Fernando Pessoa
Quando vim para Leiria vivi na Avenida Ernesto Korrodi e só tinha duas famílias por vizinhança. Mas tinha o belíssimo castelo quase em frente, a GNR ao cimo, à direita e a PSP e Governo Civil ao fundo, à esquerda. Estava bem guardada, o que não evitou desacatos e que o meu carro fosse queimado no “verão quente“ de ’75. Mas isso seria uma longuíssima história e que nada teve de inocente.
Agora vamos a uma estorinha muito breve e, como lá diz o poeta “...o melhor do mundo são as crianças”, vou contar-vos uma estória de inocência.
Uma das nossas duas vizinhas era uma senhora viúva, pobre e doente, que acabou por falecer aos 45 anos. Tinha dois filhos gémeos da idade da minha filha, na altura com 4 ou 5 anos. Foram para a escola primária juntos e para o ciclo também. Para as brincadeiras, a que se juntava o meu filho, mais velho uns 3 anitos, juntavam-se ainda os miúdos da Rua das Olarias, uma quelha estreita e de casas muito pobres, para os lados de trás da GNR. No grupo, de umas dez crianças, a minha filha era a única rapariga. Nas brincadeiras: saltar ao eixo, jogar a bola, trepar às àrvores (havia um pequeno largo com 3 árvores entre a ninha casa e a da mãe dos gémeos) , a pequenita foi bem aceite pelos garotos porque, por um lado, ela era muito ágil e por outro lado, não tinha meninas com quem brincar. Ora, todos os rapazinhos queriam namorar com ela. Mas, para namorar, ela disse claramente que só gostava dos dois gémeos e os outros aceitaram a situação. No entanto, achavam um namoro estranho e perguntavam-lhe “Como é que namoras com os dois ?”, ela respondia: “Quando me zango com o João, namoro com o Carlos. Quando me zango com o Carlos, namoro com o João “. O meu filho, com uns 8 anitos, ria-se e dizia: “Ela ainda não percebe nada”.
Um dia, um miúdo mais espertalhote perguntou-lhe : “E quando te casares, como é que é?” E os gémeos perguntaram também: “E depois? Como é que é? “ Aí é que a garotinha ficou sem resposta. Deve ter pensado longo tempo e, passados dois dias, pediu-me papel de carta e um envelope. A coisa era formal! Forneci-lhe o material pedido e confesso que fiquei intrigada.
Meteu-se no quarto, encostou a porta, perguntei-lhe do corredor se precisava de ajuda e respondeu um seco: “Não”. Uma horita depois deu-lhe a fome e veio lanchar. Os parceiros já estavam no larguinho todos a jogar a bola. Comeu e correu para a brincadeira. A sua importantíssima tarefa estava esquecida.
Fui espreitar ao quarto. Em cima da mesinha, a folha de carta estava escrita e o envelope endereçado. Era para o João. Dizia:
“João, eu gosto muito de ti. Mas gosto mais do Carlos e vou casar com ele. Não fiques triste, porque depois vais ser meu cunhado”.
Deixei tudo como estava e pensei: “ Que prémio de consolação! ”.
Júlia Ribeiro, 2011-08-21
Realmente ! Mas que premio de consolaçao.
ResponderEliminarNamorar ora com um ora com outro, ora com uma ora com outra, tudo bem. Casar é que é uma porra. E depois, como é que é? Só se pode servir de cunhado . Até a criança se deu conta.
ResponderEliminarEu também me dei conta, mas já foi tarde .
Já sou fan destas estórias.
Manuel Santos
E eu que fiquei para tia!
ResponderEliminarÉ pior que ser cunhado.
Maria
Um presunto ;foi o melhor prémio de consolação que conheci.Ganhava-o o último ciclista a passar a meta volante colocada em frente ao jardim.No tempo do Pedro Polainas.
ResponderEliminarDo nosso poeta popular ,o Tio Morgado ,esta advinha para a menina decifrar:
ResponderEliminarQuando cheguei aos 16 anos
Comecei a namorar
Com uma menina de 13
Com quem iria casar.
A menina que namorei
Tinha-me muita afeição
Era filha duma viúva
Enteada do meu irmão.
Vou dizer uma adivinha
Que não é fácil adivinhar
Como com 4 pessoas
A minha família se pôde formar.
Dois maridos, duas esposas
Uma filha e uma mãe
Uma sogra e um genro
E dois irmãos também.
Dois cunhados, duas cunhadas
Fizemos uma vida linda
Um padrasto e uma enteada
A família também tinha.
Vem no livro "As poesias do Tio Morgado do Felgar". Edição ,muito bonita, da câmara municipal de Torre de Moncorvo.
“Quando me zango com o João, namoro com o Carlos. Quando me zango com o Carlos, namoro com o João “
ResponderEliminarVersão infantil do espírito do bloco central. Acertam sempre!
Noitibó
Olá, Amigos blogueiros e comentadores:
ResponderEliminarDiverti-me com os vossos comentários. Então o Noitibó tem um jeito enorme para acertar.
Gostei especialmente do poema do Tio Morgado do Felgar.
Segue outra estorinha.
Júlia