores de vinho locais, que pouco a pouco, a vão atestando. Sempre nestas deslocações, a caldeira é acompanhada pelo coro e pelo gaiteiro.
    Engraçada é, a forma de como se deve beber, segundo a tradição, pela caldeira. Então, a caldeira é colocada no solo. O que nela for beber, terá de colocar os joelhos no chão e inclinar-se sobre ela, introduzindo no interior do aro superior a cabeça e no cimo do vinho os lábios e pelo método da sucção, aspira o liquido. Desta forma, e como se diz por cá, "beba, que não beba, mergulhar, vai ter que mergulhar".Quer isto dizer, que pelo menos, tem que por os lábios no vinho.

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  2. - O MAGUSTO-
    O magusto realiza-se depois da eucaristia e da procissão. As pessoas que querem participar reunem-se, normalmente no Lugar da Eiras, por ser um espaço tranquilo, óptimo para este tipo de convívio. Então são trazidas as castanhas e a palha que servirá para as assar. Esta última é espalhada no chão e as castanhas espalhadas sobre a palha. Incendeia-se e começa-se o assar das castanhas.
    Logo que as primeiras castanhas estejam assadas, os participantes, aproximam-se do extinta fogueira e retiram-nas, consumindo-as em livre associação e feliz convivio entre todos até que se acabem as castanhas, fazendo, portanto, mais fogeiras. Durante o magusto, está presente a caldeira e o gaiteiro. A caldeira, desta vez, está colocada no chão, disponivel para qualquer pessoa que queira beber. O gaiteiro, toca as musicas que conhece, tendo que, mais frequentemente, tocar as musicas do S. Martinho, acompanhadas pelos homens que formam o coro.
    Assim que haja cinzas resultantes da queima da palha, as pessoas, sujam propositadamente as mãos, de modo a ficarem negras, para depois, as irem a esfregar nas caras das pessoas que estão presentes. Ora, com isto, levamos a um convivio, onde todas as pessoas estão de igual, com as caras sujas do carvão, levando-as a designar por já terem a cara "enfarruscada" ou "enfurretada".
    Por fim e para aquelas pessoas que não puderam estar presentes no magusto, assam-se castanhas, que depois são introduzidas em sacos e os homens transportam-os ao ombro, pelas ruas de Maçores e que vão distribuindo e dividindo pelas pessoas que se abeirarem. Recordo, mesmo nesta distribuição, a caldeira e o gaiteiro estão presentes, podendo desta maneira, as pessoas que não fossem ao magusto, ver a caldeira e ouvir as nossas melodias ao som da gaita de foles e do coro masculino.

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  3. Cancioneiro Maçorano

    Era o Vinho
    I
    Era o vinho, meu Deus era o vinho
    era a coisa que eu mais adorava
    (bis)
    Só por morte meu Deus só por morte
    Só por morte o vinho deixava
    (bis)II
    Ai eu hei-de morrer numa adega
    Ai que o tonel seja o caixão
    (bis)
    O vinho seja a murtalha
    Hei-de morrer com um copo na mão
    (bis)
    III
    Ai minha sogra morreu ontem
    Ai o diabo vá com ela
    (bis)
    Ai deixou-me as chaves da adega
    Mas o vinho, bebeu-o ela.
    (bis)
    Manuel DuarteI
    Ai adeus ó Manuel Duarte
    Ai amigo e companheiro
    (bis)
    Ai "alevanta-te" e vem comigo
    Ai lá p´ró Rio de Janeiro
    (bi
    Refrão
    Manuel Duarte, foi p´ró Brasil
    Chegou ao Porto e tornou a vir
    Manuel Duarte, não embarcou
    Foi o ingaije que o ingaijou
    II
    Ai adeus Manuel Duarte
    Ai amigo e camarada
    (bis)

    Ai "alevanta-te" e vem comigo
    vamos os dois seguir esta jornada
    (bis)
    Refrão
    III
    Ai cinco folhas tem o vime
    Ai cinco amores tenho eu
    (bis)
    Ai quem gosta de mim são elas
    Ai quem gosta delas, sou eu
    (bis)
    Refrão
    Videos em: www.youtube.com/filipemacores

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  4. Maria escreveu:
    "Aqui temos o Programa do S. Martinho de Maçores...Fica aqui a sugestão para quem nunca participou... as gentes de maçores estão de parabens por manterem VIVA esta tradição....."

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  5. Ah, grandes Maçoranos !

    Um abração,
    Júlia

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  6. bou beber binho cuns gajos porreiros nu samartinho de maçores metu o fucinho nu caldeiro inté intrar pos os obidos ospois bilhós e bagaso pa acaleitar e matar u bitcho,catantcho u caminho pa lá bai pos tchqueiros e berra po gaiteiro da gaita grande bais ber como adiantas caminho...

