Já há mais de quatrocentos anos que
transfigurou toda a paisagem de Miranda, anunciando-se muito ao Longe:
primeiro, quem vinha pelo velho caminho medieval, agora quem se aproxima pela
estrada nacional e quem desce o Douro de barco, avista os seus pináculos de
pedra, erguidos como um grito: é a Catedral de Miranda. À medida que o viajante
se aproxima, tudo vai ficando pequeno, mesmo as velhas muralhas, mandadas erguer
por D. Dinis em fins do século XIII, se ajeitam como cinta para tão grande
corpo. Quem entra na cidade velha e vem da rua que era da Alfândega, ou da
Costanielha, ou quem dá a volta às muralhas por poente, olhando Santa Luzia,
fica sempre com a ideia de que uma tal imponência foi sonhada para uma outra
cidade, maior e sem um contraste tão forte com as casinhas manuelinas de
rés-do-chão e primeiro andar, brancas como um grande pombal. Quem sobe as
arribas do Fresno, de pouca água no verão, e olha a imponência de meter medo do
Douro, olha esta pequena cidade mesopotâmica e espanta-se como a Sé com as suas
duas torres consegue zombar do Penedo Amarelo, ali defronte, no rio, chegando
até a olhar de cima o suave bater de asas de águias e de grifos.
Esta Catedral começa por nos aparecer como um excesso que nada à sua volta consegue explicar, mas é exactamente como tinha de ser: sempre assim foi com as velhas catedrais, pequenas de mais na sua grandiosidade para lá caber Deus e a fé, apesar disso sombras da grandeza divina a que nada na Terra pode comparar-se.
A vilazinha que D. Dinis fundou em 1298 seria pequena e aconchegada dentro do seu castelo e da igreja matriz de Santa Maria Maior, desde esse tempo erguida no mesmo local onde depois se fez a Sé, agora já com nome de cidade e pergaminhos de sede de bispado, arrancado ao arcebispado de Braga desde 1545. Embora agora acolhesse outras gentes mais ricas e cultas, a cidade nunca chegou a crescer muito. Entre padres, funcionários e soldados, a maioria vindos de fora, a cidade fez-se de costas para os mirandeses, pois até a sua língua deixou de falar e apenas há pouco tempo se voltou aqui a ouvir. Mas a grandiosa Sé mostra que esta cidade foi um dia um sonho cheio de futuro e de grandeza, pois mesmo os sonhos não realizados deixam a sua pegada a marcar a história.
Esta Catedral começa por nos aparecer como um excesso que nada à sua volta consegue explicar, mas é exactamente como tinha de ser: sempre assim foi com as velhas catedrais, pequenas de mais na sua grandiosidade para lá caber Deus e a fé, apesar disso sombras da grandeza divina a que nada na Terra pode comparar-se.
A vilazinha que D. Dinis fundou em 1298 seria pequena e aconchegada dentro do seu castelo e da igreja matriz de Santa Maria Maior, desde esse tempo erguida no mesmo local onde depois se fez a Sé, agora já com nome de cidade e pergaminhos de sede de bispado, arrancado ao arcebispado de Braga desde 1545. Embora agora acolhesse outras gentes mais ricas e cultas, a cidade nunca chegou a crescer muito. Entre padres, funcionários e soldados, a maioria vindos de fora, a cidade fez-se de costas para os mirandeses, pois até a sua língua deixou de falar e apenas há pouco tempo se voltou aqui a ouvir. Mas a grandiosa Sé mostra que esta cidade foi um dia um sonho cheio de futuro e de grandeza, pois mesmo os sonhos não realizados deixam a sua pegada a marcar a história.
AMADEU FERREIRA
Fonte: "ONDE NADA SE REPETE" - crónicas à volta do património. (excerto)
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