O Vale do Sabor, em Trás-os-Montes, que até ao final deste ano ficará completamente submerso pela nova barragem da EDP, tem uma galeria de “arte rupestre móvel ao ar livre, do Paleolítico Superior, única em toda a Península Ibérica” – adiantou ao SOL Rita Gaspar, da equipa de arqueólogos que investiga aquela zona há dois anos.
Esta galeria, acrescenta a investigadora é também a maior do seu género da Europa: "Ao ar livre, apenas foi encontrada, na Alemanha, uma outra semelhante à que descobrimos na foz da ribeira do Medal, mas esta é bastante maior, quer em termos de quantidade quer na qualidade dos achados, e tem muito material arqueológico para ser estudado".
Ao todo, os investigadores descobriram nesta escavação, com cerca de 900 metros quadrados (dos quais 200 têm vestígios de antigos povoamentos), 300 mil fragmentos de placas do Paleolítico Superior – ou seja, com datação cronológica entre 10 mil e 15 mil anos antes de Cristo. E “cerca de 1.400 são fragmentos de placas de arte móvel”, especifica ainda a arqueóloga Rita Gaspar, do Agrupamento Complementar de Empresas (ACE), formado pela Bento Pedroso Construções e pela Lena Construções, consórcio ao qual a EDP adjudicou a obra da construção da albufeira do Baixo Sabor.
30 mil anos de ocupação
As escavações do Baixo Sabor – que já estão encerradas e que não retiraram todos os achados para, como é regra em Arqueologia, deixar “uma reserva para as gerações futuras” – revelaram ainda que “houve uma ocupação permanente do Vale desde há 30 mil anos” e que o sítio do Medal foi importante em toda a região, no que diz respeito à ocupação de comunidades pré-históricas de caçadores-recolectores.
Segundo explicou Rita Gaspar ao SOL, o Medal é, ao longo de todo o trajecto do rio, o único local que se conhece em que as comunidades do Paleolítico Superior pararam – não só para gravar as rochas, mas também para manter outras actividades, como a caça ou a recolha de alimentos. Nas escavações do Medal, foram encontradas ferramentas, como machados, lanças, cajados e facas, entre outros utensílios de pedra, ossos ou madeira. “Trata-se, sem dúvida, de um povoado onde houve muita actividade”, diz a investigadora.
Os arqueólogos estão agora a ‘a montar’ a história dos nossos antepassados em laboratório. A expectativa é que “que os milhares de fragmentos já encontrados colem entre si” para poderem ser comparados com as gravuras descobertas no vizinho vale do rio Côa – outro afluente do Douro que, recorde-se, protagonizou a única situação na História de Portugal em que o património cultural impediu a construção de uma barragem.
Esqueletos humanos em Crestelos
O sítio de Crestelos, na quinta com o mesmo nome e onde ainda estão a decorrer escavações, é outros dos locais importantes do Vale do Sabor: “Crestelos tem uma ocupação contínua de mais de dois milhões de anos. Aqui descobrimos estruturas da Idade do Ferro e do Bronze, que ainda não foram encontradas noutros locais da região”, salienta Rita Gaspar.
“De 1.500 anos a.C., ou seja, há cerca de 3.500 anos, encontrámos fossas no chão com enterramentos humanos”, conta a arqueóloga. Trata-se de seis esqueletos, “incluindo um casal, que foi enterrado na mesma fossa”. Esta descoberta “foi muito surpreendente por ser neste tipo de solos, que têm um elevado nível de acidez”.
Quando começaram os trabalhos de construção da barragem do Baixo Sabor, eram conhecidos apenas 300 sítios arqueológicos, mas com as investigações – que ainda decorrem – o número aumentou para 2.400.
No último ano, a equipa de arqueologia dedicou-se a perceber a importância destes achados para, em breve, reportar as descobertas ao Governo, desvenda a mesma fonte: “Estamos a compilar toda a informação reunida para depois reportar as nossas descobertas à tutela [Direcção-geral do Património Cultural e à Direcção geral de Cultura do Norte] que decidirá o que fazer com os achados”. A ideia é, à semelhança do que aconteceu no Alqueva, fazer uma monografia, que deverá ser publicada em 2014.
Por isso, os visitantes que quiserem conhecer um pouco da história do Sabor podem aproveitar os próximos meses. Antes que a zona das escavações seja selada e acabe por ficar debaixo de água.
É absolutamente necessário que tudo seja preservado.
ResponderEliminarAbraço
Júlia Ribeiro