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  7. Vou aqui relatar, uma história que me foi contada à já bastante tempo.Antes da estrada que liga Maçores à Açoreira estar pavimentada, o acesso à Vila de Moncorvo, fazia-se por Felgueiras.Assim, o transito motorizado que se fazia tinha que atravessar esta última freguesia.
    Numa festa qualquer do S. Martinho, a comissão de festas, tinha ido a buscar o gaiteiro. Então, parece que seria hábito o gaiteiro, no dia que viesse e no dia que fosse embora, atravessar a aldeia de Felgueiras a tocar a gaita de foles, mas sempre acompanhado, pelos mordomos da festa. Os de Felgueiras, ao verem o gaiteiro, faziam ali uma festa dos diabos.
    Numa dessas vezes que o gaiteiro lá tocou, chegou-se um rapazote ao pé dele e com a pronúncia típica de Felgueiras, que nós bem conhecemos, disse-lhe:
    "- Oh senhor da gaita grande, venha ali a minha casa, dar uma gaitada à minha mãe, que desde que morreu o meu pai, nunca mais viu a gaita grande!!"
    Respondeu-lhe o gaiteiro:
    "- Se calhar a tua mãe não gosta da gaita grande!!"
    "- Gosta, gosta. Olhe que ela não fala noutra coisa." respondeu o rapaz.

    Recorda-me ainda, num ano, fomos a levar, no taxi, o gaiteiro (cigano) e o acordeonista (cego) a Carrazeda de Anciães. Então, em Felgueiras, juntou-se o povo, ao pé da casa do ti Fachico, e cantaram, bailaram e chegaram mesmo a recolher dinheiro, num chapéu, para dar ao gaiteiro.
    (Filipe Camelo)

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  8. http://www.youtube.com/watch?v=cVV2ut8Hw5k
    (este tema, encontrava-se quase perdido. Valeu o meu interesse em o tornar de novo a ser entoado em Maçores)

    Maçores, encontra-se recentemente já mais próxima da sede de concelho, pela via terrestre. Mas, nem sempre foi assim. A única forma de ir a Maçores à uns anos atrás(em estrada alcatroada), que a mim bem me lembra, era então, ir em direcção ao Carvalhal, virar à direita e subir a estrada da Serra do Reboredo, atravessar a localidade de Felgueiras e mais outra serra, e chegariamos a Maçores. Ao todo, poderiamos contar que este trajecto, teria se não, mais de 18 kms, e ainda, numa estrada toda esburacada e estreita.
    Actualmente, a dúzia de kms, a estrada da Açoreira, facilita-nos a vida ... é como se diz... sabe que nem ginjas. Prontos, dito isto, continuo.
    Nós de Maçores, nos dias anteriores à nossa festa, lá nos preparávamos para ir buscar o gaiteiro, que é uma das figuras principais da nossa festividade. Porém, os gaiteiros mais afamados e da minha época, era o cigano de Carrazeda de Ansiães, que trazia o acordeonista (um senhor que era cego, mas que tocava acordeão ... xiça, o raio do instrumento até gemia, enfim), ou outros, lá para os lados de Mogadouro e Miranda do Douro.
    Azar... lá teríamos de subir a serra, no velho Peugeot 504, pintado no tejadilho, com aquela cor verde garrafa de vinho tinto, que me faz recordar a Adega de S. João da Pesqueira, para ir buscar o Gaiteiro.
    Num desse anos, lá me calhou a mim, ir a acompanhar o motorista, à Vila de Carrazeda, para trazer o gaiteiro lá para a festa. A viagem lá se fez, de forma tranquila. Chegados a Felgueiras, e aqui sim... é que a nossa história começa realmente, fazia parte da tradição, todos os anos à chegada e à partida da Festa de Maçores, o gaiteiro, teria de atravessar a aldeia de Felgueiras a tocar a gaita lá para os "txoqueiros", nome este, pelo qual, são conhecidos os dessa aldeia. Pior, pior... é que eles ainda se "agabavam" (mirandês), de que tinham o gaiteiro antes da festa do S. Martinho e mais ainda, era de borla, coisa que os naturais dessa aldeia gostam, que é serem forretas (olhai que não gastam um centimo, são poupadinhos que sei lá) - continuando - Um desses anos em que o gaiteiro atravessou Felgueiras, houve um garoto que se aproximou do instrumentista e que lhe o seguinte pedido e, claro, da forma falada, com a tipica pronuncia dos Felgueirenses:
    - Oh senhor da gaita grande, venha lá a nossa casa, a dar uma gaitada à minha mãe, porque desde que morreu o meu pai, ela nunca mais viu a gaita grande...
    Respondia o gaiteiro: Se calhar a tua mãe não gosta da gaita grande!!!
    Entusiasmado, respondia fervorosamente o rapaz:Gosta, gosta, olhe que ela passa a vida a falar na gaita grande!!!!
    Moral:
    Ao que parece, o garoto lá teria a mãe acamada e não poderia ir à rua principal a observar o gaiteiro, que por sinal, ela gostaria muito de o ver, motivo então, de o miudo agitar toda aquela comitiva.

    Este ano e noutros anteriores, os gaiteiros vêm a ter a Maçores, nos próprios carros. Como já não sabem destas tradições, nem tão pouco param em Felgueiras.
    Como sempre, amigo que sou da farra, este ano ainda me propus a ir com os mais velhos, a atravessar a aldeia de Felgueiras a tocar a gaita... mas depois disseram-me eles: Deixa-os lá, ao menos não se ficam "agabar" (mirandês, de novo) de que sem o gaiteiro ir a Felgueiras, não seria festa, não seria nada. Concordei e em tom de galhofa, peguei na gaita e virei-me para Felgueiras e dei-lhes uma gaitada, na esperança que conseguisse lá de Maçores, alcançar Felgueiras, com a minha gaita grande.

    Maçores, yé la mie tiêrra....
    A. Filipe - O gaiteiro da Fraga da Masseira (Maçores).

