Morreu ontem o abade de Baçal, um homem
pré-histórico e sábio. Pré-histórico, porque se manteve sempre na primitiva
decência de uma humanidade fundamental; sábio, porque sabia do seu ofício, que
era a arqueologia. Patego e sem génio, trouxe para a reflexão dos problemas da
cultura um bom senso campónio, terroso, que tem a utilidade doméstica do Borda
d'Água. E a sua obra é uma espécie de 'governo do ano' do distrito de Bragança.
As luas, quando se rega e semeia, a época das colheitas, e as rezas com que é
preciso ajudar a semente. Parece pouco, mas é assim que se começa. Como bípede
e transmontano, gostava de lhe ter dito duas palavras sobre a sepultura. Nada
de particular. Testemunhar-lhe apenas o meu respeito, não pela obra, que é
rudimentar, como digo, nem pela vida, que foi de primário, como se sabe.
Gostava de o saudar pela raridade da sua casta. Andei há tempos várias léguas
para ver um teixo, que é uma árvore que os botânicos dizem que vai acabar.
Este texto está incluído no livro "Pátria Breve" de Ernesto Rodrigues, edição Textype.
Nota do editor: A fotografa foi recolhida da Internet.
Ana Diogo:
ResponderEliminarDeliciosa citação de Torga!
Shawn Parkhurst:
ResponderEliminarO Torga mordeu com dente afiado e coração de mel!
Grande Torga,raivoso como só ele.Desdenhou a obra do grande Abade,fazia-lhe sombra.Qual dos dois será lido daqui a 50 anos?
ResponderEliminarUrse.
Abade de Baçal e Torga - ambos são grandes. Podemos , por vezes, discordar de um ou do outro, (aqui discordo do Torga) mas ambos serão lidos daqui a muitos anos !
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