“Grande é a poesia, a bondade e as danças ... Mas o melhor do mundo são as crianças" Fernando Pessoa
Entrei no Estágio pedagógico em 1968 e fiz o Exame de Estado em 1970. Era então “moda pedagógica” que o professor, ao corrigir um erro do aluno, nunca o deixasse ver o erro cometido. O erro tinha de ser obliterado. Por escrito e oralmente. Por escrito, era fácil. Oralmente, mais complicado. Exemplifico: se o aluno dissesse “My mother drink milk”, o professor deveria dizer de imediato: “Oh! Your mother drinks milk” . E repetia para bem seguir o pedagogês : “Well, your mother drinks a glass of milk”. E isto sucedia com todos os alunos. Nunca diziam o “s“ na 3ª pess. do sing. do Pres. do Indicativo . Até o professor um dia mandar às urtigas a proibição didáctica do “ nunca usar o Português na aula de língua estrangeira”, dar um murro na mesa e dizer alto e bom som que a 3ª pessoa do sing. etc. etc. tem um sempre um “s” à excepção de uns 4 ou 5 verbos que irão aprender mais tarde. Era remédio santo. Fiz isso um dia com o metodólogo e as colegas todas a assistir à minha aula. Ia caindo o Carmo e a Trindade. Pecado mortal. Imperdoável. Então contei-lhes a estorinha que vos conto a seguir.
A minha pequenita tinha uns 2 anitos. Chamei-a duas ou três vezes e ela não respondeu. Em voz mais alta perguntei: “Tu não ouves?” . “Ôvo”, foi a resposta. Deixei o que estava a fazer fui ao pé dela , levantei-lhe o queixinho e , pondo em prática o que os modernos livros de Pedagogia pregavam como verdade inquestionável, disse-lhe: “Ouço” . Os olhos da miúda não demonstraram qualquer compreensão e eu repeti: “Ouço”. Da parte dela, nada. Pela terceira vez : “Ouço” . Então, deve ter havido um click nos seus neurónios e respondeu: “ Já ouci ! ”
O mal é que eu não explicara à criança , “Olha, minha linda, não se diz ‘ôvo’; diz-se ‘ouço’ “. E o resultado foi o que se viu. Colegas e metodólogo riram mas meteram a viola, que é como quem diz, o pedagogês, ao saco.
Se algum ou alguma colega jovem estiver a ler este post, não siga modas, porque são modas. Siga aquilo que, nas suas aulas, dá resultado com os seus alunos.
Agora passou-me pela ideia que quem teria gostado desta estorinha teria sido o meu colega e amigo Assis Pacheco.
Júlia Barros Ribeiro (Biló)
Nota do editor: Hoje, dia de aniversário da autora deste texto, somos nós, os seus leitores, quem recebe esta "prendinha". Por isso lhe agradecemos com abraços de parabéns.
http://lelodemoncorvo.blogspot.com/2010/08/minha-amiga-julia_17.html
http://torredemoncorvoinblog.blogspot.com/2009/08/pra-julia.html
“Tu não ouves?” . “Ôvo”,
ResponderEliminarSe a menina fosse da courredoira dizia "Ôbo,catantcho"
e moi ouci
É verdade:nós é que estamos de parabéns com tal "prendinha".Li,voltei a ler e li mais uma vez,porque o prazer foi imenso e a vontade de rir não acabava.Tem razão a Julinha:"às malvas" as modas quando elas não resultam.Como professora,também eu fiz,por várias vezes, verdadeiras "piruetas"na sala de aula para me fazer entender ou corrigir os erros dos alunos:recurso a gestos,mímica,gravuras,etc.Até que descobri a minha própria "moda".O ensino/aprendizagem de uma língua estrangeira na sala de aula é sempre artificial,e nós,professores,não podemos fazer milagres,que só se obtêm no convívio diário com a cultura do país onde se fala a língua que se quer aprender.Todas as teorias (ou modas) fracassam,porque a aprendizagem não é natural.
ResponderEliminarObrigada pelos momentos de boa disposição que me ofereceu.Um abraço com muita ternura e votos de saúde e tempo para continuar a deliciar-nos com as suas estorinhas.
Uma moncorvense
Há modas que só dão para o torto. Houve a da reguada: toma, 3 erros, 3 reguadas. Depois o contrário: os erros ortográficos não são para descontar. É ver no que isso deu. Agora, mesmo em Português, há respostas de cruzinhas. E depois? Quando se aprende a saber ler e interpretar um texto? Também sou professora há quase 20 anos e serei mais 20, se ainda por cá andar, mas já vi modas que baste. Agradeço à professora Júlia, e desde já lhe digo que vou contar esta estorinha muitas vezes.
ResponderEliminarMª da Luz Martins
Olá, Colegas:
ResponderEliminarO pedagogês, como lhe chama a Júlia, continua em força. O pedagogês, a burocracite e o burocratês e, acima de tudo, a partidocracite e o politiquês.
A estorinha é do melhor que tenho lido.
Obrigada, Júlia.
Assim vai o ensino em Portugal.Modas,reuniões,classificações dos professores ,fecho de escolas,hiper concentrações de alunos,ausência de autoridade,pais a assobiar para o lado,sindicatos profissionais ,música do Quim Barreiros nos trnsportes escolares,charros,sexo e shots nas festas dos finalistas,mestrados e doutoramentos via google,erasmo/orgasmo by U.E.
ResponderEliminarNo meu tempo ,infelizmente, tinhamos que estudar,decorar e calar.
C.M.
P.S.Obrigado minha senhora pelo seu texto e que tivesse tido um bom dia de aniversário.
Muito agradecida ao Lelo e também aos comentadores pelas suas palavras amigas.
ResponderEliminarAbraços
Júlia
Bons textos e bem oportunos! Também eu me lembro dos excessos e do ridículo de tantas modas que grassam domínio do processo ensino-aprendizagem.
ResponderEliminarDisparates!
Julinha, continue a deliciar-nos com setes textos, belíssimos, bem contados.
Um abraço,
Tininha