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  9. Como nasceu, o primeiro gaiteiro de Maçores

    Sendin, Janeiro de 2009:

    Colocado a exercer funções no planalto mirandês, havia já dois anos, os meus dias eram passados sempre da mesma maneira, ou seja, de segunda a sexta-feira, depois do jantar, lá nos encontrávamos os 4 amigos da onça, prontos para jogar uma suecada, para ver quem pagava a rodada, umas lérias aqui e além, umas arrenúncias, tudo envolto no ambiente pesado do fumo, pesado e incómodo e causador do catarro... enfim.
    Deram-se as transferências, daqueles que estavam a trabalhar comigo e, com eles, foi-se embora o convívio da sueca, e se calhar também, o baralho das cartas mas mais certamente, o fumo do tabaco.
    As noites de inverno passaram a ser então, mais frias, mais sós e tristes.
    Numa das minhas frequentes idas à famosa aldeia de Palaçoulo, fui abordado pela juventude da farra, dos copos e das tainadas, que me convidaram para pertencer à Associação Lérias, para iniciar aulas de gaita-de-foles.
    Depois de uns sorrisos de gozo que deixei cair das minhas feições de rosto, parei dois segundos para pensar e disse cá para comigo: “xiça e porque não? Catancho, então se os outros tocam na gaita, porque é que eu não hei-de ir também aprender... ?” - Acedi ao convite. Não haveria eu de ter qualquer dificuldade, pois tocador que sou doutras gaitas (acordeão, não fosse o caro leitor julgar-me, como que se eu fosse um tresloucado), lá me apresentei eu de capa e espada, numa das noites seguintes, pronto para a minha primeira aula de gaita de foles. Dois dedos de conversa e entregaram-me para praticar, uma flauta de bisel, tal e qual, uma que tive quando andava lá no ciclo velho em Moncorvo, porém esta, tinha a furação das típicas gaitas mirandesas. Lá me ensinaram três músicas logo naquela noite, que as toquei muito facilmente, na flauta, claro. De ímpeto e da sala ao lado, trouxeram-me uma das gaitas de foles, onde um outro grupo de alunos, já mais adiantados do que eu, se alargavam em toques, melodias e músicas mirandesas. De uma forma cuidada, trouxeram-me aquele instrumento que apenas conhecia, de quando via o gaiteiro, lá em Maçores, na nossa festa, onde o maior desafio que havia sempre nessa altura, era conseguir por a gaita a tocar, que verdade se diga, ela tocar, tocava, mas a continuidade musical, é que não existia. Prosseguindo, então eu assim que vi o instrumento a vir na minha direcção e, ao ser-me entregue com toda aquela confiança, com todo aquele à vontade, eu confesso, que mais parecia que estava a receber um bébé ao colo. Desembrulhando-a, peguei no ronco e coloquei de imediato sobre o meu ombro esquerdo e ao mesmo tempo, olhei de soslaio, a ver se eu ficava bem naquela figura, que eu começara então a dar os meu primeiros passos. Ajeitei o fole, colocando debaixo da cova do mesmo membro superior, apontei o soprete na direcção da boca e com os lábios, abracei-o e comecei a encher o saco, ao mesmo tempo, que segurava na ponteira, tal como me fora explicado. Ao fim de quatro ou cinco "afuladelas" e com o fole meio cheio, ouviu-se logo, o som pesado, grosso, grave e contínuo, do ronco. Mais duas “afuladelas” foram quanto bastou para ouvir a ponteira a tocar. Segurando-a logo e posicionando os dedos, um em cada buraco, e claro, a mão esquerda na parte superior dessa peça e a mão direita, na parte inferior, encerrei assim, todos os buracos que, cada um, corresponderia a cada nota. O fole cheio e a gaita a tocar.

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  10. Setembro 2009

    Como renasce a paixão da Gaita-de-foles

    Maçores, Setembro de 2009. O meu tio lá da França, tinha vindo a Portugal de férias e claro, “comme d´habitude les vacances” fazem-se por ocasião das vindimas, da apanha da amêndoa e da Festa de Felgueiras.
    Então, quando soube que o meu tinha chegado de férias, fui lá a casa a visitá-lo. Entre abraços e cumprimentos, notícias dos filhos e dos netos, partilha de novidades de cá e de lá, o meu tio torna-me a contar um episódio já antigo que ele teve na sua vida.
    Amicíssimo que é, de um emigrante lá das “tîerras de Malhadas, en Miranda de l Douro”, um certo dia, o meu tio pediu a esse tal amigo, que lhe levasse uma gaita de foles, típica daquelas terras, para a França, com a finalidade, de o meu tio ser o gaiteiro de Paris, visto que os emigrantes de Maçores, reúnem-se todos em casa dele, para festejar o S. Martinho. É verdade que têm lá quase de tudo, a faltar apenas, o gaiteiro. Julgou então o meu tio conseguir ocupar o lugar em falta e, mandou que fosse então adquirido e entregue o dito instrumento lá para ele tocar, nas ramboiadas Maçoranas.
    Desta vez, o meu tio pediu-me para levar a gaita ao construtor, ao artesão daquela mesma gaita, para a afinar e ajeitar, porque, dizia o meu tio, que teria dado cabo daquele monte de paus e pano.
    Ao ver o instrumento, embrulhei-o entre o fole, aconcheguei o soprete, o ronco e a ponteira e coloquei tudo no carro, em cima do banco traseiro.

