sábado, 12 de novembro de 2011

Uma estória do coração, por Júlia Guarda Ribeiro

Volta e meia, é noticiado nas TVs , nas rádios e nos jornais europeus – Portugal incluído – que as doenças cardiovasculares são a principal causa de mortalidade e morbilidade na Europa. Estudos de 2003, 2005 e 2008 referem que, se em 2003 este tipo de doença foi responsável por 2 milhões de mortes nos então 25 países da União Europeia, em 2008 esse número mais que duplicou. Os custos com as doenças cardiovasculares dispararam de 169 mil milhões de euros em 2003 para mais de 300 mil milhões em 2008. E estes números tendem a aumentar assustadoramente.
Pressinto que terei deixado os leitores assaz apreensivos com estes números consternantes.
Por isso, para descontrair, aqui vai uma estória verídica passada com um doente do foro cardíaco internado num hospital no norte do país.
Uma manhã, a cardiologista que estava a dar consulta, foi surpreendida pelo pedido urgentíssimo de uma jovem que, lavada em lágrimas, lhe dizia:
“ Sra. Dra., venha lá cima, por favor. Venha ver o meu pai. Ele quer tirar o soro e arrancar os tubos. Quer ir embora já ” .
“ Disparate. Qual ir embora já, qual carapuça. No fim da consulta lá irei. Vá, vá lá e diga ao seu pai que esteja sossegadinho”.
“Já lhe disse isso mesmo. Mas quem o convence? Até parece que não está bom da cabeça. Quer saber, Sra. Dra? Ele contou-me uma estória incrível, e disse que, se ficar cá, esta noite alguém o vai matar”.
“Que tolice é essa agora?”
“Oh, Sra. Dra., venha depressa, que ninguém o segura”.
A médica interrompeu as consultas e lá foi ver o que se passava. O doente, homem dos seus 45 anos, estava devidamente medicado e até apresentava um aspecto saudável. Ocupava a segunda das três camas da pequena enfermaria. Na terceira cama estava um paciente idoso, de olhos esbugalhados de terror provocado pela estória que o Sr. António contava. A primeira cama estava vaga. “Então, Sr. António, que se passa?”
“Quero ir-me embora. Tirem-me daqui. Pelas alminhas, tire-me daqui, Sra. Dra.”.
“Mas porquê, Sr. António?”
“Se fico cá, eles vêm matar-me esta noite”.
“Eles? Eles, quem?”
“Os três mascarados que, na noite passada, mataram o homem que estava nessa cama aí, ao pé da porta” . E, baixando a voz, contou em segredo: “ Eles vieram, pela calada da noite, pé ante pé, e deram uma carga de porrada ao pobre homem. Os três aos murros ao desgraçado. Deram-lhe tantos socos que o mataram. Só descansaram quando o viram morto. Depois levaram-no. Saíram a correr, para ninguém dar por nada. Aqui o coitado do velhote já quase que não vê nem ouve. Mas eu vi e ouvi tudo. Se fosse eu que estivesse nessa cama, a esta hora o morto era eu. Eu bem sei que eles voltam cá esta noite e matam-me a mim. Quero ir-me embora…”
A médica a custo continha o riso. Explicou então ao doente , à filha e ao velhinho aterrorizado que “eles” eram um médico e dois enfermeiros que, na noite anterior, tiveram de prestar cuidados de reanimação ao paciente da cama ao pé da porta e isso incluiu uns socos valentes no peito do doente . Depois, naturalmente, levaram-no numa maca o mais depressa possível para os cuidados intensivos, onde ainda se encontrava.
Porém, para o Sr. António que, na cama ao lado, em pânico, caladinho que nem um rato, assistira à cena de pancadaria, haviam sido “três mascarados que, pela calada da noite”, tinham vindo dar uma sova de morte ao desgraçado que teve o azar de estar na cama ao pé da porta. Só não lhe calhara a ele, porque a sua cama era a do meio. Portanto, pelo sim e pelo não, o melhor era pôr-se ao fresco.
Custou a convencer o Sr. António!

