O lobo - por ARMANDO SENA

"Videira, não conseguindo aguentar tanto tempo metido entre quatro paredes, descobriu ali a oportunidade para antecipar o recreio.- Dona Odete, dá licença que vá lá fora, dirigiu-se ele para a professora, na forma habitual de quem precisa de satisfazer as necessidades fisiológicas.- Podes ir, concedeu a dona Odete, já sem paciência para questionar o pedido.Videira dirigiu-se como habitualmente para o giestal que havia do outro lado da escola. Embrenhou-se pelo interior dos arbustos e por ali ficou alguns momentos. Os que o organismo exigia, mais os que a pouca vontade de regressar sugeriam.Quando lhe pareceu estar já a exceder o tempo normal para o ato, regressou lentamente de volta à escola.Ainda não tinha saído do mato quando encontrou o João sapateiro, de espingarda em riste, com ar de quem tinha corrido atrás de algo.Era público que tudo que fosse bicho-do-mato, o João sapateiro dava caça.- Rapaz, não viste um lobo por aqui, há pouco mais de cinco minutos?- Lobo, não. Por mim passou um cão. Castanho, a correr.- Um cão, bah. Disse o caçador, continuando a perseguição. Videira ficou embasbacado, reconhecendo agora que esteve exposto ao perigo e não se perdoando, como rapaz do campo, que não tivesse distinguido um lobo de um cão.Agora, mais preocupado, desatou a correr na direção da escola. Nunca teve tanta vontade de voltar às aulas!

Excerto de "Na Demanda do Ideal"