    Barrocal do Douro – Picote
    Em casa do Sr. Ângelo Arribas, já meu amigo de à uns anos largos, gaiteiro que chegou a ser em Maçores, e isto já lá vão uns anos porreiros também, então, assim que viu lá a sua criação artesanal, reconheceu-a e questionou-me, intrigado evidentemente, acerca do propósito da minha visita e ainda para mais, com uma das suas gaitas.
    Lá lhe expliquei, que aquela gaita, tinha mais de 15 anos, novidade esta, que não assustou o artesão, pois quem melhor do que ele para avaliar a idade do objecto, do que o criador dele… que é mesmo assim.
    Entreguei-lha e ele, abrindo-a, constatou à primeira vista que a gaita deveria de estar boa de fole e madeira. Levou-a para dentro do seu espaço de trabalho, uma casa, toda ela dedicada ao seu ofício de construção de instrumentos de origem mirandesa. Nas paredes, estavam expostas gaitas de foles de todo o feitio e cor. Elaboradas com as madeiras locais mais comuns, como freixo, até a madeiras nacionais e raras, como o bucho, a outras de madeira estrangeira. Havia ainda, flautas pastoris, bombos e caixas de guerra, tudo à vista umas prontas, outras em construção.
    O “Tiu Ângelo”, separando a ponteira do fole, retirou a palheta e “mirando-a” de contra a janela da divisão, por onde entrava o sol daquela tarde de verão, analisou a pequena peça e disse-me que tinha achado o mal da gaita.
    Cirurgicamente, aquele homem, aquele artesão, descobriu na verdade, o mal daquela gaita. Abriu uma pequena caixa metálica de cigarrilhas espanholas e retirou do interior, uma palheta, afinada num Dó Maior e colocou-a no correspondente espaço, ou seja, num pequeno buraquinho, onde nele encaixa uma ponta da palheta e por onde o ar passa, antes de entrar na ponteira.
    Voltou a montar o objecto e preparou-se para dar ali uma gaitada. Ronco ao ombro, fole debaixo do braço, cotovelo esquerdo dobrado, soprete nos queixos, umas “afuladelas”, tocou o ronco e a ponteira… maravilhoso… a gaita já tocava. Sabe-se lá, já ao tempo que a gaita estaria parada e, veio o sapiente construtor e deu-lhe ali o jeito que faltava

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  11. Preparou-se para tocar, tapando os buracos todos, entoou uma “alvorada” (melodia e toque daquelas terras). À pressa, tive tempo de sacar a máquina do bolso e registar as imagens … espectáculo. O homem, apertou com a gaita, matou saudades do instrumento que fizera e depois parou. Deixou-se de ouvir o ronco e a ponteira naquela divisão da oficina, que ensurdeceria qualquer um.
    Disse-me ele: Olhe, sabe, vá dizer uma coisa ao seu tio e, diga-lhe que fui eu, que mandei, que ele faça o seguinte: “la gaita, la mulher e carro, tîenen q´andar sîmpre bîen afinados”. Percebendo a mensagem, agradeci e vim embora, com o instrumento já ajeitadinho.

    Chegado a Maçores, fui direitinho a nossa casa, ao fundo da aldeia. Tirei a gaita do carro e fui-me para dentro a experimentar a gaita, para ver se não me teria esquecido das lições de inverno.
    Mais uma vez, ronco ao ombro, fole debaixo do braço, soprete na boca, ponteira na mão, encho o fole e começo a tocar as melodias aprendidas em Janeiro. Não satisfeito, já que não me faltava o vagar, decidi “ampeçar” a tocar as musicas de Maçores, tais como “Era o Vinho” e “ Manuel Duarte”, melodias que saíram assim, num instante e tal como manda a tradição.
    Após ver que de facto estava ainda nos eixos, fui lá a casa do meu tio a proceder à entrega do instrumento. Encontrei-o então junto ao portão de casa. Depois de o cumprimentar, disse-lhe que já ali trazia a encomenda afinadinha e pronta a tocar. Transmiti-lhe fielmente, o recado que me mandara o artesão e uma gargalhada nossa, pastou e alimentou o período de tempo, em que retirei a gaita e lha passei para a mão. O meu tio, ciente que estava do meu passado com a minha aprendizagem de gaitas mirandesas, pediu-me que ali mesmo na rua, desse uma gaitada. Mais uma vez, executei os procedimentos de início de actuação e fiz soar na rua larga da FontaPereira, o característico som da gaita.
    “Oh Aida, oh minha filha”, constitui uma das músicas, que se consideram desde à muito tempo esquecidas em Maçores. Ameaçada e esquecida, por não haver quem ensinasse os gaiteiros novos que vinham vindo, associado ao facto de os velhos se irem esquecendo também. Felizmente, considero-me ainda um arquivo vivo, dessa música. Buraquinhos da gaita encerrados e começo a tocar essa musica na rua. Bem… o resultado foi que as pessoas que ouviram, vieram todas à rua para ouvir o gaiteiro. O gaiteiro que tocou a melodia mais esquecida do reportório local e que, com isso, os fez recordar de como é bom ouvir o gaiteiro.
    “Ai Adeus, oh Manuel Duarte!”, foi a música que se seguiu e serviu para mostrar que gaiteiro, já temos em Maçores. O Camarada Comunista de Maçores, no seu passo lento, descia a Rua onde estava o gaiteiro a tocar e onde, junto aos portões das vivendas, estavam as famílias curiosas, então ele, no seu tom de fala arrastada, semelhante a uma cana rachada, disse:”- Venha o S. Martinho, que já temos Gaiteiro, carvalho”.
    Actualmente, deve andar uma gaita de foles e um Maçorano, a tocar lá para as terras dos ” Champs Elysées”.