Leiria, 4 de Novº de 2011
Júlia Guarda Ribeiro

11 comentários:

  1. Caso INSÓLITO
    Diretor e Presidente de Conselho Executivo/ Diretivo há mais de 20 anos com progressão na carreira como se fosse licenciado sem o ser.
    O atual Diretor do Agrupamento de Escolas Dr. João de Araújo Correia, recentemente eleito -16 de julho de 2011- apresentou-se a concurso, como sendo licenciado em Produção Animal na IUTAD quando, afinal, se verificou que nunca completou a licenciatura que diz ter.
    De acordo com o Regulamento eleitoral para o cargo de Diretor, aprovado, por unanimidade, pelo Conselho Geral Transitório, os candidatos que prestassem declarações falsas seriam excluídos automaticamente do concurso. A Comissão que acompanhou e verificou todo o processo eleitoral, na sua boa fé, não verificou se o candidato tinha ou não feito declarações falsas; aceitou-as como verdadeiras e, por isso, considerou que o ex Presidente da Comissão Administrativa Provisória, ex Diretor do Agrupamento vertical de Peso da Régua, ex Presidente do Conselho Diretivo/Executivo, reunia as condições para ser candidato a diretor do Agrupamento, vindo a ganhar a eleição com 12 votos contra os 9 que o seu opositor teve, no órgão que o elegeu - o CGT.

    Faça-se JUSTIÇA!!!!!

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  2. Coitado do senhor António!Doente cardíaco,teve sorte em não morrer do susto.
    Todas estas estorinhas servem para nos "descontrair".Por isso lhe agradecemos,Julinha.

    Uma moncorvense

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  3. Mais uma estorinha, bem contada, da Julinha!
    Obrigada.
    Um beijinho.
    Arinda Andrés

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  4. Obrigada Julinha por mais uma bonita estorinha!
    E com estas coisas, quem não sofre do coração, pode ficar a sofrer.
    Arinda Andrés

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  5. Venho por aqui para saber notícias da terra dos meus pais e avós. Mas agora venho mais vezes para ler estas estórias. Depois conto-as à minha mãe pelo telefone. Ela farta-se de rir.
    Obrigado.

    Albertina Sá

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  6. Que susto bem safadinho levou o coitado de seu Antonio, não foi memo?

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  7. As histórias dos médicos e doentes não têm fim e o mêdo dos doentes vem do tempo dos abafadores .Miguel Torga,ele que foi médico, conta num dos seus livros uma história de arrepiar.E há sempre um falso médico que exerce durante anos,atestados a alunos para faltarem às aulas e por fim falsos doentes para se baldarem ao trabalho.Um antigo jogador do Benfica,natural da Régua cortou um dedo com uma mota-serra para ter 30%de incapacidade.Reanimar o doente com pancada é a receita do Gaspar das finanças .A carteira fica do mesmo lado. Bate e tira prá TROYCA gira.
    Ricardo coração de Leão

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  8. Se houver concurso para as estorias com mais piada eu voto nas da prof. Julia Ribeiro.

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  9. Olá, caríssimos comentadores, blogueiros e demais visitantes:
    Um abraço amigo para todos. Um beijinho muito repenicado para a Arinda e outro para "Uma Moncorvense".

    Caro 1º Anónimo:
    Aquilo a que chama caso insólito, olhe que não é assim tão insólito. O que mais há são trafulhas por esse país fora. Custa é a entender que só muito tardiamente se dê pelas suas aldrabices. Mas acredite que há muitas que passam...

    Olá, "Ricardo, Coração de Leão:
    Muitos médicos foram - e são - excelentes escritores. Torga, Fernando Namora, João de Araújo Correia, Lobo Antunes e muitos mais, portugueses e estranjeiros. Têm contos e romances espantosos.

    Ao último anónimo agradeço tão lisonjeira opinião que, de facto, está muito inflaccionada.

    Abração
    Júlia

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  10. Olá querida Julinha!
    Senti o repenicar dos beijinhos!Souberam-me a cantinho de Reboredo, a lareira da aldeia, BILHÓS ao redor de uma fogueira de Natal, em família; enfim a muitas coisas.Obrigada!
    Mas são tantas as que passam! ...As aldrabbices!
    Continua a contar-nos, com tanta naturalidade, coisas como estas!
    Um beijinho, amigo; e outro para "Uma Moncorvense".

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  11. Houve uma falha imperdoável da minha parte: não mencionei o Prof. Doutor Daniel de Sousa, nosso conterrâneo, nascido em Moncorvo, um grande poeta e autor de textos belíssimos, sentidos, pungentes, que frequentemente assentam na sua prática diária de médico pediatra, do foro das doenças oncológicas.

    O seu blog tem o nome "Head and Neck". Recomendo-o vivamente a todos os que por aqui passam.

    Júlia

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