    No dia seguinte, telefonei logo ao meu amigo de oficio e grande artesão, se não o maior e mais bem conceituado, Célio Pires, “fazedor” de gaitas de foles mirandesas, e mais, o diabo a quatro, acho que não deve haver nada que o Célio não faça, e, ao telefone, disse-lhe para que me construísse a minha gaita de foles.
    “- Célio, quero que me faças a minha gaita-de-foles, e que seja assim: Madeira de bucho (por ser uma madeira transmontana muito rara, é de cor amarelada, como o ouro e como o sol, afinada em Si Bemol, tal como é afinada a típica gaita mirandesa), e que seja

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  12. Maçores, encontra-se recentemente já mais próxima da sede de concelho, pela via terrestre. Mas, nem sempre foi assim. A única forma de ir a Maçores à uns anos atrás (em estrada alcatroada), que a mim bem me lembra, era então, ir em direcção ao Carvalhal, virar à direita e subir a estrada da Serra do Reboredo, atravessar a localidade de Felgueiras e mais outra serra, e chegariamos a Maçores. Ao todo, podaríamos contar que este trajecto, teria se não, mais de 18 kms, e ainda, numa estrada toda esburacada e estreita.
    Actualmente, a dúzia de kms, a estrada da Açoreira, facilita-nos a vida... é como se diz... sabe que nem ginjas. Prontos, dito isto, continuo.

    Nós de Maçores, nos dias anteriores à nossa festa, lá nos preparávamos para ir buscar o gaiteiro, que é uma das figuras principais da nossa festividade. Porém, os gaiteiros mais afamados e da minha época, era o cigano de Carrazeda de Ansiães, que trazia o acordeonista (um senhor que era cego, mas que tocava acordeão... xiça, o raio do instrumento até gemia, enfim), ou outros, lá para os lados de Mogadouro e Miranda do Douro.

    Azar... lá teríamos de subir a serra, no velho Peugeot 504, pintado no tejadilho, com aquela cor verde-garrafa de vinho tinto, que me faz recordar a Adega de S. João da Pesqueira, para ir buscar o Gaiteiro.

    Num desse anos, lá me calhou a mim, ir a acompanhar o motorista, meu pai, à Vila de Carrazeda, para trazer o gaiteiro lá para a festa. A viagem lá se fez, de forma tranquila. Chegados a Felgueiras, e aqui sim... é que a nossa história começa realmente, fazia parte da tradição, todos os anos à chegada e à partida da Festa de Maçores, o gaiteiro, teria de atravessar a aldeia de Felgueiras a tocar a gaita lá para os "txoqueiros", nome este, pelo qual, são conhecidos os dessa aldeia. Pior, pior... é que eles ainda se "agabavam" (mirandês), de que tinham o gaiteiro antes da festa do S. Martinho e mais ainda, era de borla, coisa que os naturais dessa aldeia gostam, que é serem forretas (olhai que não gastam um cêntimo, são poupadinhos que sei lá) - continuando – Reza a história, que num desses anos em que o gaiteiro atravessou Felgueiras, houve um garoto que se aproximou do instrumentista e que lhe o seguinte pedido e, claro, da forma falada, com a típica pronuncia dos Felgueirenses:

    - Oh senhor da gaita grande, venha lá a nossa casa, a dar uma gaitada à minha mãe, porque desde que morreu o meu pai, ela nunca mais viu a gaita grande...
    Respondia o gaiteiro: Se calhar a tua mãe não gosta da gaita grande!!!
    Entusiasmado, respondia fervorosamente o rapaz:Gosta, gosta, olhe que ela desde que morreu o meu pai, nunca mais viu a gaita grande!!!!


    Moral:
    Ao que parece, o garoto lá teria a mãe acamada e não poderia ir à rua principal a observar o gaiteiro, que por sinal, ela gostaria muito de o ver, motivo então, de o miúdo agitar toda aquela comitiva.

    Este ano e noutros anteriores, os gaiteiros vêm a ter a Maçores, nos próprios carros. Como já não sabem destas tradições, nem tão pouco param em Felgueiras.
    Como sempre, amigo que sou da farra, este ano (de 2009), ainda me propus a ir com os mais velhos, a atravessar a aldeia de Felgueiras a tocar a gaita... mas depois disseram-me eles: Deixa-os lá, ao menos não se ficam "agabar" (mirandês, de novo) de que sem o gaiteiro ir a Felgueiras, não seria festa, não seria nada. Concordei e em tom de galhofa, peguei na gaita e virei-me para Felgueiras e dei-lhes uma gaitada, na esperança que conseguisse lá de Maçores, alcançar Felgueiras, com a minha gaita grande.

    Maçores, yé la mie tiêrra....
    A. Filipe - O gaiteiro da Fraga da Masseira (Maçores).
    Como nasceu, o primeiro gaiteiro de Maçores

    Sendin, Janeiro de 2009:

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  13. Como nasceu, o primeiro gaiteiro de Maçores

    Sendin, Janeiro de 2009:

    Colocado a exercer funções no planalto mirandês, havia já dois anos, os meus dias eram passados sempre da mesma maneira, ou seja, de segunda a sexta-feira, depois do jantar, lá nos encontrávamos os 4 amigos da onça, prontos para jogar uma suecada, para ver quem pagava a rodada, umas lérias aqui e além, umas arrenúncias, tudo envolto no ambiente pesado do fumo, pesado e incómodo e causador do catarro... enfim.
    Deram-se as transferências, daqueles que estavam a trabalhar comigo e, com eles, foi-se embora o convívio da sueca, e se calhar também, o baralho das cartas mas mais certamente, o fumo do tabaco.
    As noites de inverno passaram a ser então, mais frias, mais sós e tristes.
    Numa das minhas frequentes idas à famosa aldeia de Palaçoulo, fui abordado pela juventude da farra, dos copos e das tainadas, que me convidaram para pertencer à Associação Lérias, para iniciar aulas de gaita-de-foles.
    Depois de uns sorrisos de gozo que deixei cair das minhas feições de rosto, parei dois segundos para pensar e disse cá para comigo: “xiça e porque não? Catancho, então se os outros tocam na gaita, porque é que eu não hei-de ir também aprender... ?” - Acedi ao convite. Não haveria eu de ter qualquer dificuldade, pois tocador que sou doutras gaitas (acordeão, não fosse o caro leitor julgar-me, como que se eu fosse um tresloucado), lá me apresentei eu de capa e espada, numa das noites seguintes, pronto para a minha primeira aula de gaita-de-foles. Dois dedos de conversa e entregaram-me para praticar, uma flauta de bisel, tal e qual, uma que tive quando andava lá no ciclo velho em Moncorvo, porém esta, tinha a furação das típicas gaitas mirandesas. Lá me ensinaram três músicas logo naquela noite, que as toquei muito facilmente, na flauta, claro. De ímpeto e da sala ao lado, trouxeram-me uma das gaitas de foles, onde um outro grupo de alunos, já mais adiantados do que eu, se alargavam em toques, melodias e músicas mirandesas. De uma forma cuidada, trouxeram-me aquele instrumento que apenas conhecia, de quando via o gaiteiro, lá em Maçores, na nossa festa, onde o maior desafio que havia sempre nessa altura, era conseguir por a gaita a tocar, que verdade se diga, ela tocar, tocava, mas a continuidade musical, é que não existia. Prosseguindo, então eu assim que vi o instrumento a vir na minha direcção e, ao ser-me entregue com toda aquela confiança, com todo aquele à vontade, eu confesso, que mais parecia que estava a receber um bébé ao colo. Desembrulhando-a, peguei no ronco e coloquei de imediato sobre o meu ombro esquerdo e ao mesmo tempo, olhei de soslaio, a ver se eu ficava bem naquela figura, que eu começara então a dar os meu primeiros passos. Ajeitei o fole, colocando debaixo da cova do mesmo membro superior, apontei o soprete na direcção da boca e com os lábios, abracei-o e comecei a encher o saco, ao mesmo tempo, que segurava na ponteira, tal como me fora explicado. Ao fim de quatro ou cinco "afuladelas" e com o fole meio cheio, ouviu-se logo, o som pesado, grosso, grave e contínuo, do ronco. Mais duas “afuladelas” foram quanto bastou para ouvir a ponteira a tocar. Segurando-a logo e posicionando os dedos, um em cada buraco, e claro, a mão esquerda na parte superior dessa peça e a mão direita, na parte inferior, encerrei assim, todos os buracos que, cada um, corresponderia a cada nota. O fole cheio e a gaita a tocar.
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  14. II PARTE
    O cotovelo esquerdo apertava o fole para que não permitisse que a gaita se calasse. Entre mais um sopro e uma apertadela, saía a música descoordenada, sem ritmo, sem nada mesmo... um fracasso, pensei eu cá para comigo, até que, voltei ao ponto inicial, tapei todos os buracos fundamentais, estendi um Si Bemol prolongado e, lembrando-me daquelas musiquinhas mirandesas que tinha aprendido anteriormente, ao mesmo tempo, que com os olhos fechados, tentava-me esquecer de todos os factores que à minha volta poderiam distrair-me, pensava na letra, na música e nisto... batendo o pé direito no chão, para marcar o compasso, soltei os dedos e, a música fluiu pelos buracos da gaita, compassadamente, com ritmo, com gosto, com elegância.
    A minha primeira música foi "A Saia da Carolina", tocada da forma mirandesa (o que é bastante diferente, daquela que nós estamos habituados a ouvir). Enfim... com alguns enganos ainda à mistura e alguns esquecimentos no aperto do fole de pele de cabrito cinzento, a musica mirandesa lá foi saindo naquela minha primeira noite. Depois desta música, toquei o "pingacho" e " riu-piu-piu", todas elas de origem mirandesa.
    Chegara assim, sem quase ter dado conta, o fim a minha primeira aula prática de gaita-de-foles.
    Devolvi a gaita ao mestre, que sorrindo, confirmou positivamente a minha habilidade e aplicação, deste aluno, não oriundo destas terras, desconhecedor deste tipo de instrumentos, logo na primeira aula e no primeiro exame, passou com distinção, revelando-se um potencial gaiteiro e difusor e discípulo deste instrumento, pelas terras do Mundo.
    Nessa noite, depois das aulas de música, regressei a "Sendin" e na viagem, no interior do meu veículo, assobiava satisfeito, a musica da "Saia da Carolina", acompanhado pelo som grave, rouco e seco, da "souffage" que mesmo no máximo, deitava sobre mim, ainda aquele ar frio, mas tranquilo e bom, para aliviar a alegria de ter alcançado e conquistado, o feito inigualável em Maçores, de haver um Maçorano, que tocasse assim e já tão bem, a gaita-de-foles.

    Nasceu assim, o primeiro gaiteiro de Maçores. (não sei se serei até, o único no concelho)

    Filipe. C
    “L gueiteirico de la Sîerra de Maçores
    - Biba l Gueiteiro!!! – BIBA!!”

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  15. Setembro 2009

    Como renasce a paixão da Gaita-de-foles

    Maçores, Setembro de 2009. O meu tio lá da França, tinha vindo a Portugal de férias e claro, “comme d´habitude les vacances” fazem-se por ocasião das vindimas, da apanha da amêndoa e da Festa de Felgueiras.
    Então, quando soube que o meu tinha chegado de férias, fui lá a casa a visitá-lo. Entre abraços e cumprimentos, notícias dos filhos e dos netos, partilha de novidades de cá e de lá, o meu tio torna-me a contar um episódio já antigo que ele teve na sua vida.
    Amicíssimo que é, de um emigrante lá das “tîerras de Malhadas, en Miranda de l Douro”, um certo dia, o meu tio pediu a esse tal amigo, que lhe levasse uma gaita-de-foles, típica daquelas terras, para a França, com a finalidade, de o meu tio ser o gaiteiro de Paris, visto que os emigrantes de Maçores, reúnem-se todos em casa dele, para festejar o S. Martinho. É verdade que têm lá quase de tudo, a faltar apenas, o gaiteiro. Julgou então o meu tio conseguir ocupar o lugar em falta e, mandou que fosse então adquirido e entregue o dito instrumento lá para ele tocar, nas ramboiadas Maçoranas.
    Desta vez, o meu tio pediu-me para levar a gaita ao construtor, ao artesão daquela mesma gaita, para a afinar e ajeitar, porque, dizia o meu tio, que teria dado cabo daquele monte de paus e pano.
    Ao ver o instrumento, embrulhei-o entre o fole, aconcheguei o soprete, o ronco e a ponteira e coloquei tudo no carro, em cima do banco traseiro.
    CONTINUA

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  16. II PARTE
    Barrocal do Douro – Picote
    Em casa do Sr. Ângelo Arribas, já meu amigo de à uns anos largos, gaiteiro que chegou a ser em Maçores, e isto já lá vão uns anos porreiros também, então, assim que viu lá a sua criação artesanal, reconheceu-a e questionou-me, intrigado evidentemente, acerca do propósito da minha visita e ainda para mais, com uma das suas gaitas.
    Lá lhe expliquei, que aquela gaita, tinha mais de 15 anos, novidade esta, que não assustou o artesão, pois quem melhor do que ele para avaliar a idade do objecto, do que o criador dele… que é mesmo assim.
    Entreguei-lha e ele, abrindo-a, constatou à primeira vista que a gaita deveria de estar boa de fole e madeira. Levou-a para dentro do seu espaço de trabalho, uma casa, toda ela dedicada ao seu ofício de construção de instrumentos de origem mirandesa. Nas paredes, estavam expostas gaitas de foles de todo o feitio e cor. Elaboradas com as madeiras locais mais comuns, como freixo, até a madeiras nacionais e raras, como o bucho, a outras de madeira estrangeira. Havia ainda, flautas pastoris, bombos e caixas de guerra, tudo à vista umas prontas, outras em construção.
    O “Tiu Ângelo”, separando a ponteira do fole, retirou a palheta e “mirando-a” de contra a janela da divisão, por onde entrava o sol daquela tarde de verão, analisou a pequena peça e disse-me que tinha achado o mal da gaita.
    Cirurgicamente, aquele homem, aquele artesão, descobriu na verdade, o mal daquela gaita. Abriu uma pequena caixa metálica de cigarrilhas espanholas e retirou do interior, uma palheta, afinada num Dó Maior e colocou-a no correspondente espaço, ou seja, num pequeno buraquinho, onde nele encaixa uma ponta da palheta e por onde o ar passa, antes de entrar na ponteira.
    Voltou a montar o objecto e preparou-se para dar ali uma gaitada. Ronco ao ombro, fole debaixo do braço, cotovelo esquerdo dobrado, soprete nos queixos, umas “afuladelas”, tocou o ronco e a ponteira… maravilhoso… a gaita já tocava. Sabe-se lá, já ao tempo que a gaita estaria parada e, veio o sapiente construtor e deu-lhe ali o jeito que faltava.
    Preparou-se para tocar, tapando os buracos todos, entoou uma “alvorada” (melodia e toque daquelas terras). À pressa, tive tempo de sacar a máquina do bolso e registar as imagens … espectáculo. O homem, apertou com a gaita, matou saudades do instrumento que fizera e depois parou. Deixou-se de ouvir o ronco e a ponteira naquela divisão da oficina, que ensurdeceria qualquer um.
    Disse-me ele: Olhe, sabe, vá dizer uma coisa ao seu tio e, diga-lhe que fui eu, que mandei, que ele faça o seguinte: “la gaita, la mulher e carro, tîenen q´andar sîmpre bîen afinados”. Percebendo a mensagem, agradeci e vim embora, com o instrumento já ajeitadinho.

    Chegado a Maçores, fui direitinho a nossa casa, ao fundo da aldeia. Tirei a gaita do carro e fui-me para dentro a experimentar a gaita, para ver se não me teria esquecido das lições de inverno.
    Mais uma vez, ronco ao ombro, fole debaixo do braço, soprete na boca, ponteira na mão, encho o fole e começo a tocar as melodias aprendidas em Janeiro. Não satisfeito, já que não me faltava o vagar, decidi “ampeçar” a tocar as musicas de Maçores, tais como “Era o Vinho” e “ Manuel Duarte”, melodias que saíram assim, num instante e tal como manda a tradição.
    Após ver que de facto estava ainda nos eixos, fui lá a casa do meu tio a proceder à entrega do instrumento. Encontrei-o então junto ao portão de casa. Depois de o cumprimentar, disse-lhe que já ali trazia a encomenda afinadinha e pronta a tocar. Transmiti-lhe fielmente, o recado que me mandara o artesão e uma gargalhada nossa, pastou e alimentou o período de tempo, em que retirei a gaita e lha passei para a mão. O meu tio, ciente que estava do meu passado com a minha aprendizagem de gaitas mirandesas, pediu-me que ali mesmo na rua, desse uma gaitada. Mais uma vez, executei os procedimentos de início de actuação e fiz soar na rua larga da FontaPereira, o característico som da gaita.
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  17. III PARTE
    Mais uma vez, executei os procedimentos de início de actuação e fiz soar na rua larga da FontaPereira, o característico som da gaita.
    “Oh Aida, oh minha filha”, constitui uma das músicas, que se consideram desde à muito tempo esquecidas em Maçores. Ameaçada e esquecida, por não haver quem ensinasse os gaiteiros novos que vinham vindo, associado ao facto de os velhos se irem esquecendo também. Felizmente, considero-me ainda um arquivo vivo, dessa música. Buraquinhos da gaita encerrados e começo a tocar essa musica na rua. Bem… o resultado foi que as pessoas que ouviram, vieram todas à rua para ouvir o gaiteiro. O gaiteiro que tocou a melodia mais esquecida do reportório local e que, com isso, os fez recordar de como é bom ouvir o gaiteiro.
    “Ai Adeus, oh Manuel Duarte!”, foi a música que se seguiu e serviu para mostrar que gaiteiro, já temos em Maçores. O Camarada Comunista de Maçores, no seu passo lento, descia a Rua onde estava o gaiteiro a tocar e onde, junto aos portões das vivendas, estavam as famílias curiosas, então ele, no seu tom de fala arrastada, semelhante a uma cana rachada, disse:”- Venha o S. Martinho, que já temos Gaiteiro, carvalho”.
    Actualmente, deve andar uma gaita de foles e um Maçorano, a tocar lá para as terras dos ” Champs Elysées”.

    No dia seguinte, telefonei logo ao meu amigo de oficio e grande artesão, se não o maior e mais bem conceituado, Célio Pires, “fazedor” de gaitas de foles mirandesas, e mais, o diabo a quatro, acho que não deve haver nada que o Célio não faça, e, ao telefone, disse-lhe para que me construísse a minha gaita de foles.
    “- Célio, quero que me faças a minha gaita-de-foles, e que seja assim: Madeira de bucho (por ser uma madeira transmontana muito rara, é de cor amarelada, como o ouro e como o sol, afinada em Si Bemol, tal como é afinada a típica gaita mirandesa), e que seja forrada a pano preto (porque, embora eu como gaiteiro seja uma pessoa alegre, a minha alma estará sempre de luto).
    Que a gaita nunca se cale em Maçores, que toque até sempre, sempre que sejamos Maçoranos.

    Filipe. C
    “L gueiteirico de la Sîerra de Maçores
    - Biba l Gueiteiro!!! – BIBA!!”

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  18. Parabéns Filipe. Gostei imenso do teu relato, além de que, como choqueiro que sou, sempre gostei do São Martinho. Só não consentirei nunca que casem esse borrachão (o S. Martinho) com a nossa menina (S. Eufemia). J. Andrade

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  19. História
    O nome desta aldeia, situada entre várias serras, aparece nos livros de registo paroquiais como "Massores", que deve radicar do termo arcaico "masores", que significa testamenteiro, executor de testamentos e das mandas. Os machados de pedra polida e as moedas antigas que apareceram no termo desta freguesia comprovam que esta é povoada desde os tempos pré-históricos e romanos. Pensa-se ter havido ali indústrias de tapetes e colchas de lã e linho em teares manuais, o que não é de estranhar, visto que a freguesia fica bem perto de Urros onde ainda há quem trabalhe com teares.
    Nos meses de Fevereiro e Março as encostas ficam vestidas do branco das flores das amendoeiras. Mas, é no Outono na festa de S. Martinho que as pessoas vivem a mais ancestral das festas populares. A festa é composta por um magusto colectivo, uma caldeira cheia de vinho, onde as pessoas bebem de bruços, uma gaita de foles e foguete
    Distância a Torre de Moncorvo
    12 Km
    Festas e Romarias
    S. Sebastião (2º domingo de Setembro), S. Martinho (11 de Novembro) e N. Sra. de Fátima (ultimo Domingo de Maio).
    Património
    Igreja matriz, capelas de St. Cruz e de S. Sebastião e palheiros em xisto.
    Fragas da Maceira, do Pindão, do Arco da Costa, moinhos, zona de caça e serra do Monte Ladeiro.

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